Não foi ao sétimo, foi ao oitavo dia que acabou o recreio dos Deputados Europeus. As Audições dos 26 candidatos a Comissários Europeus terminaram a 12 de Novembro e nesta quarta-feira, dia 20, o Parlamento Europeu aceitou a seleção de todos eles. O Plenário poderá votar a 27 de Novembro, em Estrasburgo, a aprovação do conjunto do Colégio da Comissão Europeia para os próximos cinco anos.
Tal como escrevemos no Nascer do SOL há umas semanas, todos os Comissários sobreviveram às Audições. Os Eurodeputados fizeram imenso ruído, gritaram, ameaçaram que ‘grelhavam’ (na linguagem bruxelense) e chumbavam uns quantos candidatos, mas no fim, mansinhos, engoliram todos os nomes que vinham vilipendiando! Já o sábio provérbio árabe diz que ‘os cães ladram e a caravana passa’. Claro que essas ameaças ainda vão continuar até ao voto da próxima quarta-feira, porventura até mais amplificadas, mas o suspense já não é nenhum!
Ainda recentemente vimos este mesmo filme, com os mesmos protagonistas e no mesmo cenário, quando da votação para Ursula von der Leyen ser reconduzida para um segundo mandato à frente da Comissão Europeia. Que o conjunto de coligações negativas tornavam a sua eleição impossível! Iria ser recusada por uns que a consideravam demasiado pró-verde e por outros que votavam do mesmo modo por não ser suficientemente ambientalista! E este exemplo aplicava-se às várias políticas setoriais, pelo que o fracasso estava anunciado. Tudo isto ‘explicado’ por uma Comunicação Social que devia estar a ensaiar para demonstrar porque é que Kamala Harris ia derrotar Donald Trump! Mas a Senhora foi eleita confortavelmente, tal como Trump venceu folgadamente em todos os Swing States, mas hoje é dia de falarmos da Europa.
Que reflexão nos suscita todo este triste espetáculo? É óbvio que o processo está mal concebido desde o seu início: o Presidente eleito, sabendo que tem 25 pelouros para distribuir (já que um é o Alto Representante para a Política Externa), devia definir previamente as atribuições de cada um dos futuros Comissários, e nas conversas com os Chefes de Estado e de Governo ficar desde logo apontadas duas ou três pastas que melhor se encaixavam no perfil de cada candidato. Não: recebe uma lista de 25 nomes, depois faz a lista das pastas e finalmente vai encaixando os nomes… Imagine que lhe entregam 11 jogadores para fazer a sua equipa, mas são todos guarda-redes! E aqui a responsabilidade é exclusiva de Ursula!
E o natural era cada Estado Membro ter indigitado como seu candidato a Comissário alguém de reconhecida competência, com inquestionável aptidão e experiência para determinadas áreas, que fosse simultaneamente uma mais-valia para o Colégio, alguém que dignificasse aos olhos das opiniões públicas nacionais e internacionais o país de origem, e contribuísse para o prestígio do Órgão Executivo de todos nós que é a Comissão Europeia.
Conhecidos os nomes, ainda antes das Audições, era já tristemente patente que número considerável dos governos nacionais não tinha tido essa exigência relativamente ao seu Comissário, que a média dos perfis apresentados ficava bem aquém de Colégios recentes! E se havia essa perceção, as Audições vieram infelizmente provar como eram fundados os receios de que alguns candidatos não mereciam que se lhes confie a enorme responsabilidade que lhes vai ser conferida. Mas para isso servem as Audições e os Deputados, ainda estávamos mais que a tempo de melhorar substancialmente o Executivo Comunitário.
Em contraponto a este desalento geral, uma merecida palavra de satisfação pela seleção feita por Luís Montenegro, pela relevância da pasta que foi conferida à candidata portuguesa, e pela prestação de grande sucesso de Maria Luís Albuquerque na sua Audição. Como o Nascer do SOL atempadamente noticiou, em 57 Eurodeputados que tinham que se pronunciar, 6 deles votaram contra a sua indigitação apenas por cegueira ideológica.
Ora apesar de ter ficado patente que alguns candidatos mereciam ter sido liminarmente ‘chumbados’ (como aliás aconteceu sempre nas Comissões anteriores desde que se iniciou este escrutínio das Audições), a preocupação da maioria dos Grupos Políticos assentou em dois pilares: uma avaliação premeditada definida por preconceitos ideológicos, sem qualquer relação com o mérito demonstrado por cada candidato; uma defesa acérrima da sua cor clubista, numa de que ‘se chumbas um meu, eu chumbo um teu!’ Assim, todos sabemos que alguns são manifestamente ‘mauzinhos’, mas para não fazer mais ondas ‘passam’ todos! Ficam todos felizes! Menos a Europa! Menos o legado que deixamos!
Alta política!!!
Politólogo