Pelo aeroporto

Chego sempre à conclusão de que a maior parte das pessoas não sabe comportar-se num avião (e não só)

Querida avó,

Sempre que viajo de avião, deixa-me desesperado as duas horas que temos de aguardar no aeroporto! Para mim era como apanhar o comboio.  A pessoa sabe a hora de partida, chega 5 minutos antes e apanha o comboio. Ou, por vezes, chega em cima da hora e dá uma corridinha. Agora estar ali 120 minutos antes da hora marcada… Isto se o avião não tiver atrasos! Já tenho estado três horas à espera de avião, que acrescem às duas horas anteriores… como dizia o outro “È fazer as contas”.

O que me vale é que levo sempre comigo os maiores livros que tiver para ler. Bem como o meu gosto pela observação. Sabes, por acaso, a razão das janelas dos aviões serem ovais? Se a janela for quadrada, a probabilidade de se formar uma fissura é maior. 

E sabes porque nos pedem para levantar e baixar os estores sempre que levantamos voo ou quando estamos prestes a aterrar? Se os estores estiverem abertos durante a descolagem e aterragem é possível que a tripulação veja o exterior e avalie as condições de evacuação mais rápidas, em caso de acidente. 

Chego sempre à conclusão de que a maior parte das pessoas não sabe comportar-se num avião (e não só)!

Mal chamam para embarque os prioritários vai tudo a correr com o bilhete na mão. Julgo que na verdade os que as pessoas ouvem é: “Os preços das roupas do El Corte Inglés estão ao mesmo preço das roupas da Primark”, então entra tudo em histeria. 

Mal entram no avião ficam todos analfabetos. Não conseguem saber o número e a letra que corresponde ao seu lugar. Ficam ali no meio do corredor, meio aparvalhados, de mala na mão… sem andarem nem para trás nem para a frente.

Há ainda quem aplauda quando o avião aterra… Os únicos profissionais que devem ser aplaudidos no final do desempenho do seu trabalho, são os que trabalham na área do espetáculo, não os pilotos.

Tanto que fica por dizer…

Querido neto,

Como sabes, adoro aeroportos. Cada vez que viajo vou com muita antecedência para o aeroporto, como tal, conheço-os muito bem. Talvez que aquele que conheça pior seja o nosso.Mas o de Frankfurt e o de Orly conheço-os como os meus dedos. 

Sabias que no de Frankfurt há uma salinha onde se pode dormir enquanto se espera pelo avião?

E no de Orly há um hotel que fica bem perto da pista, onde Já lá fiquei muitas vezes. Sobretudo quando eu vivia longe de Orly e tinha de apanhar um avião muito cedo: ia de véspera e ficava lá. Era muito engraçado dormir a olhar para os aviões, ali na nossa frente. Sabes o que havia nos nossos minúsculos quartos? Uma garrafa de água…e preservativos. O essencial, claro!

Tenho muitas histórias passadas em aeroportos, como, por exemplo aquele dia em que eu ia para os Estados Unidos e encontrei a Amália, que também ia para lá. Achei estranho que estivesse sozinha e não levasse nenhuma bagagem. Muito mais tarde – e porque ela o contou – soube que ela estava com uma grande depressão e ia para se matar mas, ao ver na televisão do quarto, uma série de filmes com o Fred Astaire, riu tanto que desistiu da ideia e regressou a Lisboa.

Mas a história de que gosto mais foi a que se passou com o meu querido amigo e camarada dos jornais Baptista Bastos. Um dia estava ele num aeroporto e viu a Ava Gardner. Já muito velha, claro, mas logo ali ele pensou em fazer-lhe uma entrevista.

Chegou-se junto dela:

«Desculpe..É a Ava Gardner?!»

E ela:

«Fui. Fui a Ava Gardner.»

Não lhe fez uma entrevista – mas escreveu uma crónica extraordinária.

E que tal fazerem voos sem crianças? Existem viagens muito complicadas… onde vamos o caminho inteiro a ouvir a berraria das crianças, e a barulheira infernal dos aparelhos eletrónicos com que os progenitores tentam, sem grandes resultados, entreter as criaturas birrentas.