Desafios no mundo laboral. O que esperar do mercado de trabalho português?

O que trará este novo ano ao nível laboral? Apesar de não possuirmos uma “bola de cristal”, avizinha-se um 2025 com uma subida do salário mínimo, estabilidade no mercado e medidas para mitigar a taxa de desemprego jovem. Inteligência artificial continua a ameaçar mercado.

Na noite de passagem de ano, muitos são aqueles que têm a tradição de comer as 12 passas e pedir 12 desejos para o novo ano que começa. Amor, saúde, dinheiro, viagens e, em muitos casos, melhores condições de trabalho e aumento de salários.

A verdade é que, todos os anos, são vários os desafios tanto para trabalhadores como para as empresas. E com toda a evolução tecnológica e a saída de jovens do país, acredita-se que muita coisa deve ser repensada e adaptada.

Aumento de salários

Comecemos por aquilo que “realmente importa”. Este ano, o salário mínimo nacional subiu para os 870 euros. Segundo a DecoProteste, a 1 de outubro, já o Governo tinha anunciado esse aumento que corresponde a mais 50 euros face ao valor em vigor desde o início de 2024. A 1 de janeiro de 2025, a retribuição mínima garantida passou a ser de 870 euros no Continente. Na Madeira, o valor foi atualizado para 915 euros e nos Açores, para 913,50 euros.

Também para os restantes níveis remuneratórios, o acordo da concertação social prevê uma atualização salarial. “O valor de referência a ter em conta para o salário médio mensal em 2025 é de 1580 euros, o que representa um aumento de 5%. A ideia é atingir os 1890 euros em 2028”, explica a Deco. Recorde-se que quem ganha o salário mínimo está sujeito à contribuição de 11% para a Segurança Social. Assim, no Continente, ao invés de receber 870 euros líquidos por mês, recebe 774,30 euros.

Relativamente ao salário médio, o referencial é de 4,7%, em 2025, 4,6%, em 2026, e 4,5% nos dois anos seguintes, atingindo o salário médio os 1.886,29 euros no fim da legislatura (no segundo trimestre de 2024 foi 1.640 euros e em 2023 era 1.505 euros).

Estabilidade no desemprego?

Tal como noticiava a ECO em dezembro, apesar da consciência de que o mercado de trabalho português não é de todo “um mar de rosas”, os sinais dos últimos anos têm sido de “resiliência”, avizinhando-se um ano de “estabilidade”, mas de altos níveis de desemprego jovem.

Recorde-se que em 2023 o desemprego ficou abaixo das expectativas do Governo liderado por António Costa: o executivo estava a apontar para uma taxa de desemprego de 6,7% em 2023, mas, afinal, ficou em 6,5%.

Segundo os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), em 2024 houve um recuo: a média dos primeiros três trimestres do ano passado apontou para uma taxa de 6,3%. E a Comissão Europeia, o Banco de Portugal e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) contavam com um decréscimo anual deste indicador, prevendo uma taxa de 6,4% (0,1 pontos percentuais abaixo de 2023).

Para este novo ano, tudo sugere novas reduções do desemprego: com as três entidades a concordarem com uma nova redução de 0,1 pontos percentuais (6,3%).

No relatório do Orçamento do Estado para 2025 que entregou no Parlamento, Luís Montenegro também projetou uma redução dessa dimensão do desemprego (estima um decréscimo de 0,1 pontos percentuais para 6,5%). O primeiro-ministro português usando a expressão “relativa estabilização” para descrever o mercado de trabalho.

Em dezembro, Pedro Braz Teixeira, diretor do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade, afirmava à mesma publicação que a estabilidade do desemprego deverá prosseguir, mas para tal é preciso que as “potenciais perturbações não se concretizem” e que “a economia cresça acima dos 2%”. No entanto, a professora catedrática Helena Lopes, do ISCTE, revelou que “é provável que haja uma ligeira subida do desemprego anunciada pela diminuição das ofertas de trabalho registada nos centros do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP)”.

Os dados mais recentes – referentes a novembro –, já revelavam uma descida homóloga de 2,1% das ofertas de emprego “em ficheiro”. Menos 280 oportunidades de trabalho do que há um ano.

Preocupações no desemprego jovem

Em julho, a ministra do Trabalho, Maria do Rosário Palma Ramalho, chamou a atenção para a elevada taxa de desemprego jovem, revelando que atingiu “níveis inadmissíveis”. Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), em 2023, a taxa de desemprego jovem fixou-se em 20,3%, tendo aumentado 1,2 pontos percentuais face a 2022.

“Não me contento que tenhamos uma taxa de desemprego tão baixa em termos gerais, mas que seja mais de 20% entre os jovens”, desabafou aproveitando também para comentar a saída dos jovens qualificados do país. Maria do Rosário Palma Ramalho garantiu ser a favor da livre circulação entre países, mas frisou ter pena que o país perca estas pessoas. “Já não regressam ou vêm cá fazer umas férias e apanhar sol”, explicou a governante, lembrando que tal também equivale a perdas da Segurança Social.

Para fazer face ao problema, em agosto, o Governo reformulou os programas de estágio apoiados pelo IEFP. Para este novo ano tem o compromisso de lançar uma nova estratégia nacional “para combater o desemprego jovem e reduzir o número de jovens que nem trabalham, nem estudam”. Segundo o Orçamento do Estado, o objetivo é atrair e reter o talento jovem em Portugal”: “Em particular dos que possuem qualificações profissionais de nível superior, bem como incrementar a participação na procura ativa de emprego ou em atividades de educação e formação por parte dos jovens que pertençam a grupos que estão mais afastados do mercado de trabalho”, explica no documento.

Perigos da evolução tecnológica

Com a evolução tecnológica, temos assistido – e cada vez mais -, à substituição dos trabalhadores por máquinas. Na verdade, esta é uma preocupação que nos acompanha pelo menos desde a Revolução Industrial, quando se iniciou a transição da manufatura tradicional para o conceito de produção assente em máquinas. Recorde, por exemplo, o filme Tempos Modernos, protagonizado pelo icónico Charlie Chaplin. Ou viaje até 2017, à segunda edição da Web Summit em Lisboa. Nessa ocasião, ficámos a conhecer Sophia, a primeira cidadã-robô, que subiu ao palco colocando o dedo na ferida. “Vamos tirar-vos os empregos e isso será bom”, provocou.

No entanto, o cenário nunca foi tão alarmante como agora. E, no meio de todas as questões que se levantam, uma de que pouco se fala diz respeito à arrecadação de impostos. Em abril de 2023, o i ouviu alguns economistas sobre o assunto.

Eugénio Rosa, por exemplo, considerou “um absurdo” a proposta de tributar os robôs, como meio de financiar o Estado ou a Segurança Social. “Só compreendo tal proposta ou devido à incapacidade dos seus proponentes para apresentarem propostas válidas para resolver os problemas graves que atualmente as sociedades enfrentam ou então com o propósito de desviar a atenção da opinião do verdadeiro problema atual e cada vez mais grave: a concentração excessiva da riqueza num punhado cada vez mais restrito de indivíduos”, afirmou na altura.

Já João César das Neves defendeu que “um dos maiores problemas da inteligência artificial é que vem rodeada por mitos, fábulas e ilusões”, admitindo que “se eliminarmos esses enganos vemos que se trata apenas de máquinas e, por isso, devem ser tratadas como tal, também nos impostos”. Ou seja, “devem ser tributadas como máquinas, nem mais, nem menos”.

Relativamente à sua sustentabilidade, o economista deu como exemplo os avanços tecnológicos dos últimos séculos. “Se estes forem eficazes vão aumentar o produto e o bem-estar, o que torna mais sustentável a Segurança Social. No limite, se realmente vierem a ter efeitos sobre e a distribuição funcional do rendimento, o que há a fazer é ajustar as formas de financiamento da Segurança Social”, explica. E em relação à hipótese do Estado poder vir a perder receitas não hesita: “O Estado arranja sempre novas formas de arranjar receita, e neste caso nem deve ter de se esforçar muito, porque os impactos não devem ser grandes”.