Ser chamado «abutre» pela companheira de há mais de vinte anos não é para todos. Entre os animais, há os que não têm escolha. Já ‘tornar-se abutre’ no mundo dos humanos, requer perícia. É necessário aparentar ser uma personagem apreciada por alguns e dissimular outra cuja revelação choca e revolta. Mas é sempre uma escolha.
No entanto, por mais importante que o ‘abutre’ se ache, é estranho que haja pessoas predispostas a não acreditar, desde logo, numa vítima de violência doméstica, cuja idade e estado de saúde a torna completamente indefesa, se for uma mulher doente com 95 anos. Estando lúcida, nenhuma razão plausível leva uma vítima desta natureza a mentir, expondo-se à ‘vergonha’, à estigmatização e a possíveis retaliações. O depoimento da vítima ganha uma especial credibilidade, se ela na plena posse das suas capacidades cognitivas e mentais, num leito de hospital, pede esforçadamente por socorro. No entanto, ‘abutre’ que é abutre, tentará, após ser descoberto, esconder-se, manipular e atestar que relatos factuais e até imagens gravadas são uma cabala. Mesmo que as imagens mostrem uma senhora a ser obrigada a subir uma escadaria sem fim, a vestir-se, a maquilhar-se, a entrar no automóvel, ao deitar-se ou levantar-se, sendo forçada a submeter-se aos caprichos mais absurdos.
A razão que permite falar no caso do abutre é ter havido a denúncia corajosa de toda uma equipa médica, que mereceu do Ministério Público e do juiz de instrução o crédito para lhe colocar uma ‘pulseira’ no tornozelo do denunciado, em defesa da vítima. Mas também é importante sabermos que o ‘abutre’ tem cadastro criminal compatível com as alegadas agressões. E é importante sabermos que este foi o ano onde mais abutres foram denunciados pelo crime de violência doméstica. O abutre vive do cheiro da morte das suas presas. E aproxima-se. Vai-se aproximando. Tal como todos os abutres idênticos que vão destruindo pouco a pouco as suas vítimas, roubando-lhes a autoestima e os cartões de crédito se os tiverem, vendendo a alma ao diabo e no meio comprar uma mala da Chanel ou seja aquilo que for, para fazerem uma triste e apalhaçada figura. Sem prejuízo da presunção de inocência, a sociedade não pode ser opaca e surda. Tem de ouvir com atenção os gritos de socorro e agir. Agir em defesa das vítimas de violência doméstica que tantas vezes acabam por morrer às mãos destes ‘abutres’ que tentam desesperadamente esconder o cheiro a morte!
Ativista