Sexto de seis irmãos, William Amos Smith era um patife de pai e mãe. Nasceu em Little River, Digby, Nova Escócia, Canadá, a 15 de maio de 1871, filho de um desgraçado que se dedicava à pesca e à copofonia, com mais empenho na última do que na primeira, e que só se lembrou de registar o rebento mais novo quando este já cumprira os dez anos de idade. A mãe, Adelia Dakin, no intervalo de parir crianças e de mudar fraldas fazia serviços caseiros consta-se que sempre má catadura. Dos irmãos (Thomas, Nelson e St. Clair) e das irmãs (Elizabeth e Adelaide), apenas Thomas se preocupou com ele. Ao mudar-se para Portland, Oregon, Estados Unidos, com a mulher que arranjara entretanto, uma tal de Mary Elizabeth Beech, levou consigo o caçula, já com 19 anos, completamente fixado numa carreira de pugilista e com algumas vitórias de truz sobre gente tão conhecida na altura como eram Ed Harvey e Frank Tebeau. Não tardou muito a ser chamado para São Francisco e combater no Wigwam Theatre, no California Athletic Club e no Occidental Athletic Club, palcos destinados apenas ao melhores. Pelo caminho desenvolvera o seu estilo ardiloso do boxe bruto. Um estilo que lhe permitiu, de forma bastante suja, bater Jack Dempsey, o primeiro campeão do mundo de pesos-médios, com mais nove anos e, pelo menos, mais nove quilos do que ele. Dempsey levou para contar e não ficou nada satisfeito com isso. Além dos murros da ordem foi massacrado com cotoveladas e golpes baixos. William não entrava no ringue para combater; entrava para ganhar fosse de que maneira fosse. Não admira que das suas 22 derrotas durante a carreira profissional, doze tenham sido por desqualificação. Nem todos os juízes estavam para o aturar.
No dia 15 de dezembro, quando venceu Danny Needham, começou a afirmar aos jornalistas que era natural de Boston, mais uma daquelas lampanas que faziam parte do seu reportório. Alguns deles, mais criteriosos, duvidaram da proveniência daquele animal selvagem que não tinha nem sequer pejo de morder os adversários, se se visse à rasca. Quando se tornou campeão do mundo de meios-médios, foi escrutinado até ao dia da sua conceção. Para os repórteres da Costa Leste, que pouco ou nada sabiam dele, era um mistério não encontrarem nenhuma nota biográfica por entre os pugilistas inscritos na sua área de trabalho. Chamaram-lhe um mistério. Ficou. E William gostou bastante: Mysterious Billy Smith passou a ser o seu nome de cartaz. Acartava uma boa dose de publicidade. Mas não o impediu de perder o título ao ser derrotado por Tommy Ryan no Twin City Athletic Club in Minneapolis. Derrota por apenas dois pontos, mas mais dolorosa do que os cortes que sofreu nas superciliares. A sua fama tinha, no entanto, chegado a diversos cantos do universo juntamente com as histórias de combates no qual se tornava feio, porco e muito mau. Convidaram-no para uma digressão a Londres. Billy Smith tinha apenas 24 anos mas um currículo impressionante, embora este pudesse por vezes confundir-se com um cadastro. Desafiado para fazer três combates num só dia, a sua farronca impediu-o de recusar essa proposta muito pouco desportiva. Vendo bem, estava-se positivamente marimbando para o desporto. Desde que daí viessem uns bons punhados de dólares, estava pronto para tudo. Os britânicos Trooper Ham, Jack Bryan e Arthur Morris serviram de ‘guinea-pigs’. Tirando Morris, foram espancados sem piedade e retirados do ringue com as fuças em papa e os narizes a precisarem de reparação urgente. Regressou aos Estados Unidos para ser mais duas vezes campeão do mundo. Só que, entretanto, deixou-se envolver num daqueles combates que não tinham hipótese de vencer: o dos casamentos. O homem a quem a imprensa chamava de ‘The Dirtiest Fighter Who Ever Lived’ viu a primeira mulher, Minnie Valentine Merchant, morrer ao fim de um ano de conjúgio. Os resultados da autópsia foram por demais preocupantes. Minnie tinha sido envenenada, muito provavelmente através de algo que comeu. Seria Smith suficientemente bruto para matar um jovem com a qual se unira pouco mais de um ano antes? A sombra pairou sobre ele e tornou-o ainda mais inquieto e ainda mais canalha no momento de desancar opositores. Recompôs-se e casou outra vez, agora com uma moçoila de Queens, Nova Iorque, assim para o finório: Mary Maime Cavanagh. Não aturou durante muito tempo o feitio azedo de William e pediu o divórcio. Smith pouco se ralou. Logo no dia seguinte a ter assinado a papelada, casou-se pela terceira vez, desta feita com Josephine Hoffstatter-Barde. Combatia em casa como se fosse num ringue: sem escrúpulos. Foi morrer junto do irmão mais velho, em Portland. Onde tinha um bar chamado The Champion’s Rest. Quem o viu achou-o cansado.
O Misterioso Billy Smith – feio, porco e muito mau
William aparecia nos jornais ligado ao título de The Dirtiest Fighter Who Ever Lived.