Pensar. Agir. Comunicar. Gerir as reações das decisões. São estas as principais fases da governação. No passado, estes ciclos aconteciam em momentos distintos da linha do tempo. Tal não é mais possível. Mudou a forma como é balizada a acção política. Mudou principalmente o grau de exigência dos cidadãos em relação aos eleitos.
Com o novo Governo plenamente em funções, a atenção da sociedade portuguesa está voltada para as medidas que implicam directamente com o nível e a qualidade de vida dos cidadãos.
Luís Montenegro no musculado discurso da tomada de posse anunciou reuniões em sede parlamentar com o objetivo de promover uma agenda ambiciosa de combate à corrupção. A intenção é meritória. Está instalada a ideia de que o Estado – administrações central e local – funciona sob uma teia de corrupção que percorre diferentes níveis de decisores. No entanto, quando se pede aos portugueses que identifiquem os principais problemas que querem ver resolvidos, a corrupção não surge nos primeiros lugares. Assim como também não têm caráter de urgência as chamadas ‘questões da vida’, tão referenciadas esta semana. Na avaliação dos portugueses, o sentimento de prioridade tem três dimensões:
- Salários. Todos reconhecem que é necessário um choque de rendimentos. Pela via do crescimento económico, a expectativa de melhoria carece de muito tempo. Com os impactos negativos da situação internacional ao nível de inflação e de juros, como oportunamente assinalou Marcelo Rebelo de Sousa na tomada de posse do Governo, dificilmente serão encontradas soluções numa janela temporal razoável. A alternativa é provocar o aumento dos rendimentos das famílias e dos jovens por via fiscal. Há mais de 10 anos que ouvimos falar dos ‘mileuristas’: os jovens com formação superior e que auferem uma média de 1000 euros por mês. Uma década depois, pouco ou nada se avançou. Alternativa: emigração.
- Impostos. Poderá existir uma intervenção nos escalões do IRS que contemplem a classe média baixa, aqueles Portugueses que mais poder de compra perderam nos últimos anos. De igual modo, espera-se, como prometido na campanha eleitoral, alterações em sede de IRC, mas no prazo de uma legislatura. Uma incerteza, portanto, já que ninguém arrisca dizer qual será a duração do atual Governo.
- Serviços públicos. Em todos os inquéritos de opinião, a saúde é o setor apontado como o que mais preocupa os Portugueses. Quando falamos da saúde, referimo-nos ao SNS – Serviço Nacional de Saúde que este ano comemora 45 anos de existência. Aguarda-se com expectativa as decisões que irão ser tomadas no âmbito do plano de emergência anunciado para os primeiros 2 meses do governo.
Sendo assim, este Governo não tem estado de graça quer pelo lado da oposição, quer por fatores não controláveis como as declarações sobre a família produzidas por Pedro Passos Coelho, que foram objetivamente um embaraço para o PSD em razão de sublinharem um pensamento que está próximo do Chega mas distante do PSD.
Quanto à oposição, o Chega vai continuar a influenciar a agenda politica e, consequentemente, mediática. O PS vai procurar ficar associado às decisões por natureza populares que o Governo vai implementar, valorizando as carreiras da administração pública de acordo com as promessas eleitorais. A carta enviada esta semana por Pedro Nuno Santos a Luís Montenegro é a demonstração de que o Partido Socialista está disponível para um orçamento retificativo que o coloque na posição de que os ‘louros’ também são seus.
É nestas múltiplas frentes que o Governo se movimenta, pensando, agindo e gerindo as reações dos seus atos e as movimentações da oposição e dos ‘seus’.
No dia 11 de março, a correspondente do jornal El País em Lisboa escreveu: «Há seis meses, somente Montenegro parecia acreditar em Montenegro ». Há palavras que bem podem ser premonitórias.