Nesta altura do ano, sobretudo para quem tem filhos, é inevitável lembrar as memoráveis e já distantes ‘férias grandes’. Dias longos, luminosos e quentes que pareciam não acabar, quando ainda não conhecíamos o pulsar apressado do relógio. Bastávamo-nos a nós próprios, sem grandes exigências. Só pelo facto de termos um tempo infindável para brincar, para imaginarmos e criarmos as nossas próprias brincadeiras, para estarmos em casa sem grandes preocupações ou em casa dos avós, mesmo que por vezes entediados, sentíamos que nos tinha saído a sorte grande. E no auge das férias, quando nos diziam para fazermos a mochila e juntávamos todos os brinquedos de que mais gostávamos, aqueles de que tínhamos mais dificuldade de nos separar, mais a pá e o balde, sentíamo-nos no auge da felicidade.
Seguiam-se as intermináveis viagens de carro, rumo ao destino de férias. Muitas vezes eram viagens monótonas, longas, quentes e desconfortáveis, mas também com momentos divertidos de jogos, brincadeiras, histórias e cantorias. Quando não havia nada para fazer, tínhamos de nos contentar a olhar pela janela, apreciar as árvores que passavam depressa, as diferenças de vegetação, imaginar o que estaria para além das planícies ou da florestação densa. Outras vezes acenávamos aos carros que passavam, sobretudo nas longas filas de trânsito. Até que a viagem chegava ao fim e lá saíamos meio trôpegos dos nossos lugares, de mochila às costas, ansiosos por chegar ao novo poiso onde os dias passariam vagarosamente.
Quando olhamos para os mais novos temos a sensação de que desesperam com os dias longos, que encontram nos telemóveis uma forma de os encurtar e as férias, por vezes, parecem mais um motivo de inquietação e ansiedade do que de descanso e prazer. A sua vida ocupada cheia de atividades e ecrãs tornou-os mais exigentes e quando se veem em casa desocupados e sem objetivos ficam desorientados. Muitos já não sabem brincar, como se tivessem crescido demasiado depressa, as músicas deixam de ser cantadas para serem ouvidas, têm dificuldade de se ocupar sozinhos e ficam demasiado dependentes e enfastiados. Em vez dos longos dias se apresentarem como uma janela aberta de oportunidades e de lazer, se não tiverem atividades concretas ou um ecrã disponível, preconiza-se um vazio incontrolável e entediante.
Seria bom que as férias fossem uma oportunidade para recuperar um bocadinho desse tempo em que se vivia mais devagar, em que se sentia o tempo passar. Resgatar os velhinhos jogos de cartas e de tabuleiro sem luzes ou música de fundo, repletos de momentos imprevisíveis, espontâneos e divertidos, as conversas depois das refeições, as anedotas, as histórias reais ou imaginárias, os passeios, as brincadeiras na água, os castelos de areia e sobretudo a disponibilidade para estar com o outro, de forma mais descontraída e autêntica, de criar momentos memoráveis que aproximam gerações. Que os mais novos possam apreciar esse tempo demorado e construído – um tempo de troca de experiências, de saberes e de afetos – que o possam sentir a passar lentamente, sem exagerar nos ecrãs que lhes roubam as horas dos dias. Para que o tempo deles não se torne tão cedo o tempo apressado dos adultos e que o nosso também possa ser vivido mais devagar, na sua companhia.