É domingo e a Igreja está fechada

Depois da festa das Forças Armadas

BISSAU – Acordo com o muezzin a cantar a primeira oração do dia. «O sol nasceu», penso para comigo ensonado. Dou mais umas voltas na cama. O domingo estende-se à minha frente e saio com o meu amigo Ari pelas ruas da cidade que a pouco e pouco começa a ferver. Passamos pelo mercado central para comprar fruta e pasta de dentes. É o único local onde homens e mulheres rodam como num vespeiro. Daí para diante, até  ao Forte Velho e ao cais, vamos pela Rua do 3 de Agosto, pisamos buracos e passamos por velhas casas coloniais degradadas que dão um toque de tristeza à tarde calma e à frescura que se sente, subitamente, vinda das margens do Geba. O bairro tem um nome sonoro: Chão de Papel. De papel não é com certeza. Tem restos de alcatrão, terra seca, crateras que desfazem com facilidade as suspensões de qualquer jipe.

Ontem foi dia de Estadão. Ari não mostra entusiasmo: «Festa dos militares…», resume. No sábado as Forças Armadas da Guiné-Bissau comemoraram os seus 60 anos. A Avenida Amílcar Cabral foi coberta com toldos e viam-se casacos verdes e boinas vermelhas numa azáfama. O povo ignorou o mais possível. «É com eles», diz um Ari quase monossilábico. Para serem mais cativantes, os generais, sobretudo Biaguê Na N’tan (Chefe do Estado Maior)  comemoraram ao mesmo tempo o centenário de Amílcar Cabral e os 51 anos da independência. Não parece que tenham tido grande sucesso. Houve discursos, mas eu felizmente estava longe. Continuo a pensar, como cantava o Aznavourian, que o mundo nunca será um lugar decente enquanto houver militares, seja o teu filho ou o meu.

É domingo mas a igreja está fechada. Como estão fechados bares e cafés, o Gã Mela, o Pub Balafon ou o Baloba’s. No passeio há mulheres de sorrisos brancos como: vendem caranguejos, ostras, camarões. A simpatia, essa, oferecem-na. Talvez alguém lhes tenha ensinado o velho ditado romano: «Sorri para as pessoas. Não é por um sorriso que tens de tornar no melhor amigo do mundo».