Moedas. A paixão que Margarida partilha com o avô Manuel

Na Grécia e Roma antigas, já havia interesse em colecionar moedas, mas não como disciplina formal. Governantes e intelectuais reconheciam o valor das moedas como testemunhos de eventos históricos. Tantos séculos depois, Margarida e Manuel Caçador, neta e avô, abraçam a numismática como a grande paixão que fortalece a sua ligação especial

A numismática tem raízes antigas e começou como uma forma de registar e estudar os primeiros sistemas de troca e comércio. O seu desenvolvimento está intimamente ligado à História da moeda e à evolução das civilizações. As primeiras moedas conhecidas foram cunhadas na Lídia, uma região da atual Turquia, por volta do século VII a.C. Eram feitas de eletro (uma liga natural de ouro e prata) e apresentavam símbolos ou marcas que representavam as cidades ou os governantes locais. À medida que as moedas se tornaram mais difundidas, passaram a ser usadas como um meio prático de troca e também como ferramenta de propaganda política e cultural.
Margarida e Manuel Caçador, neta e avô, são apaixonados pela numismática. «O meu avô ofereceu ao meu pai e à minha tia um álbum com moedas de escudo. Eu ficava em casa dele e da minha avó e cansava-me de todas as brincadeiras rapidamente. Havia sempre aquele bichinho de ver aquilo que eles faziam. E ele costumava tirar os potes do armário da sala e tínhamos um ritual: tirávamos as moedas e ele pegava numas folhas com as caras das mesmas e cada fila correspondia a um país, desde as moedas de 1 cêntimo até às de 2 euros. E o meu trabalho era colocar as moedas por cima dessas imagens para percebermos aquelas que tínhamos», refere Margarida Caçador, que indica que, na sala, «havia uma moeda que ia para uma tigela com vinagre e ninguém tocava nela. Ela estava negra, muito gasta, a oxidar».
Durante a Grécia e Roma antigas, já havia interesse em colecionar moedas, mas não como disciplina formal. Governantes e intelectuais reconheciam o valor das moedas como testemunhos de eventos históricos. No Império Romano, moedas eram frequentemente usadas para marcar conquistas militares e celebrar imperadores.
A numismática como campo de estudo organizado só começaria no Renascimento (séculos XV e XVI), quando o interesse pelas culturas clássicas greco-romanas cresceu significativamente na Europa. Colecionadores ricos, como nobres e académicos, começaram a reunir moedas antigas pela sua importância histórica e estética. Os humanistas italianos, como Petrarca, são frequentemente creditados como os pioneiros da numismática. Tratavam as moedas como fontes de conhecimento sobre a História antiga.
Tudo isto fascinou Margarida desde o início. «Não queria saber o motivo para manter o mistério, mas perguntei ao meu avô e ele confirmou as minhas suspeitas: disse-me que o vinagre era para as tentarmos pôr mais claras!», menciona a jovem que recua até ao tempo em que, quando o avô guardava os trocos depois de fazer compras, virava as moedas para ver as faces de cada uma. «Podia ser um hobby que se tinha perdido porque fui viver para outra cidade muito pequenina, mas continuámos. Para além de as perfilar, a minha parte favorita era calcularmos o valor com a calculadora para depois sabermos se conseguíamos fazer várias coleções», diz, explicando que o objetivo primordial é que exista uma coleção de moedas para cada neto.
«Acho que comecei com quatro anos, se não me engano. Vivo a cinco minutos dele agora e, sempre que tem um troco, guarda as moedas dentro de uma chávena, liga-me a dizer que viu algo diferente, estranho, que conseguiu completar a fila de 2 cêntimos da Grécia – o nosso calcanhar de Aquiles – e fazemos isto de forma arcaica», afirma.
«Para mim, o mais especial foi encontrar a moeda que celebra o Tratado de Roma: é um livro aberto com uma espécie de várias estrelas atrás e recordo-me que ia gastar essa moeda num lanche em Viseu e, quando olhei para ela, percebi e não a dei. No momento a seguir, enviei uma SMS ao meu avô», lembra, admitindo que começou a fazer uma coleção à parte daquelas que tem feito com o avô Manuel. «A coleção do meu avô é só moedas de cêntimo e euro, a minha é mais de moedas comemorativas. Antigamente, fazíamos a contagem das moedas de dois em dois meses».
«Mesmo que já tenha uma moeda de determinado monumento, compro-a outra vez porque trazem o ano na coroa», declara, exemplificando que o Castelo de S. Jorge tem uma das moedas com a ilustração de D. Afonso Henriques, outra com a figura do castelo e o Mosteiro da Batalha tem uma com a porta principal e outra com as laterais do mesmo. Com o avanço das ciências sociais, a numismática ganhou rigor académico. Foi integrada nos estudos históricos, económicos e arqueológicos. Sociedades numismáticas foram fundadas, como a Royal Numismatic Society (1836) no Reino Unido e a American Numismatic Society (1858) nos EUA. Hoje, a numismática é tanto um campo académico quanto um hobby. Combina tecnologias modernas (como análise de metais e scanners 3D) para estudar moedas antigas e novas. Além do interesse histórico, o colecionismo impulsiona a numismática, com leilões e exposições de moedas raras em redor do mundo, como explica Margarida.
«Há moedas de dois euros que têm a ver com os Descobrimentos e umas do Vaticano. Estas últimas são particularmente lindas e não se encontram em lado nenhum. Acho que um dia, se for lá, não quero ver o Papa. Vou pedir os trocos a toda a gente!», finaliza a apaixonada por numismática. «Há moedas que chegam a valer milhares de euros. Nós encaramos isto como um hobby e criamos mais memórias, mas quem leva o colecionismo mesmo a sério gasta muito dinheiro».