Na espuma dos dias…

O tempo encarregar-se-á de demonstrar que um Governo com menos de 30% dos votos não se pode comportar como se tivesse maioria absoluta.

I. Enquanto metade do país político se entretinha com uma pretensa provocação sobre auriculares e telemóveis, o Governo fez saber a Bruxelas que prevê um crescimento médio da economia nacional de 2%. Um valor inferior à média registada nos últimos 8 anos (2,2%) e abaixo da promessa eleitoral de crescer acima dos 3% ao ano.

Enquanto alguns se entretinham com o anseio do primeiro-ministro por uma comunicação social «mais tranquila e menos ofegante», o Conselho de Finanças Públicas esperava, sem sucesso, que o Governo cumprisse a obrigação de facultar os dados indispensáveis para avaliar o crescimento da despesa líquida do Estado.

Aproveitando a folga orçamental deixada pelo anterior Governo, o atual ensaia um estado de graça que os resultados obtidos nas eleições legislativas não recomendam nem autorizam, na esperança que a estratégia montada enfraqueça o PS no meio da tenaz entre a AD e o Chega.

No entanto, há, de facto, mais vida para além do Orçamento e entre a inconsequência do Chega e as gritantes contradições do exercício orçamental da AD, o tempo encarregar-se-á de demonstrar que um Governo com menos de 30% dos votos não se pode comportar como se tivesse maioria absoluta. Montenegro não é igual a Cavaco, nem Pedro Nuno Santos se assemelha a Constâncio, nem, já agora, Marcelo se aproxima de Soares. O ecossistema político português é, de longe, muito diferente do de 1987.

II. Ao longo da última semana, foram várias as notícias sobre os primeiros rascunhos da Comissão Europeia para o próximo Orçamento da União (pós 2027). A fazer fé nessas notícias, pode estar em causa uma alteração radical na forma como as regiões em cada Estado-Membro participam na decisão e na gestão dos fundos com uma centralização dessas competências apenas na Comissão e nos governos nacionais. Embora ninguém ignore a urgente necessidade de simplificar e agilizar o complexo figurino de fundos e programas comunitários, a gestão partilhada e a política de coesão foram – e são – indispensáveis na construção e consolidação do projeto europeu.

III. Com resultados negativos a avolumarem-se ano após ano, o grupo SATA – que detém a mais antiga companhia aérea portuguesa – enfrenta hoje um desafio existencial. São muitas as dificuldades para uma empresa que, na prática, assegura o princípio da continuidade territorial e o acesso de parte da população portuguesa ao mercado único europeu. É, por isso, essencial perceber como está a Comissão Europeia a acompanhar o processo de reestruturação do grupo (aprovado em meados de 2022) e que avaliação faz, no contexto atual, do processo de privatização da Azores Airlines.

Eurodeputado eleito pelo PS