O Admirável Mundo Novo, é um livro da década de cinquenta que profetizava o que estamos hoje a começar a experimentar. Louis Armstrong eternizou o seu Wonderful World que saboreava o início de um «mundo maravilhoso», mas, no ano em que nos despedimos de Tina Turner, começamos a ver um mundo mais parecido com o seu célebre filme Mad Max.
Depois da Paz e Amor dos anos 60, iniciaram-se no Ocidente grandes formas de libertação do próprio homem. Inventou-se uma assistência social e de saúde como não existia até então. Evoluiu-se para uma educação gratuita e massiva que pudesse chegar a toda a gente, dando aos pobres as mesmas oportunidades que eram dadas aos ricos.
Parece, no entanto, que não é só a Igreja que ainda não percebeu que estamos numa mudança tremenda ao nível civilizacional. Cada um de nós – cidadãos e gestores da polis – estamos a assistir a mudanças tão fortes que não nos bastam reformas cosméticas, é preciso olharmos para um futuro que começámos a cavar há muito tempo.
No plano da saúde, cresce a oportunidade de cura para muitas doenças, mas com custos tão elevados que se torna impossível muitas vezes cuidar de muitas das nossas enfermidades. Os recursos económicos e sociais não são infinitos. O povo diz que ‘na cama que fizeres será a cama onde te irás deitar’. Antes apoiamos a autodeterminação de cada um escolher a forma de vida que queira para si mesmo, não apoiando as famílias e os casais que pretendiam ter mais filhos. Agora, com uma população tão envelhecida, dizemos que não conseguimos sobreviver sem apoiarmos a imigração.
Curiosamente! Pensando neste caso das gémeas que têm, como qualquer outro português, ao seu dispor um serviço nacional de saúde gratuito. Mas a verdade é que começamos a perceber que não pode haver direitos se não houver ao mesmo tempo deveres. Como posso eu pensar, por exemplo, que Portugal tenha dado a nacionalidade a mais de trezentos mil sefarditas judeus para fazer justiça ao nosso passado e, ao mesmo tempo, pensar que estes mesmos sefarditas são portugueses como eu, com os mesmos direitos que eu sem nunca terem sequer visitado o nosso (meu e deles) país.
No fundo, este mundo maravilhoso tem sido construído nas últimas décadas com ideias e ideais românticos, mas que iremos e já estamos a pagar no presente, o custo de todo este romantismo. A tal fraternidade e amor e paz humanista que tanto apregoámos no passado, está agora a trazer ao de cima o rosto de políticas desencarnadas da realidade económica, cultural, social e financeira de cada cultura.
O Wonderful World, o mundo maravilhoso, que se via vislumbrar no passado, pode tornar-se, no futuro, a destruição de todo o progresso feito ao nível civilizacional. O Natal está aí e no Presépio podemos ver o corpo de um bebé indefeso que vê, ao final da sua vida, a sua carne rasgada pendente no madeiro. Acredito, realmente, que tal como o Pai deste bebé teve o poder de transformar e trazer à vida a carne chagada deste Filho, também terá, no futuro, e já no presente, o poder de transformar a nossa cultura e dar-lhe uma nova vida.