Desde que assumiu a pasta de ministro da Saúde, Manuel Pizarro já disse que a culpa do atual estado do SNS está nas «políticas de há 40 anos», durante «os anos 80 e 90» e que o «Governo vai fazer um estudo para perceber que rede hospitalar nacional é desejável que Portugal tenha em 2030». Se tivermos em conta o colapso que está à vista de todos em 2023, a definição das prioridades é verdadeiramente extraordinária.
Talvez exista entre quem vota, que vá nesta conversa, por razão de dogma, ou fidelidade ao cartão. Ainda assim, o que resulta surreal é que não se tenha em conta o óbvio, de uma cronologia que comprova que nos últimos 30 anos, nenhum partido governou tanto tempo como o PS.
António Guterres foi primeiro-ministro de 28/10/1995 até 06/04/2002, tendo como ministros da Saúde Maria de Belém Roseira, Maria Manuela Costa e Adalberto Campos Fernandes e como secretários de Estado José Arcos dos Reis, Francisco Ramos, Arnaldo Silva, Nélson Madeira Baltazar, José Miguel Boquinhas, Francisco Ramos e Carmen Pignatelli.
José Sócrates foi primeiro-ministro de 12/03/2005 até 20/06/2011, tendo como ministros da Saúde António Correia de Campos e Ana Jorge, dando-se o caso do próprio Manuel Pizarro ter sido secretário de Estado da Saúde em ambos os executivos – XVII e XVIII governos constitucionais – a par de Francisco Ramos e Óscar Gaspar.
Por seu lado, António Costa é primeiro-ministro desde 26/11/2015, tendo tido como ministros da Saúde Adalberto Campos Fernandes, Marta Alexandra Simões, Marta Temido e Manuel Pizarro (em funções), e como secretários de Estado Fernando Araújo (atual CEO do SNS), Francisco Ramos, Manuel Delgado Rosa Valente de Matos, Raquel Duarte, Jamila Madeira, António Sales, Diogo Serras Lopes, Margarida Tavares e Ricardo Mestre.
Significa que durante 22 anos contados desde outubro de 1995, o PS teve as maiorias, por vezes absolutas, os governantes, os meios e os recursos, para implementar as políticas que reforçassem e tornassem sustentável o SNS. Aliás, só António Costa, com Manuel Pizarro em parte do percurso, leva já 8 anos à frente dos destinos do país, com a saúde sempre em triste queda livre. Foram 8 anos desperdiçados, com proclamações de ideologia atiradas para cima dos hospitais, em vez de meios, profissionais de Saúde e da dignificação das carreiras.
Em 8 anos e só a pensar em votos, este governo diminuiu em 5 horas semanais o período normal de trabalho dos profissionais de Saúde, com prejuízos para o funcionamento do SNS mais do que antecipáveis. Foi também o PS que rescindiu parcerias público-privadas que transformaram hospitais exemplarmente geridos em problemas financeiros, agravou as situações de urgências fechadas, grávidas sem atendimento, primeiras consultas que tardam anos, cirurgias urgentes adiadas, falta de capacidade de resposta em várias especialidades, 1 milhão e 600 mil portugueses sem médico de família (depois de António Costa ter garantido em 2016 que todos os teriam em 2017) e filas matinais desumanas em Centros de Saúde.
Retrocedendo aos anos 80, para disfarçar a incapacidade do Governo e transferindo para 2030 resultados, quando está em causa salvar o SNS em 2023, Manuel Pizarro deita a toalha ao chão e soa mais a presidente de uma comissão liquidatária do SNS, do que a ministro da Saúde. Isso também é trágico.