O partido conservador e soberanista Lei e Justiça (PiS), no poder desde 2015, procurava manter a maioria parlamentar. A Plataforma Cívica, liberal e pró-integração europeia, tinha como objetivo impedir essa maioria. E conseguiu. Seguem-se agora as negociações para uma grande coligação.
Dois homens e duas Polónias
As eleições foram também sobre o embate entre dois inimigos políticos, Jaroslaw Kaczyński, vice-primeiro-ministro e presidente do Lei e Justiça, e Donald Tusk, ex-presidente do Conselho Europeu. Partilhando as mesmas origens na luta anticomunista a partir do movimento Solidariedade, três décadas depois representam duas visões opostas, e irreconciliáveis, sobre o futuro da Polónia: uma soberana e conservadora; outra progressista e pró União Europeia.
A votação foi concorrida, renhida e antecedida por uma campanha quente, marcada por insultos, acusações e ameaças de morte nas redes sociais. Kaczyński acusou Tusk de querer vender a Polónia a interesses estrangeiros e aniquilar as raízes cristãs e a identidade nacional polacas. Já Tusk acusou Kaczyński, e o PiS, de quererem destruir a democracia liberal na Polónia. Em campanha, deixou um aviso: «É a nossa democracia e o nosso lugar na Europa que estão em jogo».
‘Geringonça’ polaca
Embora o PiS tenha sido o partido mais votado, a chave para a construção de uma maioria parlamentar está nas mãos da Coligação Cívica. E, num cenário de fragmentação política, o terceiro lugar foi determinante.
Neste caso, havia três atores relevantes. A Terceira Via, uma coligação centrista que integra o Partido do Povo (um partido rural e conservador) e o movimento Polónia 2050, liderado por uma estrela de televisão; a Esquerda, uma coligação socialista e progressista, e a Confederação, um partido libertário, identitário e pró-Russo. Os dois primeiros, por se tratar de coligações, precisavam de ultrapassar a barreira dos 8 por cento. E a sua performance foi determinante para construir uma maioria a partir da oposição.
Segundo os resultados divulgados, a Coligação Cívica, a Terceira Via e Esquerda reúnem 248 dos 460 votos que compõem o Sejm. Cabe agora ao Presidente Andrzej Duda convocar o líder do partido mais votado, ou do segundo partido mais votado, a tentar formar Governo. Sendo improvável que o PiS consiga formar um governo minoritário, seguir-se-á um processo que poderá durar várias semanas com vista à formação de um executivo liderado pela Coligação Cívica.
Deslocação do eixo
Nestas eleições também se jogava o futuro da União Europeia. Depois de uma sucessão de derrotas nos resultados das eleições dos Estados-membros, a perspetiva da oposição formar governo traz alívio a Bruxelas e preocupação a Budapeste, que vê o grupo de Visegrado enfraquecido. Com o PiS na oposição, torna-se mais provável o dissipar de tensões com a UE e o desbloqueio de cerca de 35 mil milhões dos fundos de recuperação. Anunciados os resultados, Manfred Weber, presidente do EPP, declarava que «a Polónia está de volta».
Mas pode ser que se aplique aqui a velha máxima de que é preciso que algumas coisas mudem para que (quase) tudo fique na mesma. A coligação que se poderá formar como alternativa é negativa, isto é, unida apenas pelo objetivo de afastar o PiS, e muito heterogénea (juntando desde conservadores à esquerda progressista). Para além disso, fica aquém da maioria de três quintos no Sejm, e por isso algumas iniciativas legislativas poderão ser bloqueadas pelo veto presidencial.
A posição cética relativamente à imigração, bem como o alinhamento face à guerra na Ucrânia não deverão ser alterados. E a Polónia deverá continuar a reforçar, ao contrário de outros Estados europeus, a sua capacidade militar. As relações entre Varsóvia e a Berlim podem melhorar, mas a pressão para a deslocalização do eixo de poder europeu para leste deverá continuar.
Ainda assim, Bruxelas tem motivos para celebrar.