O mito do Velho Homem reacendeu-se como uma lâmpada

Bronko Nagurski ultrapassou as barreiras da banalidade humana com a força de uma lenda.

É provável que nenhum de vós tenha ouvido alguma vez falar de Bronko Nagurski. Bronko era o diminutivo de Bronislau e não batia certo com a personagem. De maneira nenhuma um bronco. Bem, adiante. Também é conhecido por ter sido jogador de futebol americano e praticante de luta livre mas isso é redutor para ele. Na verdade foi um fenómeno. Um daqueles fenómenos como o Cometa Halley ou a Nossa Senhora decidir empoleirar-se num espinheiro para espanto de pequenos pastores lorpas. Tinha a volumetria de, digamos, um pequeno iaque. Perto do metro e noventa; mais de cem quilos. Quando pegava naquele melão a que mal se pode chamar de bola (afinal os dicionários não exprimem que o termo bola corresponda a um objeto esférico) e desatava a correr de encontro aos adversários, o melhor era sair da frente como se viesse ali um comboio descontrolado. Os conhecedores deste desporto catalogariam-no como «fullback». Foi profissional pelos Chicago Bears a partir de 1930. E da luta três anos mais tarde. Foi campeão do mundo de pesos-pesados em 1937, batendo num desgraçado chamado Dean Henry Detton, também ele profissional duplo de futebol americano e luta livre e que acabou por se enforcar aos 49 anos, no seu bar, The Turf Club, em Hayword, na Califórnia.
1937: era aqui que eu queria chegar. Já um bocado escalavrado, com os ombros a precisarem de descanso e os músculos ainda mais, Bronko acabou com a dicotomia e abandonou as jardas dos relvados. Tinha vinte e nove anos, assim por extenso, e ganhou tudo o que era possível ganhar. Os companheiros mais novos já o tratavam carinhosamente por ‘The Old Man’. A imprensa foi buscar as sua raízes polacas para lhe encaixar o epíteto de Polish Canon Bolt. Lá está: tudo demasiado pequeno para a dimensão da sua personalidade.
Resumo-me a um episódio que o elevou ao estatuto de lenda. OHomem para lá do Homem. Falei no ano de 1937 e insisto. Nagurski estava farto de futebol. Com a camisola do Chicago Bears, que usava desde 1930, acabara de destroçar o grande rival dos Bears dessa altura, os Portsmouth Spartans. Estava tanto frio em Chicago que o jogo teve de ser disputado num recinto fechado. The Old Man marimbou-se para isso. Correu como um louco, derrubou ‘linebackers’ como se fossem barricas vazios, e terminou a faena com um ‘touchdown’ muito contestado pelos adversários mas que o árbitro considerou válido. Em seguida, no balneário, enchendo o peito que era largo e parecia a quilha de um petroleiro, desabafou: «It’s done!». E abandonou o desporto profissional, embora ainda tenha realizado alguns combates de luta durante mais dois anos.
Um choque duro para os adeptos dos Bears que tinham Bronko Nagurski como o grande líder da sua equipa, o monstro que usava um capacete tamanho oito e era de assustar ornitorrincos.
Vamos até 1943. Os Chicago Bears estavam com a corda pelo pescoço: a grande maioria dos seus jogadores tinha sido alistada para combater na Europa e no Pacífico em nome dos Aliados na II Grande Guerra. Suplicaram a Nagurski que voltasse da sua reforma. E o mito reacendeu-se como uma lâmpada. Os Chicago Cardinals elevavam-se na sua frente no caminho para a final. E Bronko, já com 35 anos e pai de seis, estava pronto. E de que maneira. Arqueou os braços, agarrou na bola e foi correndo, correndo, correndo. Nem aqueles que tinham menos vinte anos do que ele resistiram à sua passada larga. Aqueles que conseguiam agarrá-lo eram arrastados às suas costas que nem pulgas num cão enraivecido. O ‘touchdown’ que marcou e garantiu a vitória dos bears por 35-24 jamais foi esquecido por aqueles que estiveram no estádio de Wrigley Field. Por todo o lado se falava dele. E de Bronko Nagurski regressado em forma de um Messias. Mas ainda havia uma final para jogar e só os vencedores merecem lugar eterno na História. Wrigley Field, o mais pequeno de todos os estádios da NFL (National Football League), recebeu quase 35 mil pessoas. Bronko liderou os seus companheiros até à vitória por 35-24. Um brado ensurdecedor sublinhou o seu ‘touchdown’ após uma corrida de três jardas. Em seguida, Nagurski regressou à sua quinta. Foi plantar batatas.