Geopolítica destituinte: de Durão a Costa

Os partidos do arco do poder não vão aceitar limitações aos poderes executivos em revisões constitucionais.

Decisões geopolíticas fizeram cair governos de Portugal nos últimos 20 anos. Um pulsar inquietante. E desventuroso! A geopolítica é como uma escrita da politica na Terra. Liga factos a consequências. E é como o algodão. Não engana. Mas também não perdoa!

Durão Barroso demitiu-se em 2004. Para liderar a Comissão, projeto geoeconómico-político na União Europeia. O eleitorado não perdoou, percecionou a atitude como abandono, uma traição aos compromissos nacionais. Passos Coelho alinhou no diapasão europeu. Por causa dele, com ele, e seu além, pela troika, a geopolítica portuguesa rendeu-se à necessidade de financiamento internacional e muitos sacrifícios impostos . Resultado? O PSD, nos últimos 20 anos esteve cerca de 5 anos no governo. Que o relembre se o povo lhe vier a confiar governo, pelo voto.

A chamada da troika, em 2011, a pedido, anunciou eleições e o fim do governo de Sócrates poucos meses após em eleições. A quebra de confiança na segurança financeira agitou o país. Os espetros de bancarrota e falência ditaram decisão de suspensão de soberania para pagamento dos empréstimos internacionais. Novos eixos de decisão geopolítica centrados na Europa assinalaram ruturas e mudanças na governação portuguesa.

A investigação a António Costa insere-se nas de outros governantes e autarcas sobre localização de hotéis, pedreiras ou centros comerciais. Decisões geopolíticas. E que constituíram fonte de acusações de corrupção. A credibilidade de Sócrates já tinha sido abalada nos casos Freeport ou Vale de Lobo. O Data Center, em Sines e o lítio de Montalegre repetem um pulsar da História, num mesmo ritmo ou padrão de evolução da trajetória. Estaremos condenados a viver assim?

Provavelmente, sim. Os partidos do arco do poder não vão aceitar limitações aos poderes executivos em revisões constitucionais. Resta-nos um pulsar geopolítico novo ou na União Europeia (U.E.) ou nas mobilizações da sociedade. Uma geopolítica constituinte. Nesta, o território é fonte de riqueza primordial e objeto de património. Ao serviço do interesse geral, estimulada com fiscalidade baixa e justiça distributiva, cabendo aos Estados torná-lo recurso político quando oferece recursos ou localizações privilegiadas. A exploração de materiais raros como o lítio e energias verdes são competição na produção de energia entre unidades geopolíticas. Constituem um processo, um roteiro visando maior independência energética.

O que se verifica? China na EDP. Estados Unidos na Galp. E a Europa? Esta não tem uma estratégia clara e deslocalizada na exploração de metais raros, antes em energias renováveis, o que deixa países mais dependentes armadilhados entre a infraestrutura sem escala e a distribuição energética intermitente e hiperfinanciada. O resultado é um desnorte geopolítico, onde poderosos interesses empresariais privados tentam tirar o máximo proveito.

O que fazer? Verifica-se, na geopolítica destituinte, que a Justiça é resquício sobrevivente da nossa frágil democracia. Uma geopolítica europeia constituinte imporá a presença do poder judicial em todos os níveis territoriais, do nacional ao local. Com financiamento plurimo e definição como ante-poder baseado em observatórios qualificados da sociedade na deteção de sinais assimétricos. Terá poder de iniciativa legislativa. Os defensores de separações de poder legislativo-judicial que observem o modelo sueco. Que este e similares inspirem a U.E..

Lei de enquadramento territorial, com valor reforçado, é necessária na gestão e exploração dos domínios públicos. Estaremos mobilizados ? Da luta por bens e direitos públicos às causas ambientais, os 50 anos do 25 de Abril em 2024, tornados época eleitoral, a geopolítica constituinte tem seu lugar. No ser e fazer Terra democrática. Urge nova Constituição geopolítica europeia para defender o território. E a Democracia. l

Professor e autor de Portugal Geopolítico – História de Uma Identidade