Uma ameaça… à população mundial

Talvez o ‘povo’ esteja a dizer aos políticos que não vale a pena continuar a governar o povo com paternalismos, porque o ‘povo’ não precisa de lições de moral

É estranho o que se está a passar no mundo. Parece que os cidadãos se encontram numa espécie de autodestruição de tudo o que foram construindo nos últimos cem anos… 

A eleição de Donald Trump é disso testemunha. A reação dos jornalistas e comentadores é admirável. Como é possível? Como se pode entender que tenha ganho alguém que diz que os haitianos ‘comem os cães; comem os gatos’?

Como foi possível que os americanos se deixassem enganar pelo encantador de serpentes e votassem esmagadoramente em Trump? Como é possível?

Este, porém, não é um fenómeno único. Também na Europa nos temos admirado com as voltas que o mundo dá. Como é possível que estejamos a ceder aos populismos? Como é possível que estejam Melloni, Orbán ou Le Pen a ganhar espaço e poder na democracia? Como é possível que o André Ventura, um populista português, esteja a crescer de um para cinquenta deputados?

Criou-se a ideia de que o progresso e a prosperidade viriam pelos partidos políticos e que o ‘povo’ tem o poder nas suas mãos para escolher o rumo do seu futuro. Acontece que a ilusão de que o ‘povo’ vive numa democracia e que escolhe o seu destino tornou-se uma mentira e uma ilusão… 

As políticas e os políticos das últimas décadas demonstraram que é uma ilusão que os portugueses, os italianos e os franceses e até mesmo os americanos têm o poder nas suas mãos no dia do voto. 

E porque digo que é uma ilusão? Primeiro porque a manipulação das massas através da comunicação é incrível. As discussões, os debates e as entrevistas estão viciadas à partida. Depois, porque ao ‘povo’ não se importa propriamente do programa político de cada partido – esse dom metafísico que desce dos céus para guiar o seu povo. Ao ‘povo’ interessa-se em viver em paz, em segurança e em liberdade.

O ‘povo’ levanta-se todos os dias às seis e meia e vai a correr para o trabalho, às vezes sem tomar o pequeno-almoço. O povo apanha o autocarro e o comboio que está sempre em greve e a meio passa pelas creches para que outras mães tomem conta dos seus filhos. O ‘povo’ passa o dia a trabalhar e chega a casa às oito horas da noite e não tem empregada. O ‘povo’ no fim de semana também não tem uma casa de campo com piscinas construídas sem alvará da Câmara Municipal. 

O certo é que o ‘povo’ depois de trinta dias a matar-se a trabalhar, chega ao fim do mês, paga a renda e vai às compras e espera mais trinta dias para receber o próximo ordenado. É como se fosse uma roda do eterno retorno. E o ‘povo’ sabe que esta roda não vai parar até ao final dos seus dias. 

O que os exemplos da América, França, Itália e Portugal nos estão a dizer deve ser interpretado corretamente. Classificamos os populismos como uma espécie de política baixa que é incapaz de elevar o povo a uma condição virtuosa. Porém, o populismo tem sempre na base o ‘povo’ e as suas necessidades. 

Talvez o ‘povo’ esteja a dizer aos políticos que não vale a pena continuar a governar o povo com paternalismos, porque o ‘povo’ não precisa de lições de moral. O ‘povo’ – no qual eu me incluo – precisa de ter governantes que deem respostas às suas necessidades do dia a dia.