As bolas de Natal de Eunice. Colecionar memórias de viagens e histórias de vida

A tradição de decorar árvores de Natal tem raízes na Alemanha do século XVI, quando as pessoas enfeitavam pinheiros com frutas, nozes e doces. No século XIX, em Lauscha, uma pequena vila da Alemanha conhecida pela fabricação de vidro, os artesãos começaram a criar bolas de vidro soprado para decorar árvores.

Eunice Torres, uma apaixonada por coleções e entusiasta do Natal, guarda em cada bola de Natal uma memória das suas viagens pelo mundo. Para ela, essas pequenas peças decorativas não são apenas objetos. Cada bola carrega a história de um lugar, uma experiência vivida e o significado daquele momento. «Tudo para mim está relacionado com algo, com onde eu estive, ou com quem estive, ou o que aconteceu. Não é só comprar por comprar. Tudo tem que passar pelas minhas mãos», explica Eunice, destacando o valor sentimental de cada item da sua coleção. Essa ligação emocional impede que delegue a compra das bolas a outras pessoas. «Eu podia pedir a uma amiga para trazer de algum país, mas isso não significa nada. Não tem uma história envolvida», sublinha.
Começou a sua coleção de bolas de Natal de forma inesperada. Durante uma viagem a Barcelona, Eunice viu uma bola que chamou a sua atenção, mas não a comprou na hora. O arrependimento veio mais tarde, quando percebeu que aquele objeto poderia marcar o significado da viagem. «Desde então, em cada lugar que vou, procuro uma bola de Natal. Mas às vezes não há. Não é uma coisa que eu planeio com antecedência, tem que ter um significado», volta a frisar. Essa busca transformou-se num hábito prazeroso, mesmo quando as viagens não rendem novas aquisições. «Tenho pena de não ter uma bola do Japão, que foi o país mais impressionante que conheci. Passei dias à procura, mas não encontrei nenhuma», diz. Ainda assim, Eunice não desanima. Em breve, embarcará para mercados de Natal na Europa, com paradas em Colmar e Estrasburgo, em França, onde espera encontrar novas adições para a sua coleção.

Como surgiram as bolas de Natal?

A tradição de decorar árvores de Natal tem raízes na Alemanha do século XVI, quando as pessoas enfeitavam pinheiros com frutas, nozes e doces. Esses elementos representavam oferendas e abundância, numa celebração ligada ao inverno e à colheita. Um dos primeiros enfeites populares eram as maçãs vermelhas, que simbolizavam o pecado original e o fruto proibido no Éden, especialmente em celebrações cristãs. Eram penduradas para contar a história da criação e redimir a humanidade através do nascimento de Jesus.
No século XIX, em Lauscha, uma pequena vila da Alemanha conhecida pela fabricação de vidro, os artesãos começaram a criar bolas de vidro soprado para decorar árvores. Conta-se que a ideia surgiu porque, em anos de escassez, as pessoas não conseguiam frutas frescas para decorar as árvores e procuravam alternativas artificiais. Essas bolas de vidro eram pintadas à mão e muitas vezes prateadas por dentro com mercúrio ou estanho, o que lhes dava brilho.
As bolas de Natal de Lauscha tornaram-se extremamente populares e começaram a ser exportadas para outros países da Europa e para os Estados Unidos, especialmente no final do século XIX. Um impulso significativo veio quando o príncipe Alberto, consorte da Rainha Vitória do Reino Unido (de origem alemã), popularizou a tradição da árvore de Natal na corte inglesa. Essa influência rapidamente se espalhou pelas colónias britânicas e pelo mundo ocidental. Com o tempo, as bolas de vidro foram substituídas por versões mais baratas feitas de plástico ou outros materiais, tornando-as acessíveis a todos.

Coleções que contam histórias

Além das bolas de Natal, Eunice já teve diversas outras coleções ao longo da vida, desde selos na infância até conchas de praia, que guarda em pequenas caixinhas com o nome do local onde foram encontradas. «Sempre fiz coleções. Cada fase da minha vida está acompanhada por uma delas», conta. Recentemente, ela e o marido iniciaram uma nova empreitada: registar, em fotos, faróis de Portugal. «Gosto de colecionar momentos. Gosto de visitar cada farol, de tirar uma foto e de sentir o ambiente. Para mim, a coleção tem que ter significado. Não me interessa comprar algo pronto ou colecionar sem vivenciar aquilo», explicita.
Eunice já visitou quase todos os faróis do país e planeia completar o circuito em breve. E em Finisterra, no noroeste de Espanha, conseguiu uma bola muito especial: a mesma é alusiva ao cabo Finisterra, um promontório de granito com 3 km de comprimento e 600 metros de altura. Este cabo é amplamente reconhecido como o ponto mais ocidental do continente europeu na tradição popular, embora, geograficamente, esse título pertença ao Cabo da Roca, em Portugal, ou ao Cabo Touriñán, também na Galiza.
Apesar do amor pelo que faz, Eunice reconhece que nem sempre os colecionadores são levados a sério. «Em Portugal, acho que os colecionadores são vistos com algum desdém. As pessoas acham engraçado, mas não valorizam. Olham para quem coleciona conchas ou bolas de Natal como se fosse algo estranho», lamenta. Contudo, não se deixa abalar. «É algo que me traz alegria e me conecta com momentos e lugares especiais. Para mim, isso é o que importa», declara. Ao refletir sobre as suas coleções, Eunice deixa clara a razão por trás da sua paixão. «O que conta é o registo, a história. Não é sobre ter um objeto bonito, mas sobre o que ele representa na minha vida», finaliza.