A moda da ablação do estômago

A ablação do estômago está a ser estudada e medicamentos como o Mounjaro e o Wegovy fazem sucesso. No entanto, para o cirurgião António Albuquerque, a cirurgia da obesidade continua a ser a solução mais eficaz.

Já ouvimos falar da cirurgia da obesidade e de fármacos como o Ozempic. No entanto, naquilo que diz respeito ao excesso de peso, agora os órgãos de informação internacionais focam-se na técnica da ablação do estômago e nos medicamentos Mounjaro e Wegovy. Mas… Será que o futuro da luta contra a obesidade passa por estas ‘soluções’?

Relativamente ao primeiro método, sabe-se que médicos estão a testar um novo tratamento que promete perda de peso por meio de um procedimento endoscópico que queima o revestimento do estômago, diminuindo a produção de grelina, a hormona que estimula a fome. Esse processo resulta, supostamente, numa redução do apetite e numa perda significativa de peso. O estudo, realizado ao longo de seis meses com 10 mulheres obesas, mostrou que as participantes perderam 7,7% do peso corporal e reduziram os níveis de grelina em jejum em mais de 40%. Além disso, o procedimento diminuiu em 42% a capacidade do estômago, conforme indicado por um teste padrão de ingestão de líquidos.

Os questionários validados revelaram que as participantes sentiram uma diminuição de mais de um terço na sensação de fome. «A obesidade é uma doença crónica que pode afetar quase metade da população dos EUA até 2030, impactando gravemente a saúde, a qualidade de vida e os custos com cuidados de saúde. Precisamos de tratamentos eficazes», declarou Christopher McGowan, gastroenterologista e diretor médico da True You Weight Loss, uma clínica na Carolina do Norte, estado dos EUA.

De acordo com McGowan, o procedimento pode facilitar a perda de peso e reduzir significativamente a fome, sendo uma opção adicional para doentes que não desejam ou não são elegíveis para medicamentos anti-obesidade, como Wegovy e Ozempic, ou para cirurgia bariátrica. O tratamento, intitulado de ablação endoscópica da mucosa, envolve a inserção de fluido para proteger os tecidos subjacentes do estômago e, em seguida, o uso de um pequeno dispositivo para queimar o revestimento mucoso da parte superior do estômago, conhecida como fundo gástrico. A sensação de fome origina-se no fundo gástrico quando o estômago está vazio, aumentando a produção de grelina. À medida que o fundo gástrico se enche de comida, a produção de grelina diminui e a fome é reduzida. A ablação da mucosa diminui o número de células produtoras de grelina.

«Se o procedimento se mostrar eficaz a longo prazo e em estudos maiores, poderá complementar a gastrectomia vertical endoscópica, um procedimento de perda de peso não cirúrgico que reduz o tamanho do estômago, ou ser oferecido como um tratamento único que substitui ou complementa outras abordagens», afirmou McGowan. Contudo, António Albuquerque, cirurgião geral dedicado à cirurgia da obesidade, não tem tanta esperança naquilo que concerne a ablação, lembrando, por exemplo, «que o nosso corpo tem a capacidade de regenerar e, no caso da ablação de uma parte do estômago, este órgão até pode voltar a produzir a hormona grelina como inicialmente». Enfatiza também que «ainda é muito cedo para se entender se este procedimento terá sucesso ou não, até porque a amostra do estudo é reduzida» e declara também que «é extremamente importante esclarecer que este método não constitui uma cirurgia, pois as pessoas podem pensar que existe uma cirurgia inovadora para tratar a obesidade e não é esse o caso».

O médico frisa que «a obesidade resulta de vários fatores, incluindo genéticos, que são difíceis de controlar e podem causar outras condições de saúde, como diabetes, hipertensão e dislipidemia», sendo que, falando da técnica cirúrgica para tratar a obesidade, diz que esta «deve ser baseada numa avaliação abrangente do doente, envolvendo várias especialidades médicas», ressaltando que nada funciona como «um milagre», mas assumindo que a intervenção cirúrgica pode ser a melhor opção quando outros métodos, como medicamentos, dieta e exercício, não são eficazes.

O coordenador Clínico da Clínica Obesidade e da Clínica Endocrinologia, Diabetes e Nutrição do Hospital Cruz Vermelha compara diferentes técnicas cirúrgicas, observando que a banda gástrica está a tornar-se menos popular devido às suas limitações. Por isso, concentra-se no sleeve e no bypass gástrico, explicando que o sleeve reduz o tamanho do estômago e diminui a produção de grelina, enquanto o bypass gástrico limita a ingestão de alimentos e altera a absorção de nutrientes. O minibypass gástrico, criado por Robert Rutledge, simplifica o procedimento, reduzindo o tempo operatório e melhorando os resultados na perda de peso e controlo de comorbidades.

Quanto aos medicamentos como Ozempic e Saxenda, e agora o Mounjaro e o Wegovy, que ainda não chegaram a Portugal, o médico, que é vice-presidente da Sociedade Portuguesa para o Estudo da Obesidade (SPEO), afiliada da European Association for the Study of Obesity (EASO), menciona que «não são soluções mágicas para a obesidade e muitas vezes são insuficientes para casos graves», adiantando que, «embora ajudem na perda de peso, as cirurgias de obesidade ainda são o método mais eficaz para uma perda de peso consistente e duradoura».

Administrados por injeção subcutânea semanal, controlam a glicemia e o apetite, mas podem causar efeitos colaterais como náuseas, vómitos, constipação, cólicas e diarreia. O Ozempic e o Wegovy contêm semaglutida, um agonista do recetor GLP-1, que estimula a secreção de insulina após refeições com hidratos de carbono, ajudando a controlar os níveis de açúcar no sangue. Já o Mounjaro usa tirzepatida, que é um agonista dos receptores GLP-1 e GIP, potencializando os efeitos da insulina. O Ozempic e o Mounjaro são indicados para diabetes tipo 2, enquanto o Wegovy é aprovado para o controlo da obesidade em adultos com IMC igual ou superior a 30 kg/m2 (obesidade) ou 27 kg/m2 (excesso de peso). A tirzepatida também mostrou eficácia na perda de peso.

Além destes fármacos, a Novo Nordisk está a testar um novo medicamento, a amicretina, que pode ser mais eficaz contra a obesidade do que os atuais. Num ensaio clínico, 16 pessoas perderam cerca de 13% do peso em três meses com a amicretina. Estes resultados foram anunciados a 7 de março. Ao contrário dos medicamentos baseados em semaglutida, que são administrados por injeções semanais, a amicretina é tomada em comprimidos.

O presidente da Novo Nordisk, Martin Holst Lange, estima que o medicamento poderá ser comercializado dentro de uma década. A empresa ainda tem de realizar mais estudos para confirmar a segurança e eficácia a longo prazo da amicretina. As ações da Novo Nordisk subiram mais de 8% após o anúncio dos dados iniciais do estudo, alcançando valores históricos e ultrapassando a Tesla em valor de mercado. A empresa também está a desenvolver uma forma injetável da amicretina, com resultados esperados para 2025.