Caros leitores,
Aproxima-se a marca dos 290 dias desta guerra indesejada e que ficará marcada na História da humanidade. Continuam as discussões que esperemos que resultem num cessar-fogo e no regressar dos reféns de volta a Israel, mas até lá vamos todos lidando com ‘mais do mesmo’. Começam a ser publicados relatórios tanto da IDF (Forças de Defesa Israelitas) como da Human Rights Watch (uma das maiores organizações de direitos humanos no planeta) relativamente aos acontecimentos do dia 7 de outubro, que revelam o fracasso do sistema de segurança em Israel, assim como das barbaridades cometidas por pelo menos quatro forças militares de grupos presentes na Faixa de Gaza – Hamas, Jihad Islâmico Palestiniano, Frente Democrática pela Libertação da Palestina, Frente Popular pela Libertação da Palestina -, e pelas Brigadas dos Mártires de Aqsa (anteriormente ligadas ao Fatah). Mais de 3000 terroristas invadiram Israel por terra, ar e mar, e outros tantos civis que aproveitaram para levar alguns ‘souvenirs’ para casa ou que tentaram escapar antecipadamente do que estaria para vir (sem surpresa, mortos pelo Hamas por tentarem fugir de Gaza).
Desde o início da guerra, mais de 19,000 mortars não direcionados foram lançados para Israel – seja desde Gaza (mais de 10,500 e cerca de 5,000 só no dia 7 de outubro) seja desde o Líbano ou Síria -, fora as centenas de drones militares (mais de 150 deles intercetados, outros tantos que não), dos constantes ataques pelos Houthis e pelo Iraque, e da investida massiva do Irão naquele dia em abril. Não fosse Israel investir na segurança do seu povo seja com o Iron Dome, seja com o imenso número de bunkers, e neste momento as casualidades seriam muitas muitas mais e este país estaria em cinzas (neste momento, mais de 9,000 hectares ardidos). Com isto, não estou a justificar os acontecimentos e o elevado número de civis inocentes que sofrem diariamente em Gaza, mas simplesmente a apontar alguns factos para que haja uma perspetiva do que poderia estar a ocorrer no único país 100% democrático do Médio Oriente se a estratégia fosse deixar os seus cidadãos na pobreza ou a morrer enquanto se desfruta de uma vida de luxo e com túneis subterrâneos de esconderijo, e fazer-se de vítima na praça pública.
Neste momento encontro-me fora de Israel e tenho estado em contacto com várias pessoas que têm sofrido com o conflito noutros lados do mundo. Se a islamofobia já é um fenómeno conhecido e de lamentar – até porque os principais ensinamentos do profeta Muhammad incluem ‘ama o teu irmão como te amas a ti’ ou ‘um não deve causar dor aos outros e a si mesmo’ -, e que afeta tantos muçulmanos que querem viver nas nossas comunidades em paz e com um papel ativo no seu desenvolvimento, o antissemitismo é algo não menos comum (mas menos reportado e reconhecido), não menos violento e não menos grave. Em conversas com estudantes e professores nos campos universitários por algumas regiões do mundo, vem-se a descobrir que pessoas que julgamos nós serem curiosas, em procura dos factos que levem à verdade e com um sentido de ética e moral bastante apurado, podem ser as mais incendiárias e intelectualmente preguiçosas. Desde casos de vandalismo às universidades ou propriedades privadas (algumas delas, em nada relacionadas com o judaísmo ou Israel ou a própria universidade), à violência física e verbal (’não toques nesse zionista ou ficas contaminado’), aos apelos para ‘gasear os judeus’ ou ‘intifada’ ou ‘Palestina do rio até ao mar’ (outra vez, nesta frase está implícito o desaparecer do estado de Israel), às rejeições dos comités científicos em aceitar artigos científicos pela simples razão do/a professor/a em questão ser ‘zionista’, ou do premiar com créditos extra aos ‘alunos que fizeram parte dos protestos’, nada disto traz união, diálogo ou paz. É bem compreensível as chamadas de ação para terminar com esta guerra horrorosa, para questionar o porquê da necessidade de tanta destruição em Gaza, para contestar as ações dos extremistas nos colonatos, e outras causas. E muitos daqueles que acham que Israel continua no seu legítimo direito de ir atrás do Hamas creio estarem abertos a uma troca de impressões e de uma conversa construtiva, por mais que possa não haver um acordo de ideias no final. O real problema começa quando deixamos de ter a capacidade de entrar em diálogo com pessoas com opiniões opostas, em particular quando deixamos de reconhecer a humanidade no outro e começamos a incitar à violência, apelando à punição coletiva em bem da decisão de meia dúzia, e usamos o ‘bode expiatório’ para delegar toda a culpa daquilo do qual não conseguimos tomar responsabilidade ou sobre o qual nada podemos fazer.
A todos os alunos e professores nas universidades e institutos de ensino, judeus e muçulmanos, que lá se encontram para poder estudar, ensinar e progredir as nossas áreas científicas e tecnológicas sem interferir na vida dos outros, muita força e coragem! A todos aqueles que deixam de lado o diálogo honesto e respeituoso, tenham juízo e lembrem-se que os outros são seres humanos com sentimentos como vocês! E a todos os restantes, continuem a ser curiosos pela dor dos dois lados e, na falta de melhor solução, façam orações para o terminar deste e dos outros conflitos.
Este será o meu último artigo até meados de setembro (e se a guerra terminar até lá, muito possivelmente será o fim da minha colaboração), pelo que esperemos todos por notícias melhores.
#BringThemHomeNOW