O tetraneto de Dom João II, Gouveia e Melo, também conhecido por ‘Almirante das Vacinas’, surge destacado nas sondagens para a escolha do novo Presidente da República. Passos Coelho ainda se aproxima um pouco, mas Marques Mendes e Mário Centeno não têm a menor hipótese de vencer o Almirante. O seu porta-aviões afunda as pirogas circundantes.
Como se explica esta vantagem avassaladora?
Além de ter demonstrado uma capacidade de organização rara na montagem de tendas para a vacinação anti-covid, o Almirante possui uma qualidade que Mendes e Centeno não têm: não abre a boca. Enquanto Marques Mendes faz comentários políticos todas as semanas, tentando agradar a toda a gente, e Mário Centeno faz comentários regulares sobre a economia, tentando derrubar o Governo, o Almirante não fala. Aos costumes, nada diz.
Depois de anos a ouvir o atual Presidente a comentar tudo o que acontecia ou deixava de acontecer, os portugueses fartaram-se de comentários. Num mundo cheio de ruído e parlapatice, um voto de silêncio monástico pode conduzir a Belém.
É verdade que ninguém faz a menor ideia do vai na cabeça do Almirante.
É de Direita ou de Esquerda? Apoia a Ucrânia ou a Rússia? Considera Trump uma besta ou um salvador? Defende que Portugal deve pagar indemnizações aos PALOP pelo colonialismo ou devem ser eles a indemnizar os retornados?
Ninguém sabe. Talvez o próprio nunca tenha pensado muito nestes assuntos. E este é o seu grande trunfo eleitoral. Os portugueses não querem saber o que um Presidente da República pensa e agradecem que não os massacrem com palpites diários sobre isto e aquilo. Os portugueses querem estar em casa sossegados. Ora com o Almirante Gouveia e Melo na Presidência sabem que o sossego está garantido. Não vão ouvir uma palavra sobre crises políticas, alterações climáticas ou o lince ibérico.
No máximo, alguma referência ao tetravô Dom João II.
Poderão os jornalistas cercá-lo e disparar perguntas do género: vai dissolver o Parlamento? Vai mandar tropas para a Ucrânia? Concorda com os quartos de banho mistos? A tudo isto e mais alguma coisa, o Almirante, com a sua postura altiva (e alta), semblante grave e voz de comando, dirá simplesmente: siga a Marinha! E virar-lhes-á as costas.
Desde que em 1971 o oficial José Joaquim Gaspar, exasperado com a falta de condições do seu quartel na Guiné, escreveu num relatório esta frase sarcástica, ou sibilina, ou seja lá o que for, que «siga a Marinha» se tornou no equivalente a «vamos para a frente», «vamos superar as dificuldades», etc. Em vez de «desta vez, vai ser tudo, tudo, tudo esclarecido», ou «os portugueses têm o direito de saber…» – frases seguidas de chatíssimas dissertações –, o Presidente Gouveia e Melo irá cortar cerce o assunto, qualquer que seja, com um firme, curto e seco «siga a Marinha!».
E a Marinha continuará a seguir por entre mares de escândalos, vergonhas e vexames já antes navegados.
Escritor