Há quem diga que tem tudo aquilo que um ator de Hollywood quer: talento. E o que todo o ator na Inglaterra deseja: aparência. Diz que tem «uma capacidade altamente desenvolvida de autoengano», por isso, não lhe é difícil «acreditar que é outra pessoa». Para si, a vida vem primeiro e, por isso, o que vê nas personagens, primeiro tenta ver na vida. Dizem que é bastante quieto e introvertido. Não era popular na escola e foi, muitas vezes, ridicularizado enquanto crescia em Inglaterra, em parte porque é meio judeu. No entanto, conseguiu tirar algo de bom disso: ao invés de socializar, desenvolveu uma vida de fantasia que acabou por ajudá-lo, mais tarde, a mergulhar profundamente nas suas personagens. Aliás, é conhecido por ter passado por processos duros e extravagantes para chegar até a algumas delas.
E, pelos vistos, valeu a pena, já que é considerado, ainda hoje, o maior vencedor do Óscar de Melhor Ator, tendo arrecadado três estatuetas nessa categoria, por interpretar o escritor irlandês deficiente Christy Brown em O Meu Pé Esquerdo, o homem do petróleo Daniel Plainview em Haverá Sangue e Abraham Lincoln em Lincoln, de Steven Spielberg. Foi ainda nomeado por Em Nome do Pai e Gangues de Nova Iorque e distinguido com a designação de cavaleiro bacharel do império britânico pelo duque de Cambridge em 2014.
Uma reforma precoce
Em 2017, depois de ter dado vida a Reynolds Woodcock, no drama histórico Linha Fantasma, de Paul Thomas Anderson, surpreendeu os fãs dizendo que esse seria o seu último filme. «Daniel Day-Lewis já não trabalha como ator», informou o seu representante, na altura, num comunicado. «Ele está imensamente grato a todos os seus colaboradores e ao público ao longo dos anos. Esta é uma decisão privada e nem ele nem os seus representantes farão qualquer outro comentário sobre este assunto», acrescentou. No entanto, a vontade de se reformar precocemente aos 60 anos já era antiga. Segundo o The Guardian, o artista já havia feito longas pausas na indústria do cinema, incluindo um período em que trabalhou como aprendiz de sapateiro em Florença na década de 1990. Além disso, de acordo com o Times, na adolescência, este pensou ser marceneiro – sempre foi uma paixão desde a infância. «A minha vida longe do set de filmagem, é uma vida em que sigo as minhas curiosidades tão avidamente como quando estou a trabalhar em cinema», disse ao Observer em 2008. «É de uma forma muito positiva que me mantenho afastado do trabalho por algum tempo. Sempre me pareceu natural que isso, por sua vez, me ajudasse no trabalho que faço», explicou.
O regresso do astro do cinema
Até agora, todos pensámos que este tinha mesmo colocado fim à sua carreira na sétima arte. No entanto, parece que este decidiu voltar e por uma razão muito especial: para protagonizar Anemone, o primeiro filme realizado pelo filho Ronan Day-Lewis, de 26 anos. Apesar da data de estreia ainda não ter sido revelada, sabe-se que a narrativa – escrita pelo pai e filho – vai explorar «a relação complicada entre pais, filhos e irmãos, além da dinâmica dos laços familiares», revelou a IndieWire. Além de Day-Lewis, o elenco da longa-metragem conta com a participação de Sean Bean, Samantha Morton, Samuel Bottomley e Safia Oakley-Green, estando a ser filmado em Manchester.
Nascido em 1957, em Londres, no seio de uma família com largas tradições cinematográficas, a sua estreia nos cinemas deu-se no filme Domingo Maldito, em 1971, quando Lewis ainda era adolescente. Uma década depois – após atuar em telefilmes e séries de televisão – o ator fez a sua primeira atuação creditada em Gandhi, em 1982. Seguiram-se inúmeros filmes e êxitos, onde Daniel deu provas do seu talento.
De acordo com o Times, o artista é conhecido por «exagerar um pouco na construção das suas personagens». Viveu durante alguns dias na selva do Alabama para se preparar para o seu papel de um homem branco, do século XVIII, criado pelos indígenas que tenta defender a sua tribo de ataques, no filme O Último dos Moicanos, em 1992. Enquanto filmava a biografia de Jim Sheridan – sobre o poeta irlandês paralisado Christy Brown, que nasceu com paralisia cerebral – o ator recusou-se a sair da personagem mesmo quando as câmaras estavam desligadas. Ou seja, Day-Lewis passou algum tempo numa cadeira de rodas, ocasionalmente tendo que ser carregado para diferentes partes do set, e até teve de ser alimentado pelos colegas nas refeições.