Devo confessar que não sou um espetador assíduo de telenovelas, pois, quando vejo televisão dou mais importância a debates e entrevistas do que a outro tipo de programas. Há algum tempo, abri uma exceção por ter conhecido uma jovem que já tinha participado em novelas anteriores contracenando com nomes sonantes do teatro e que fora de novo convidada a integrar o elenco de outra novela da SIC – Senhora do Mar. Posso mesmo dizer que foi Francisca Salgado que me obrigou a seguir atentamente aquele programa televisivo onde atuam também outros atores que conheço de há longa data. Em minha opinião, a novela está muito bem escrita e tem uma interpretação excelente de todos os intervenientes tanto nos papeis principais como nos secundários e retrata fielmente uma sociedade onde há ‘trigo e joio’ a crescerem lado a lado. Em determinado momento da historia, assistiu-se à destruição do par amoroso, ainda para mais sendo ele vitima de uma morte violenta. Nas redes sociais os espetadores reagiram de imediato, criticando das mais diversas formas aquele desfecho, com ameaças até de não voltarem mais a seguir o canal televisivo!
Compreendo perfeitamente tais reações que, em minha opinião, são sinais dos tempos que estamos a viver. É que, nesta sociedade, parece dar-se mais valor aos ‘maus’ do que aos ‘bons’, ou seja, o mal tem de prevalecer sempre sobre o bem. Há ainda a ter em conta que no momento atual, as pessoas estão saturadas de pandemias, de guerras, de conflitos, da corrupção e da impunidade que se associa e preferem refugiar-se nos contos de fadas e histórias de amor do que assistir a este cenário desolador que nos é posto constantemente diante dos olhos. Então coloca-se a questão: que mensagem se deve passar numa telenovela? A historia deve ter em conta os espetadores ou as audiências? Ir atrás do óbvio é assim tão desinteressante? Será razoável ‘cozinhar’ à pressa um final feliz só para agradar ao público?
Tudo isto é discutível e merece uma análise cuidadosa e isenta. Sinceramente tenho dúvidas quanto ao melhor caminho a seguir, mas, uma coisa é certa: nunca se pode agradar a todos. Saindo da área televisiva encontramos idênticas interrogações noutros setores. Na politica, por exemplo, um governo deve governar a pensar no país ou em não perder votos nas próximas eleições? Nas empresas a atenção principal é o mercado em geral ou o lucro que se obtém? No campo desportivo dá-se mais valor ao resultado final ou à exibição da equipa? E no meu ramo profissional qual deve ser a minha primeira prioridade, o doente ou as despesas e receitas? Como médico de família ponho os olhos apenas no doente ou preocupo-me também com a sua família que, nalguns casos, interfere negativamente na relação médico-doente? Por muito bom senso que se tenha, a resposta certa é sempre difícil de encontrar. Falando de bata branca vestida, para nós médicos, o doente é o mais importante. A sua vontade tem de ser respeitada e ninguém pode ir contra aquilo que ele escolheu. Porém, a sua família, também não pode ser ignorada e em certas situações a decisão a tomar deve ser partilhada com os familiares mais próximos. Chama-se a isso responsabilidade partilhada, procedimento que nenhum clínico pode ultrapassar principalmente nos tempos que correm onde os pareceres médicos são cada vez mais postos em causa.
Voltando à telenovela e aos recados que nos deixa, nomeadamente as chamadas de atenção para o flagelo da violência doméstica, dos negócios obscuros, das crendices e da luta pelo poder, entre outros, fica-me na memória o trabalho notável e de grande qualidade de todo o elenco que executou na perfeição tudo o que lhes foi pedido. Gostei muito de te ver Francisca! Quanto ao teu desempenho no papel de Anabela, só te posso dizer: BRAVO! Tens um longo caminho à tua frente. Continua!
Médico