Um bom exemplo para alguém? Desde que me conheço, olhei sempre para maio com outros olhos – certamente por ver nele um mês diferente dos outros. Por muitos anos que viva, hão de continuar a desfilar na minha memória recordações de acontecimentos passados que me marcaram e me têm acompanhado ao longo da vida.
Quando era criança, lembro-me daquilo que a minha mãe me ensinava ao contemplar as inúmeras flores que embelezavam o jardim da nossa casa. Ao chegar o mês de maio, parecia que tinham outra cor, outro brilho, outro perfume, como que a transmitir uma mensagem de paz, de serenidade e de esperança.
Era uma dessas flores que eu hoje gostava de fazer chegar àqueles que lá longe teimam em manter a guerra, tanto na Rússia e na Ucrânia, como no conflito israelo-palestiniano, para quem os seres humanos não contam e só a força das armas fala mais alto.
Entre nós, neste momento delicado que vivemos, também queria levar uma flor de maio aos nossos políticos que, em vez de olharem acima de tudo para o país e de unirem esforços para o servir melhor, preocupam-se mais com os interesses partidários, provocando divergências entre uns e outros que não levam a lado nenhum.
O meu pai, a grande referência da minha vida profissional, que me transmitiu a magia da Medicina, fazia anos neste mês. Era, como ele próprio dizia, «um homem feliz». E deixou-nos levando consigo essa ‘imagem de marca’.
No mês de Maio, a Filipa, uma jovem de 17 anos da minha família, disse-nos adeus depois de um longo e pesado sofrimento, vítima de uma doença contra a qual lutou afincadamente, transmitindo-nos esta mensagem: na vida temos de correr atrás dos sonhos e nunca desistir de lutar por eles. Assim partiu.
No mês de Maio, Maria João Abreu, figura incontornável do meio teatral, que recordamos com saudade, despediu-se inesperadamente de nós.
No mês de Maio, falar do coração nunca é demais. Para além da vertente poética – ou não fosse ele o palco das nossas emoções e o centro da afetividade por excelência –, é sempre um tema pertinente por tudo o que acarreta. E a este respeito há que enaltecer as ações que a Fundação Portuguesa de Cardiologia tem desenvolvido anualmente.
Para as pessoas, de um modo geral, o coração é um órgão que mexe com elas, por poder originar o infarto do miocárdio, situação de que vão ouvindo falar com frequência. Mas fora dessa emergência, ignoram as outras doenças cardíacas, algumas das quais igualmente graves para a própria vida. Daí a necessidade de haver todo um comportamento médico de modo a diagnosticar precocemente essas patologias. É preciso, no entanto, todo o cuidado – e usar da maior prudência – ao abordar esta matéria publicamente, para não provocar o pânico entre a população. O ser humano é muito sensível aos alertas sobre doenças, e depressa passa do desleixo ao desespero ao ouvir falar do assunto. Se ignorar é mau, os exageros também nada resolvem. Lembro- me bem daquilo que passei quando estava em funções no centro de saúde. Sempre que a televisão apresentava um programa do foro médico, no dia seguinte as urgências aumentavam logo – com os doentes em pânico com o que tinham visto e ouvido!
Maio também é conhecido por ser o mês das mães. Na história da vida, a mãe tem um significado particular. O seu lugar é insubstituível e a sua missão sublime. Quantas vezes não recorro à minha mãe nas mais variadas situações que me vão surgindo, e sinto que ela lá do Céu vai conduzindo os meus passos?
Dói-me a alma saber que há muitas jovens que querem ser mães ou ter mais um filho e não têm condições económicas para cumprir esse desejo. Num país com uma baixa natalidade como o nosso, é um problema que deveria merecer mais atenção por parte do Estado, sem esquecer o necessário investimento nas consultas de fertilidade, área bastante carenciada.
Porém, o episódio mais feliz da minha carreira médica, que já partilhei nestas colunas e não me canso de repetir, diz respeito a uma jovem que me procurou num momento de aflição causada por uma gravidez não planeada e que ela queria interromper. Ouvi-a com todo o tempo do mundo. Por fim, conversei com ela e expliquei-lhe o que estava em causa, pedindo-lhe que refletisse e pensasse apenas pela sua cabeça. Não voltou a aparecer-me – e eu nada mais soube do caso. Tempos mais tarde, num dia de trabalho e já depois de eu ter terminado as consultas, bateram suavemente à porta do meu gabinete. Abro e vejo a dita jovem com uma criança nos braços. «Lembra-se da nossa conversa, doutor?», perguntou ela à espera da minha reação. Nem consegui dizer palavra. «Vim aqui para lhe apresentar a sua nova utente, a Leonor». Tudo isto foi verdade e aconteceu assim. No mês de Maio.