O que, por natureza, é inatingível, sempre nos fascinou. Há mais de um milénio que o céu tem sido palco de uma deslumbrante criação humana: o fogo de artifício. Os efeitos visuais e sonoros resultantes da queima controlada de materiais pirotécnicos costumam estar presentes nas grandes celebrações e festividades, muitas vezes acompanhados de música, tal como em 1749, quando George Friedrich Händel compôs Música para os Reais Fogos de Artifício para comemorar o fim da Guerra da Sucessão Austríaca e a assinatura do Tratado de Aquisgrano.
A história do fogo de artifício perde-se na bruma dos tempos, mas sabe-se que foi na China que surgiu. Os primeiros foguetes não passariam de pólvora acondicionada em canas de bambu, destinando-se tanto a celebrações e cerimónias religiosas como a afugentar espíritos malignos. A referência mais antiga à pólvora, propelente dos foguetes, também tem origem chinesa e remonta a 142 d.C. Foi no Livro do Parentesco dos Três que Wei Boyang, um alquimista taoista, descreveu uma mistura de três pós, que, nas suas palavras, podia voar e dançar violentamente no ar. Wei Boyang não especificou as substâncias envolvidas, mas é quase certo que se referia às três componentes da pólvora negra: carvão, que arde; salitre (nitrato de potássio), que gera oxigénio para a combustão; e enxofre, que facilita a ignição da mistura. A combustão da pólvora corresponde a um conjunto de reações químicas que produzem gases e calor. A Terceira Lei de Newton, que afirma que para toda a ação há sempre uma reação igual e oposta, explica o movimento dos foguetes: os gases rapidamente expelidos pela parte de trás do foguete (ação) criam uma força igual e oposta que impulsiona o engenho na direção contrária (reação).
O conhecimento das misturas pirotécnicas terá chegado à Europa através de Bizâncio, cidade que, na Idade Média, desempenhou um papel crucial nas rotas comerciais entre o Oriente e o Ocidente. A obra Liber ignium ad comburendos hostes [Sobre o Uso do Fogo para Conflagrar o Inimigo], atribuída a Marcus Graecus e datada do século VIII, menciona, entre outras coisas, o ‘fogo grego’ – uma arma incendiária usada no Império Bizantino, cuja composição é desconhecida, mas que era capaz de arder até na água – assim como a pólvora negra e a sua utilização em foguetes.
Roger Bacon, teólogo e filósofo inglês do século XIII que mencionou a pólvora negra nos seus escritos, terá testemunhado uma demonstração de fogos de artifício chineses, possivelmente obtidos por Franciscanos que visitaram o Império Mongol. Chegado o século XVII, os espetáculos de fogo de artifício já se aproximavam dos atuais, embora muito mais perigosos, tanto para os pirotécnicos como para o público. Em Paris, em 1770, durante as festividades do casamento de Luís XVI com Maria Antonieta, o fogo de artifício resultou na morte de 132 pessoas na Praça da Concórdia. Contudo, nos dias de hoje, os acidentes ainda são comuns, nomeadamente em Portugal, sobretudo no Norte, onde se concentram as fábricas de pirotecnia.
A partir do início do século XIX, os fogos de artifício beneficiaram de vários melhoramentos, destacando-se a adição de sais de metais diversos à mistura pirotécnica, uma inovação na qual os italianos foram pioneiros. Os iões metálicos conferem cor à luz emitida pelo foguete, que, sem eles, é alaranjada. Por exemplo, os sais de estrôncio produzem uma luz vermelha, os de bário uma luz verde, e os de cobre, uma luz azul. Por ação do calor da combustão da mistura pirotécnica, os eletrões dos iões metálicos são excitados a níveis de energia superiores, regressando subsequentemente aos seus níveis de energia normais, processo esse que é acompanhado de emissão de luz colorida. A cor depende da diferença de energia dos níveis entre os quais os eletrões transitam, sendo característica do elemento químico em questão.
Muitos espetáculos de fogos de artifício atuais são altamente sofisticados e dispendiosos. Em 2019, o preço da pirotecnia das celebrações do Quatro de Julho em Washington D.C. atingiu os 13 milhões de dólares. Para além deste custo, há também o do impacto ambiental, nomeadamente em termos de poluição sonora, que afeta a migração e a reprodução da vida selvagem. Além disso são também libertados para a atmosfera metais e partículas diversas. Os ambientalistas têm apelado a alternativas mais ecológicas, nomeadamente a substituição dos fogos de artifício tradicionais por shows de drones iluminados.
Feliz ano novo!