EUA: passado e futuro passam pela Pensilvânia

A não exigência de identificação facilita a imitação de assinaturas em boletins de pessoas que não tencionam ou não podem votar

O que é que os factos mostram sobre a eleição presidencial nos EUA? Em 2020, Biden ganhou com 51% dos votos contra 47% de Trump, 306 contra 232 eleitores no colégio eleitoral e 81,2 milhões de votos contra 74,2 milhões. Mais de 41% de votos foram realizados por via postal, cerca de 55% dos votantes democratas e 32% dos republicanos. Os democratas mostraram mais confiança no Estado, com maior medo da pandemia e promoção do voto postal.

As eleições são organizadas a nível estadual, pelo governador e outros oficiais eleitos, com regras diferentes na identificação dos votantes e na validação dos votos. No voto postal, uns Estados não exigem identificação, bastando uma assinatura, outros exigem uma cópia de um documento, mesmo sem fotografia, e outros exigem documento com fotografia. Em Portugal é obrigatório uma cópia do cartão de cidadão ou do passaporte sob pena de anulação do voto.

No caso de não ser exigida identificação, os votos são verificados pela comparação da assinatura no voto com a do registo do eleitor. 69% dos democratas eleitos para o colégio eleitoral em 2020, onde se escolhe o Presidente, eram de Estados que não exigiam identificação, apenas assinatura. No caso dos republicanos foram apenas 2,6%.

Quase todos os Estados que não exigem identificação foram ganhos por Biden e tinham governadores democratas a gerir o processo eleitoral e os registos de novos votantes (e a legalização de imigrantes). O argumento democrata para dispensar a identificação é a recusa de interferência estatal na liberdade individual, o que contradiz a confiança mostrada na pandemia e a ambição de ter mais estado na sociedade, como na Europa. 

Estes factos, pouco divulgados em Portugal, explicam a polémica do voto postal e a recusa de Trump em aceitar os resultados. A não exigência de identificação facilita a imitação de assinaturas em boletins de pessoas que não tencionam ou não podem votar. Mas é verdade que os republicanos podem controlar o processo, o que não terá acontecido de forma exaustiva em 2020, e que Trump não conseguiu provar a existência de fraude. 

A recusa de identificação e a deficiente verificação de votos pode ter sido agravada por decisões recentes. Na Califórnia, o governador democrata proibiu todos os condados de exigirem identificação no voto. Na Carolina do Norte, onde Trump ganhou por 74 mil votos e o governador é democrata, foram anulados 747 mil eleitores após queixa dos republicanos. Destes, 317 mil estavam em duplicado. No Arizona, onde Biden ganhou por 0,3% dos votos (10 mil em 3,4 milhões) e o governador é democrata, Trump lidera as sondagens, mas o Supremo Tribunal aceitou 98 mil votantes com cidadania dúbia para os republicanos (leia-se imigrantes).

Face a dúvidas sobre o processo, Trump anunciou um ‘exército’ de voluntários para o acompanhar. Para ganhar, tem de recuperar 38 votos do colégio eleitoral. Assumindo que mantêm os Estados onde ganhou em 2020, poderá recuperar 27 no Arizona e na Geórgia, onde lidera as sondagens. Os restantes 11 podem vir da Pensilvânia (19 votos no colégio eleitoral) ou do Michigan (15 votos). Em 2020 Biden ganhou no primeiro por 80 mil votos (1,2% do total) e no segundo por 154 mil (2,8% do total). Os governadores dos dois Estados são democratas, mas apenas é requerida identificação para votar em Michigan. Na média das sondagens, os candidatos estão empatados na Pensilvânia e Kamala lidera no Michigan por 0,7 p.p.

O atentado à vida de Trump ocorreu na Pensilvânia e a sua campanha fez uma homenagem marcante – com a Avé Maria de Schubert – ao bombeiro morto, numa aposta para que junte o local da declaração de independência com o da decisão sobre o próximo Presidente dos EUA.