Quando um destes dias desabafei que ainda não sabia sobre que tema escrever a crónica desta semana, o meu filho mais velho sugeriu: ‘Pede ao ChatGPT!’ E o irmão que já estava deitado gritou da cama: ‘Escreve sobre o Pandabuy!’
Pedir ao ChatGPT estava naturalmente fora de questão, mas escrever sobre o Pandabuy até podia não ser má ideia. Mas a verdade é que hoje, quando me sentei para começar a escrever sobre o consumo fácil, imediato e por vezes compulsivo em plataformas como o Pandabuy, lembrei-me da sugestão do meu filho mais velho e do que ela me fez sentir.
Desde que o ChatGPT e a inteligência artificial entraram na vida dos jovens que a sua forma de trabalhar, aprender e estudar alteraram-se. Quando na escola é pedido um trabalho, dentro ou fora da sala de aula, muitas vezes acaba por ser feito por esta ferramenta. Basta fazer um pedido, que por exemplo na sugestão do meu filho seria: ‘Escreve um artigo em português de Portugal sobre um tema interessante ligado à infância’ e o texto surge em segundos, exemplarmente escrito, com introdução, desenvolvimento e conclusão, sem erros ortográficos ou de pontuação e também… sem brilho, nem vida.
Embora estejamos cientes da importância da leitura e da escrita, temos vindo a assistir à queda destas competências, o que faz com que os jovens – e também os adultos – tenham cada vez mais dificuldade em escrever, ler, falar e interpretar bem. Para combater esta tendência, alguns professores têm implementado minutos de leitura durante o tempo letivo, numa tentativa de proteger este bichinho que é, sem dúvida, uma espécie ameaçada. Ao mesmo tempo, seria importante insistir ainda mais na escrita de textos livres e criativos, que é outra prática em vias de extinção.
Embora comece a ser cada vez menos evidente para os mais novos, a prática e o gosto pela leitura e pela escrita oferecem uma série de ferramentas muito mais preciosas do que o ChatGPT ou outro Chatbot.
Escrever um texto é pensar, imaginar, criar e desenvolver um mundo interior que se transforma e ganha forma e vida através das palavras. É planear, construir, estar em contacto consigo próprio, debater-se com as suas ideias e encontrar a melhor forma de as partilhar e com os outros. Escrever é uma forma de comunicar não só com os outros, mas também com nós próprios, sempre em transformação e aperfeiçoamento. E é também uma forma de desenvolvimento do pensamento crítico, da originalidade e inovação.
Neste sentido, é incomparável a riqueza de um texto escrito por uma criança – mesmo que pejado de erros de ortografia – ou pelo ChatGPT, que é uma espécie de plágio sem alma de uma junção de informações que já foi escrita e repisada. Não é criador, nem criativo. É como levar cábulas para os testes e colá-las, em vez de pensar, inventar, imaginar, mesmo que não se saiba a resposta para 20.
Por outro lado, ler um livro do princípio ao fim enriquece o nosso mundo interior com histórias, personagens, lugares e descrições e permite viver o sonho e o imaginário. Da mesma forma, embora mais moroso e difícil, procurar informações em fontes diversas pode ser incomparavelmente mais rico, atrativo e promotor de conhecimento do que ter acesso imediato a respostas diretas e extremamente completas, que não deixam margem para a dúvida e a curiosidade.
A forte e rápida adesão dos mais novos a esta ferramenta tem de nos fazer pensar não só na sua importância e necessidade, mas sobretudo na melhor forma de a usar. Perceber como lhes pode ser útil, mas não permitindo, de forma alguma, que substitua ou atire para segundo plano o que têm de mais valioso: o pensamento, as ideias, a forma de expressão, o pensamento crítico, a irreverência, a originalidade, criatividade e imaginação, a sua genialidade! Para que os jovens nunca se deixem enganar e passem a acreditar que a inteligência artificial é melhor do que a sua!