Um novo ataque militar teve lugar perto da União Europeia. O Azerbaijão lançou um ataque relâmpago contra o Nagorno-Karabakh. Qual é a prioridade atual?
É chocante, porque estava em curso um processo de mediação e o uso da violência deve ser sempre deplorado. O importante agora é sermos ativos na frente humanitária. Estamos empenhados em apoiar a Arménia, que acolhe um grande número de refugiados. Por outro lado, temos de continuar política e diplomaticamente empenhados em garantir uma reafirmação clara do respeito pela integridade territorial da Arménia.
O encerramento do corredor de Lachin, a concentração de tropas azeris em torno de Nagorno-Karabakh. A UE apercebeu-se desses sinais de aviso?
Estivemos ativos durante todo o verão. Quando percebemos que o corredor de Lachin estava fechado e que havia pressão humanitária na região, percebemos que era importante reabrir este acesso humanitário. Nas semanas e dias que antecederam esta ação militar, a UE esteve diretamente envolvida, tanto com representantes da população arménia da região como com representantes do Governo do Azerbaijão, e assegurámos a reabertura do acesso humanitário. Poucas horas depois da reabertura foi lançada a ação militar. Continuaremos muito empenhados. Não vamos desistir do nosso compromisso de levar estabilidade, segurança e, a curto prazo, ajuda humanitária à região.
Será que a União Europeia não fechou os olhos para preservar os acordos de gás com o Azerbaijão?
De modo algum. Compreendo que algumas pessoas se socorram desse argumento. Não é uma análise correta. Demonstrámos a capacidade da UE para diversificar muito rapidamente após o início da guerra da Rússia contra a Ucrânia e, como resultado, há muitas opções abertas, hoje, em termos de acesso a recursos energéticos.
O Azerbaijão continua a ser um parceiro da União Europeia?
Sim. Mas isso significa que a relação é simples? Não. É difícil? Sim, e estas dificuldades reais têm de ser compreendidas.
Vai encontrar-se com os líderes do Azerbaijão e da Arménia. O que lhes vai dizer?
Vamos encorajar um processo de normalização que conduza a compromissos de ambas as partes, e que haja respeito pelos compromissos assumidos. A prioridade absoluta é assegurar negociações sobre as delimitações territoriais e fronteiras. Foi o processo europeu que permitiu avançar nesta matéria, num tratado de paz para normalizar as relações e também na possibilidade de os arménios e os azerbaijaneses circularem na região.
A Arménia fala de limpeza étnica no Nagorno-Karabakh. Concorda com estes termos?
É certo que a grande maioria da população arménia abandonou a região, provavelmente por receio da forma como seria tratada pelas autoridades azeris. Uma grande parte está agora na Arménia, razão pela qual é necessária ajuda humanitária, particularmente por parte da União Europeia. E a comunidade internacional tem de desempenhar um papel para garantir a segurança e os direitos desta população.
A Rússia é um ator importante na região. O ataque enfraquece ou fortalece Moscovo?
Há uma certeza, e ninguém pode deixar de a ver. A Rússia traiu o povo arménio. A Rússia manifestou o desejo de ter soldados presentes para garantir os acordos de estabilidade e segurança. Esta operação militar foi lançada sem a mínima reação da Rússia, que estava no terreno, o que não foi o caso da União Europeia, que não tem qualquer força militar no terreno.
O apoio europeu à Ucrânia continua tão infalível como sempre? Nas eleições na Eslováquia, um partido contra o apoio à Ucrânia e pró-Kremlin saiu vencedor. Estão os 27 ainda unidos?
Estamos extremamente unidos. Nas semanas e meses que se seguiram ao início da guerra, já se especulava que os 27 se iriam dividir. Não é isso que está a acontecer. Pelo contrário, o tempo que passou soldou posições e reforçou a forma como a Rússia está a ser sancionada. Foram decididos onze pacotes de sanções e reforçada a decisão de apoiar a Ucrânia com capacidades financeiras, com armamento, o que é inédito, e sobretudo com um grande apoio político nos fóruns internacionais. É a União Europeia que está a falar com uma voz muito forte em apoio da paz justa proposta pelo presidente Zelensky.
Não está preocupado? Porque a Eslováquia e a Polónia disseram que vão suspender o fornecimento de armas. Temos a impressão de que estão a aparecer fissuras.
Estamos vigilantes porque a unidade raramente é espontânea e exige um grande esforço, trabalho político, convergência e diplomacia. Vamos continuar empenhados, como europeus, mas também com os nossos aliados e parceiros em todo o mundo que apoiam esta posição da União Europeia, que visa defender a segurança na Europa, mas defender também uma ordem mundial que se baseia em regras. Quando um membro permanente do Conselho de Segurança ataca o seu vizinho, é a ordem mundial que está ameaçada, não apenas a segurança na Europa. A unidade raramente é espontânea e exige um grande esforço.
Não teme bloqueios ou vetos, que estão a surgir cada vez mais?
Não é a primeira vez que há eleições na União Europeia, é mais um processo normal e isso é bom. Quando há eleições, muitas vezes especulamos antes e depois apercebemo-nos de que há capacidade de garantir que o senso comum prevalece e podemos trabalhar juntos. Muitas pessoas percebem que a União Europeia traz valor acrescentado, particularmente em momentos como este de grande tensão internacional.
O apoio americano à Ucrânia também é infalível? Assistimos a um acordo no Congresso que pôs de lado a ajuda à Ucrânia.
Nas reuniões que tivemos com o Presidente Biden e o Secretário de Estado Blinken, notei uma grande determinação e sinceridade no apoio à Ucrânia, porque há um entendimento nos Estados Unidos de que não se trata apenas de apoio à Ucrânia ou à União Europeia, mas a uma visão do mundo baseada na liberdade e na democracia. Estou confiante de que os Estados Unidos estão determinados a trabalhar com os europeus. Recebi a enviada especial de Joe Biden para a reconstrução da Ucrânia. Isto mostra que estamos empenhados nos pormenores da cooperação e da coordenação, para garantir que o apoio que prestamos de ambos os lados é útil e eficaz para os ucranianos e para os valores que defendemos. Isto não significa que sejamos ingénuos. Temos de estar vigilantes.
Vai encontrar-se com Joe Biden e, dentro de um ano, o Presidente poderá ser republicano. Está preocupado com as eleições americanas?
Não tenho intenção de especular sobre os resultados das eleições americanas. Antes disso, haverá eleições europeias. Há apenas um ponto que considero essencial: não deveríamos pensar tanto no que está a acontecer noutras partes do mundo. Em vez disso, devemos pensar no que queremos, enquanto europeus, para garantir que temos uma influência positiva no resto do mundo, tanto para defender os nossos valores, como para defender os nossos interesses.
Ainda é demasiado cedo para falar de negociações de paz entre o Kremlin e Kiev?
É importante manter uma posição de princípio muito firme. São os ucranianos, e apenas os ucranianos, que terão de definir quando estão reunidas as condições para a negociação. É o que o Presidente Zelensky está a fazer quando põe em cima da mesa a fórmula para uma paz justa e quando, com o nosso apoio, tenta mobilizar a comunidade internacional. Mas uma paz duradoura não se pode basear na impunidade, deve ser feita justiça para aqueles que cometem crimes de guerra. Deve ser uma paz baseada nos princípios da Carta das Nações Unidas. Qualquer outra fórmula enviaria ao resto do mundo a mensagem de que basta uma agressão contra o vizinho para que, mais cedo ou mais tarde, haja uma forma de reconhecimento do agressor. Isso não é aceitável para nós.
Estabeleceu o objetivo de 2030 para o alargamento da União Europeia. A União está preparada para o calendário que está a propor?
Ainda não está pronta e é por isso que temos de nos preparar. Fixei uma data porque penso que não só a União Europeia deve preparar-se, mas também os Estados que querem juntar-se devem acelerar os esforços necessários em termos de reformas. O objetivo é abrir os olhos de todos e dizer que não podemos adiar mais. Se queremos este projeto político, se queremos oferecer aos nossos filhos um futuro próspero e estável, temos de começar a preparar a evolução deste projeto político. Isso significa falar.
A China continua a ser um parceiro ou é mais um rival sistémico?
Vejo a China de um ângulo muito simples. Há três pilares na nossa relação com a China. O primeiro é a democracia, os valores fundamentais e os direitos humanos, e a Europa aqui não baixará os olhos. Acreditamos que o mundo é um lugar melhor, mais estável e seguro quando partilhamos valores universais, e vamos continuar a defender os nossos valores. O segundo ponto é que é evidente que existe um desequilíbrio nas relações entre a UE e a China, e que somos economicamente vulneráveis porque, em certos setores, estamos demasiado dependentes. Por isso, precisamos reequilibrar as nossas relações com a China, e é essa mensagem que estamos a transmitir quando nos relacionamos com as autoridades chinesas.