Ficaram-me na memória as palavras de Diogo Costa, o excelente guarda-redes da nossa Seleção Nacional de Futebol, que, ao ser entrevistado no final do jogo contra a Eslovénia neste último campeonato da Europa, respondeu com convicção às perguntas que lhe fizeram, enaltecendo sempre a importância que a família tem tido na sua vida. Ao perguntarem-lhe qual a explicação para aquela espantosa e memorável exibição, não podia ser mais claro: «Devo à minha família. A família é o suporte da minha vida».
Fiquei surpreendido e muito sensibilizado ao ver um jovem reconhecer o valor e a riqueza da Família. No momento presente, é um motivo de orgulho que me apraz registar. Por muitas alterações ao conceito de família que a evolução dos tempos possa trazer, a família será sempre a Família. «Se existe algo que caracteriza a família enquanto tal é o relacionamento que se constrói. Relacionamento que tem como base o amor, os valores comuns e o bem do outro» (José Carlos Nunes).
Tendo como pano de fundo a família, há dois pontos que merecem a minha reflexão: o problema dos jovens e a Medicina Familiar.
Os jovens representam, para mim, a mais-valia na abordagem da Família. Se os idosos vão desaparecendo pela lei natural da vida, é nos jovens que a sociedade tem de apostar. Por isso, é preciso criar condições para os fixar na sua terra e eles não terem necessidade de ir procurar lá fora aquilo que lhes é negado no seu próprio país. E Portugal tem caído, sistematicamente, neste erro imperdoável, não aprendendo nada com os resultados desoladores que as últimas décadas têm revelado.
Tudo começa com a entrada para a Faculdade, onde, para certos cursos – como, por exemplo, Medicina -, são exigidas médias elevadíssimas e difíceis de alcançar, sem olhar sequer à vocação, convidando logo os que têm possibilidades económicas a recorrer a alternativas no estrangeiro. Paradoxalmente, chega-se depois à conclusão de que não há médicos suficientes nos locais onde são precisos e contratam-se médicos de outros países! Mas que gestão é esta?
Depois vem o mercado de trabalho, onde o país parece empurrar os jovens para outras bandas fora de seu ‘habitat natural’. É óbvio que alguém formatado a trabalhar noutros países cria lá raízes e dificilmente aceita regressar. E que Família irão estes jovens constituir? Que culpa têm eles do caminho que são obrigados a seguir? Será isto o progresso que tanto nos apregoam?
A Medicina Familiar também está ameaçada e corre mesmo o risco de, um dia, não fazer sentido ser assim designada, dadas as convulsões a que a Família tem sido sujeita.
Acresce que esta aliciante especialidade, cujo projeto bem cedo me cativou, tem vindo a afastar-se dos princípios para os quais foi criada, transformando-se num ‘tapa-buracos’ para colmatar a falta de médicos noutros locais fora das unidades de saúde familiares. Convém ter presente que a Medicina Familiar é um dos pilares do Serviço Nacional de Saúde e tem uma missão específica na comunidade com o seu projeto próprio e diretrizes bem definidas. Uma vez mais é a Família que está em jogo. E quem quiser escolher esta carreira deve estar consciente daquilo que o espera e ter vocação para a exercer, na linha do velho João Semana – o dedicado médico da aldeia, sempre disponível, no qual todos os habitantes confiavam, abandonando-se nas suas mãos.
Vamos, pois, defender a Família. É preciso ajudar os outros a reencontrarem o caminho para a Família. Obrigado, Diogo Costa! Aprecio a tua coragem. Todos nós que comungamos dos mesmos valores aplaudimos calorosamente o teu emocionante testemunho!
Médico