Provas digitais? Manuais digitais? Já existem milhares de estudos que demonstram que o digital nestes níveis causa mais prejuízos do que benefícios – atrasos na linguagem e coordenação Psicomotora, aumento exponencial dos problemas de visão e da coluna, compromisso do desenvolvimento físico por carência de atividade (inclusive obesidade), défice de empatia, aumento da irritabilidade, agressividade, ansiedade, depressão. E muito mais.
Os verdes anos são fulcrais para aprender a pensar, tolerar a frustração, desenvolver foco, disciplina, consistência, perseverança, a socialização, tudo o que as telas eletrónicas lesam. Ecrãs precoces significam imediato, instantâneo, gratificação fácil, hiper-estimulação e baixa reflexão/pensamento crítico. De resto, as grandes vantagens digitais – como o fácil acesso à informação – não aproveitam a estas faixas etárias. Os putos não necessitam de dados a rodes nem de jogos online ou carrosséis mesmerizantes de vídeos – precisam de tempo e de espaço para a fantasia, para a curiosidade (por definição ativa e não passiva como um ‘utilizador’), para a relação. Países como a Suécia ou a Noruega já experimentaram os métodos digitais mas retrocederam perante a calamidade.
Acontece que, mesmo assim, neste cantinho à beira-mar despejado, insiste-se em testes de aferição nos aparelhos, como se os garotos fossem ou cobaias ou lixo. Pior: as escolas públicas têm centenas de computadores avariados (o Ministério da Educação lançou um concurso de reparação só que não houve candidatos sequer), não há portáteis para todos os alunos, verificam-se falhas de rede.
Num país tão sulcado por gritantes desigualdades e no qual o desempenho escolar dos alunos degrada-se rápido – como mostram quer indicadores internacionais como o PISA, quer as próprias provas de aferição – os políticos estão ensimesmados neste modelo que só cava ainda mais as ditas desigualdades e dificuldades.
Nos dias pares, choram que as crianças já mal contactam com a natureza e mal conseguem correr, brincar ao faz de conta ou criar objetos a quatro dimensões de plasticina ou barro (fica tudo liso e achatado como no ecrã). Nos dias ímpares, espetam com escolhas múltiplas no PC. Construir frases completas e reproduzi-las em papel, por exemplo, exige outro nível de aptidões – mais ligações neuronais, outra literacia, motricidade fina, atenção/concentração – mas isso não é aferido, claro. Portanto, se estas provas não aferem nada, para quê esta aferição?!
Por facilitismo: porque papel e caneta fica bem mais dispendioso, pressupõe professores a ensinar e a corrigir, educação presencial, muitos meios. Já o digital exige raspas, até dá para meter robots ou quejandos a ‘lecionar’, fica bem barato, os catraios nem precisam de sair da cama e depois mete-se o símbolo inclusivo, sustentável e verde em cima que a malta bem pensante até se baba e aplaude. O Estado empurra (como na covid) a passarada para as telas porque é económico mas também porque um povo burro, viciado e mole é mais fácil de domar e admoestar. A dita transição digital, promovida como política pública, é uma arma totalitária em cima de um povo meramente espetador/consumidor. Desliga.
Cidadãos em coma
O Estado empurra a passarada para as telas porque é económico mas também porque um povo burro, viciado e mole é mais fácil de domar e admoestar.