André Rieu. O Regresso do Rei da Valsa

Não vê a música clássica como uma forma de arte destinada apenas à elite. É considerado em todo o mundo o ‘rei da valsa’ e, para o ano, volta a Portugal – depois de já ter esgotado em 19 ocasiões o Altice Arena.

É considerado o “rei da valsa”. Ao longo da sua carreira, já vendeu 40 milhões de CD e DVD, tem mais de 485 discos de ouros e mais de 270 de platina e 9,5 milhões de seguidores no Facebook. Mesmo assim, afirma que continuará a atuar até “ter 120 anos”.

André Rieu, de 74 anos, já esgotou 19 vezes o Altice Arena e, em 2024, regressará ao maior pavilhão de espetáculos de Portugal, juntamente com a sua Johann Strauss Orchestra – são cerca de 63 músicos de 13 nacionalidades, dez elementos de um coro e seis solistas – para dois concertos que, tal como todos os outros, prometem ser memoráveis. O violinista e maestro vai subir ao palco da Altice Arena, em Lisboa, a 1 e 2 de novembro de 2024.

Citado pelo comunicado de imprensa da promotora responsável, a Ritmos & Blues, André Rieu manifestou o seu entusiasmo por regressar a Portugal: “A minha fantástica orquestra e eu já estamos ansiosos pelo regresso a Portugal! A música tem o poder de construir pontes e juntar as pessoas e eu estou muito entusiasmado com este regresso – partilhando uma vez mais o meu amor pela música com a nossa audiência de Portugal”, afirmou.

Esta tournée conta com uma convidada especial – Emma Kok –, que com apenas 15 anos já deixou maravilhadas milhões de pessoas por todo o mundo depois da sua versão da canção Voilà, que a cantora Barbara Pravi levou à Eurovisão 2021, se tornar viral.

Um concerto diferente dos otros

Recorde-se que as tournées de André Rieu vendem habitualmente tanto quanto as das maiores estrelas rock e pop mundiais. Os seus concertos são únicos e visualmente encantadores: desde a visão de André e a sua orquestra a entrar pelo meio da multidão e a subir ao palco, até aos figurinos luxuosos, o vasto ecrã atrás da orquestra que mostra imagens criadas à medida de cada canção. Nos concertos, ao contrário de outros de música erudita – onde por norma reina o silêncio –, é possível comer, beber e dançar.

Além de tocar e dirigir o espetáculo, Rieu é ainda responsável pela conceção do guarda-roupa dos seus músicos. “Porque estão as mulheres das orquestras sempre vestidas de preto? Parecem monjas. Investimos muito tempo e energia em criar vestidos para as intérpretes e solistas”, contou numa entrevista ao El País. E, apesar dos bilhetes para os concertos custarem entre 40 a 120 euros, a popularidade de Rieu é transversal a classes sociais: “Nos meus concertos encontra toda a gente – da senhora da limpeza ao professor catedrático”, já afirmou várias vezes o violinista. Ou seja, para si, a música clássica e erudita não é feita para as elites financeiras e sociais: “Porque é que música tão bela devia estar acessível apenas para um número seleto de pessoas? Eu odeio o snobismo. Todos os compositores, seja o Bach, o Mozart, o Beethoven, o Verdi ou os Beatles, os ABBA e o Andrew Lloyd Weber escrevem música para as pessoas. Música pop vem de ‘música popular’. A música clássica devia ser tão, ou talvez mais, popular do que a música pop, como foi no passado, quando as pessoas do século XVIII assobiavam as melodias de Mozart na rua”, justificava numa entrevista ao Observador em 2019.

 Na altura, interrogado sobre a sua capacidade de esgotar salas e espaços, ao contrário de outras orquestras, que tocam, geralmente, em espaços mais pequenos, o “rei da valsa” reforçou: “É uma combinação de muitas coisas. Começa com a escolha do repertório. Eu só interpreto obras que me toquem no coração. O meu alinhamento é como uma boutique de flores e cada flor é diferente. Não categorizo. E depois, comunico com a minha audiência, falo com eles, convido-os a dançar e a cantar connosco. Quando vejo milhares de caras felizes à minha frente, eu também estou feliz. E claro que há muito humor. Portanto a chave são as emoções”, revelou.

O pessoal e profissional de braço dado

Especialmente no que diz respeito aos últimos vinte anos, considera que a sua vida pessoal é tão influenciada pelo seu trabalho que uma descrição da primeira é praticamente a mesma que a história da sua carreira. “Especialmente porque a minha esposa, Marjorie, tem estado sempre muito próxima desde o início da minha carreira. A minha vida é simplesmente música, estamos sempre ocupados com música e nunca nos aborrece!”, escreveu na biografia presente no seu site oficial.

Já durante a sua infância se sentia “fascinado pelo mundo da música”. Nasceu em 1949 em Maastricht, e sendo o pai, André Sr., maestro da Orquestra Sinfónica de Maastricht, é natural que André Jr. tenha começado a aprender violino aos cinco anos.  “O meu pai era maestro e lembro-me da massiva orquestra com aquele belo som, todos aqueles arcos a movimentarem-se na mesma direção… achava tudo aquilo simplesmente maravilhoso”, lembra. Foi a sua mãe que escolheu o seu instrumento: “A minha mãe escolheu o violino como o instrumento mais adequado para mim e tinha razão! Desde que ouvi o som romântico do violino, apaixonei-me por ele e o amor nunca mais parou. Cresceu e cresceu e, enquanto isso, o meu violino e eu fomo-nos tornando inseparáveis”, contava em 2017 ao Violinist.

Mas já nessa altura o surpreendia que o ambiente nos concertos fosse “tão sombrio”. “Toda a gente estava tão séria e não era autorizado rir ou tossir apesar de eu achar que aquela música demonstrava tanta alegria!”, explica no seu texto. Por isso, todo esse ambiente “estático” que existe ao redor da música clássica e “mantém afastado o grande público”, não é algo que encontrará nos seus concertos. «” nossa orquestra é composta por jovens, músicos entusiastas que permanecem em palco todas as noites com todo o seu coração para me acompanharem nos concertos. E esse entusiasmo é irradiado até junto do público”, descreve o artista, acrescentando que durante os seus concertos, tanto ele como a sua orquestra e o público sentem “um enorme prazer coletivo”. “Desde abanar a cabeça, murmurar o som da música, bater palmas, saltar, tudo acontece! Todas as noites ocorre sempre uma enorme experiência e para um músico nada é mais importante que isso”, garante.

Apesar da sua precoce ligação com a música,  foi só quando tocou a sua primeira valsa, enquanto estudava no conservatório, que a paixão pela música surgiu. O artista estudou violino no Conservatoire Royal de Liège e no Conservatorium Maastricht. “Durante os meus anos de estudo de violino no Conservatório, alguém me pediu que tocasse numa orquestra de salão. Foi aí que, pela primeira vez, toquei uma valsa – ‘Gold und Silber de Franz Léhàr’. Que revelação! Fiquei imediatamente viciado pela medida que, anos mais tarde, se tornou o meu ritmo de vida: a medida de três quartos, a valsa”, conta o violinista.

De 1974 a 1977 frequentou a Academia de Música de Bruxelas, onde aprendeu com o violinista clássico e professor húngaro André Gertler. Pelas suas habilidades, concluiu a sua formação com a distinção Premier Prix no Conservatório Real de Bruxelas.

Apesar de ter já vários discos editados, os primeiros anos da sua carreira não foram fáceis, já que era rejeitado pela maioria das editoras e dos estúdios. Rieu teve que percorrer meio mundo até convencer os responsáveis da Decca – editora que fazia parte da Universal –, e foi então que começou a trabalhar no Strauss & Co., que viria a transformar-se no seu primeiro grande álbum. E, a partir daí, nunca mais parou.

O amor incondicional pelo instrumento

Atualmente, o seu violino é um Stradivarius de 1732, extremamente valioso. “Ele vai para a cama comigo. Nunca o deixo sozinho e tenho um guarda-costas que toma conta dele 24 horas por dia. Se for roubado, nunca poderá ser vendido porque há apenas 400 exemplares no mundo e seria imediatamente reconhecido. Sinto-me sortudo de tocar este instrumento que foi passado de geração em geração”, revelou à Globo em 2014. Embora não conheça os proprietários anteriores, ao Violinist, o artista admitiu estar convencido de que todos trataram o instrumento com amor e respeito. “É assim que se deve tratar uma mulher. O processo de construção dos violinos Stradivarius levou anos e anos. Quando faço um pouco de matemática, noto que as árvores para a madeira dos instrumentos Stradivarius tiveram que ser colocadas no solo durante a descoberta do Novo Mundo por Colombo. Isso torna ainda mais especial para mim ter o privilégio de tocar um desses violinos”, frisou à mesma publicação.

Dono de um Castelo

André Rieu é conhecido por ser extravagante e ambicioso não só nos seus concertos, como na sua vida pessoal: o músico é o orgulhoso dono de um gigantesco castelo na cidade de Maastricht, na Holanda, do século XV.

Entrou na casa pela primeira vez aos seis anos e foi lá que teve as suas primeiras lições de piano. “É lindíssimo mas não o era. Vim cá pela primeira vez aos seis anos para ter aulas com uma professora irritante, odiava-a. O sítio era escuro e húmido, praticamente a cair. Mais tarde disse à minha mulher que gostava de ficar com ele. E ela avisou-me: ‘Nesse caso, é melhor começares a vender alguns discos’”, recordou em diversas entrevistas. Segundo o artista, foi na sua cozinha que o mosqueteiro Dartagnan tomou o seu último café antes de ser assassinado.

Durante a pandemia da Covid-19, o violinista revelou ao mundo os seus dotes culinários. “Não consigo ficar parado, por isso, durante a pandemia comecei a fazer bolos. Não conseguia comer todos os que fazia, então, comecei a partilhá-los com os meus vizinhos”, contou ao Daily Mail em 2021. A mensagem espalhou-se e, de um momento para o outro, André Rieu estava a fazer bolos também para uma loja da esquina. O violinista consegue encontrar algo em comum entre a culinária e a música: a diversão. E, enquanto poder, continuará a divertir-se e a divertir os outros, em cima do palco.