Roménia: há eleições presidenciais e uma semana depois o Tribunal Constitucional manda fazer uma recontagem total dos votos. Mantém-se o surpreendente resultado e o Constitucional, por unanimidade, valida os resultados. Menos de cem horas depois, o mesmo Douto Tribunal, a dois dias da segunda volta, anula a primeira, também por unanimidade. Gente coerente!
O que se passou? Nas vésperas da primeira volta era óbvia a necessidade de uma segunda, o candidato que partira destacado Mircea Geoana, ex-ministro dos Negócios Estrangeiros e até há pouco Secretário-geral-adjunto da NATO, estava em queda livre (acabou em sexto), e esperava-se que à segunda volta passassem o primeiro-ministro e líder do Partido Socialista, Marcel Ciolacu, e a representante Liberal, Elena Lasconi, do Partido USR, a União para Salvar a Roménia, ou o candidato do PPE, Nicolae Ciuca. A seguir um desconhecido Professor, Calin Georgescu, independente apelidado de pró-russo e conotado com a extrema-direita que se afirmava à frente do candidato do Partido AUR, Aliança para a União dos Romenos, George Simion, também da extrema-direita. Surpreendentemente, o dito candidato anti-Kiev destaca-se com 22,94%, em segundo fica a liberal com 19,17%, e em terceiro o primeiro-ministro, com 19,14%. Ou seja uns meros 0,03%, 2.740 votos de diferença! Mas que definiam quem passava à segunda volta. É a estupefação e o pânico! PPE e socialistas fora da segunda volta!
Com uma diferença tão reduzida, até se pode compreender que o Tribunal tenha querido dissipar todas as dúvidas: mas também é legítimo questionar se teriam feito o mesmo se a ordem fosse a inversa!
Continuemos. Dois dias depois da validação dos resultados, que mantiveram o anunciado na noite eleitoral, o Presidente da República em funções, Klaus Iohannis, do PPE e a terminar o segundo mandato, divulga uns relatórios dos Serviços de Informações denunciando que uma campanha fomentada pelo Tik Tok sugeria que teria havido uma massiva (e cara) campanha de desinformação a favor do candidato que ficou em primeiro, que tudo indica terá tido fomentada (e subsidiada) por uma potência estrangeira, mas que esses Serviços não conseguem identificar. É com base nesses relatórios que o Tribunal Constitucional anula todo o processo eleitoral, e ordena que se volte a começar de raiz!
Mas alguém pode acreditar que em duas semanas uma plataforma de um qualquer Tik Tok ou Telegram pode influenciar decisivamente um resultado eleitoral em que votaram quase 10 milhões de eleitores?
É óbvio que é inaceitável que qualquer potência estrangeira queira influenciar um só voto que seja! Mas em que mundo vivemos que aceita como plausível que uma conta Tik Tok ativada a 11 de novembro decidiu uma eleição a 24 de novembro, em apenas 13 dias, num país de quase 20 milhões de cidadãos?
E mesmo que tenha ocorrido tal ingerência, a decisão do Tribunal teria sido a mesma se, mesmo com a tal ingerência, outros candidatos tivessem passado à segunda volta? Fica outra dúvida, para mais também ela legítima!
Não temos qualquer particular simpatia pelos dois candidatos (nem pelas suas ideias) que, nas urnas, passaram à segunda volta. Nem tão-pouco contestamos que o comportamento do Tik Tok tenha cumprido, escrupulosamente, as regras e os deveres a que está sujeito. Tudo parece indicar que não! E, a ser verdade, que o Tik Tok seja severamente punido! Mas começa a ser hábito uma ingerência gradualmente maior e absolutamente inaceitável do poder judicial na vida política. Uma determinada Classe de Juízes parece querer arvorar-se como detentora da verdade universal e ‘corrigir’ o que consideram ‘devaneios’ do eleitorado! Veja-se Babis na Chéquia, Salvini em Itália, Kickl na Áustria, Le Pen em França! Infelizmente este é um tema que teremos que abordar, com maior profundidade, muito brevemente.
Neste caso, só falta que os candidatos que não agradaram aos Doutos Juizes sejam agora impedidos de concorrer às futuras eleições!!! Não vão os eleitores ‘enganarem-se’ novamente…
Com todo o respeito pelas ‘Repúblicas das Bananas’, esta poderia ser uma história que nos faria sorrir de forma trocista e encolher os ombros! Mas não! Esta vergonha ocorreu na Europa, mais ainda, num Estado-Membro da União Europeia, naquele espaço em que nos consideramos moralmente superiores e donde queremos exportar e impôr ao mundo o nosso modelo de Sociedade!
Mas descansemos: a UE tem Estatutos, Instituições e Mecanismos que garantem o Estado de Direito e o exercício da Democracia. Que vão fazer o Parlamento Europeu e/ou a Comissão Europeia? Seguramente que o Parlamento votará uma Resolução no plenário da próxima semana condenando, nos termos violentos a que nos habituaram, este atropelo e desrespeito pelo voto livre dos cidadãos romenos. E a Comissão, guardiã dos Tratados e do Estado de Direito, não deixará de repudiar esta ingerência da Justiça na vida política e de iniciar, sem demora, o procedimento previsto no Artigo 7, por violação grave do Estado de Direito.
Ou talvez não! Será que vão assobiar para o lado ou atirar-se apenas aos Tik Tok da vida? Faz hoje uma semana e temos um desesperante silêncio! Vergonhoso quando comparado, por exemplo, com as críticas às eleições na Geórgia! A descredibilização total destas Instituições, para mais num início dos seus novos mandatos, seria se desvalorizassem a gravidade deste ato ou considerassem este flagrante atropelo como um mero ‘problema interno’ da Roménia. Ou para os eurodeputados e para a Sra. von der Leyen fecham-se os olhos quando são visados Estados com PPE’s ou Socialistas na Presidência e/ou Governo?
Depois deste olhar para o lado, como ficarão esses ‘democratas’, comissários ou eurodeputados, se a repetição das eleições repetir os resultados? É que o eleitorado pode não gostar que o tratem de mentecapto! E ‘ensinar’ esses ‘iluminados’!
E não se diga que foi um Tribunal dito ‘independente’ e não um Governo a tomar esta decisão, ou estarão a dar ‘ensinamentos’ e ‘ideias’ a alguns Governos, exatamente o contrário do que certamente pretendem!!! l
Anular eleições: se a moda pega… Ou é só para os amigos?
Como é que se aceita que uma conta Tik Tok ativada a 11 de novembro decidiu uma eleição a 24 de novembro, em apenas 13 dias, num país de quase 20 milhões de cidadãos?