Todos nós desejamos e procuramos o melhor para os nossos filhos. Que sejam felizes, saudáveis, educados, boas pessoas. E também, capazes, autónomos, audazes, competentes, responsáveis e, já agora, bons alunos.
Para isso tentamos acompanhá-los e procuramos – cada vez mais – ajuda exterior para estimular as áreas que achamos mais importantes ou vulneráveis.
Logo em pequenas, as crianças começam a frequentar várias atividades e terapias criando a ilusão de que assim estarão reunidas as condições para um desenvolvimento ideal.
Somos pais cada vez mais presentes e dedicados, mas também mais inseguros e controladores.
Procuramos atividades extracurriculares para os nossos filhos que promovam a autoestima, a autonomia, a confiança, a relação com os outros, a destreza, a habilidade, o talento ou o reconhecimento, quando, muitas vezes, nós próprios – numa preocupação constante – não acreditamos verdadeiramente neles e tornamo-nos excessivamente intrusivos e protetores.
Os pais que colocam os filhos na equitação ou patinagem para que ganhem autoconfiança são, muitas vezes, os mesmos que não os deixam trepar às árvores ou ir para casa sozinhos quando já o poderiam fazer. Os que os inscrevem em desportos de equipa para aprender a ganhar e a perder, a conviver e gerir conflitos, são os que quando a criança chega a casa aborrecida com um colega ou um professor pegam no telemóvel e resolvem a situação com os seus próprios dedos. Aqueles que querem que os filhos se tornem autónomos são os mesmos que oferecem um telemóvel para lhes ligarem ao longo do dia a perguntar se almoçaram devidamente, se estão com frio, se estão com os amigos ou se há alguma criança ou professor que os tenha tratado menos bem. Todas as notícias chegam a casa em tempo real, muito antes do toque de saída, e os pais são a almofada constante para todos os males. Esta corrente, além de não deixar as crianças conviverem livremente, não lhes permite aprender a desenvencilharem-se. Muitos jovens acabam por crescer numa pseudo independência, quando no fundo têm todos os movimentos controlados pelo telemóvel, pelo cartão da escola ou pelo GPS.
Este hiperprotecionismo e preocupação constantes não acompanham o crescimento dos filhos e pode mesmo torná-los mais incapazes, dependentes, ansiosos ou inseguros. Ainda talvez herança do confinamento, quantos pais não fazem os trabalhos de casa dos filhos para lhes garantir uma boa nota? Quantos lhes fazem a mochila para terem a certeza de que não lhes falta nada, lhes levam à escola aquilo de que se esqueceram, consultam os grupos de mães para saber o que os filhos não ouviram ou não conseguiram passar nas aulas? Sem se aperceberem, passam perigosamente a ideia de que os filhos são incapazes e que só eles têm competência para resolver os seus problemas.
Como podem estas crianças tornar-se confiantes, autónomas e seguras se não lhes é permitido ter conflitos só seus e resolvê-los, cometer os seus próprios erros, as suas loucuras?
As atividades e terapias não fazem milagres. É, sobretudo, a confiança que os pais depositam nos filhos e que demonstram diariamente, que os vai fazer acreditar em si, que os tornará capazes de resolver os seus próprios conflitos e desafios, de trabalhar e desenvolver projetos autonomamente, de se relacionarem, de aprender que depois de errarem podem acertar. De descobrir que não são de cristal, mas de uma espécie de plasticina, de borracha ou de qualquer material que afinal nem se estilhaça com uma pequena queda, mas que resiste, aprende e se transforma para a vez seguinte. l
Psicóloga na ClinicaLab Rita de Botton
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