Quando Trump venceu em 2016, perante a estupefacção generalizada e contra as previsões e sondagens, muitos se precipitaram em reduzi-lo a um percalço político. Neste mandato teve ao seu lado um representante da América conservadora, Pence, e muitos quadros vindos do Partido Republicano, que ainda não era seu e o olhava de lado. As ideias de uma America first, do combate à invasão migratória, de oposição ao progressismo liberal, do proteccionismo económico, entre outras, eram posições fortes e assumidas. No entanto, careciam de uma estrutura ideológica e executiva, e Trump, especialmente com a sua omnipresença e loquacidade, passava a imagem fragilizada de um one man show. No final, para os mais atentos na direita nacional, esta administração havia sido uma «oportunidade perdida».
Para os seus inimigos, a vitória de Biden veio «repor a normalidade». O sistema voltava a funcionar sem interrupções ou, pelo menos, sem erupções. A confiança era total e, por isso, a derrota de Kamala foi o cataclisma que os seus apoiantes nunca imaginaram.
Neste segundo e retumbante sucesso eleitoral de Trump, há ensinamentos fulcrais a reter.
A vitória é possível. É a lição mais importante deste renascimento, que confirma que não há verdadeiras mortes políticas. A direita habituou-se à derrota, ou às «vitórias permitidas», e esta é uma demonstração de que se pode ganhar sem cedências ou compromissos. Trump nunca seguiu uma estratégia de «desdiabolização» ou procurou a «respeitabilidade» perante os seus oponentes. Também não adoptou a linguagem ou os conceitos dos seus inimigos na «guerra das palavras» e, em vez de se submeter, criou a sua linguagem e definiu os seus próprios conceitos. Esta é uma das chaves do poder.
A liberdade de expressão é essencial. Nos EUA os candidatos não estão sujeitos à judicialização do discurso político dos países europeus. No entanto, não se podem menosprezar os efeitos das políticas de cancelamento e apagamento. Por isso, a defesa da liberdade de palavra tem de ser intransigente.
O sistema não é infalível. Os media ditos de referência, a maioria das estrelas do show business, as principais universidades e grupos económicos declararam o seu apoio a Kamala, mas a vontade popular superou-os.
A identidade é o combate pelo futuro. Trump falou aos americanos enquanto povo, não falou às diferentes comunidades. Este espírito nacional foi unificador e demoliu o discurso dos que pregam a «diversidade» enquanto desprezam o povo «deplorável».
A imigração em massa é uma ameaça. A forma de a combater não pode ser a que nos trouxe ao estado actual. Além da necessidade de fronteiras e da sua defesa, o repatriamento não pode ser excluído na contenção de fluxos migratórios desregulados.
A guerra cultural interessa. O wokismo e a delirante teoria de género têm pelo menos o mérito de ter despertado muitos à direita para a necessidade do combate cultural como arma política.
Tendo em conta a alteração estrutural no Partido Republicano, a escolha de Vance e o alinhamento ideológico da futura administração Trump, não estamos perante uma mera reacção da direita. A janela de oportunidade que se abre com os plenos poderes conquistados permite uma verdadeira revolução conservadora. Mas Trump é imprevisível e nada está garantido. O exemplo passado não foi o melhor e resta saber o que vai concretizar depois deste entusiasmo inicial.
Por outro lado, a nova política internacional norte-americana provocará alterações de fundo na ordem vigente. No entanto, as dificuldades que muitos prevêem para a Europa podem, ao mesmo tempo, ser uma oportunidade, forçando os europeus a tomar em mãos o seu próprio destino.
O trumpismo é um fenómeno que, deste lado do Atlântico, nos é estranho e até bizarro, mas nem por isso deixa de ser uma valiosa lição – da mesma maneira que nunca poderá ser um modelo.