Ciência

Ao contrário da ciência, a pseudociência permanece inflexível, recusando a revisão e a crítica.

A ciência moderna é um modo sistemático de entender o mundo, baseado na observação, na experimentação (quando aplicável) e no pensamento crítico. As ciências naturais estudam o mundo físico, as ciências sociais focam-se nos aspetos sociais da condição humana e as ciências formais fornecem ferramentas matemáticas e lógicas. Apesar das diferenças entre as diversas áreas, seguem todas uma abordagem rigorosa para testar ideias, corrigir erros e aprofundar o conhecimento da realidade, usando modelos teóricos, critérios, métodos e técnicas que requerem amplo consenso no seio da comunidade científica


A metodologia usada, tradicionalmente designada por método científico, começou a tomar forma no século XVII, influenciada por abordagens filosóficas como o pensamento indutivo de Francis Bacon (1561-1626), defensor da recolha sistemática de dados e da formulação de generalizações a partir da observação empírica, realizada diretamente pelos sentidos ou com o recurso a instrumentos que ampliam a perceção humana. (Por exemplo, alguém que observe vários corvos pretos e concluir que todas as aves dessa espécie são pretas faz um raciocínio indutivo.)
No entanto, a então designada filosofia natural não se limitava ao uso da indução. Ocupando-se do estudo dos fenómenos naturais, englobando áreas como a botânica, a zoologia, a mineralogia, a química, a mecânica e a astronomia incluiu domínios que gradualmente se foram dissociando do que consideramos conhecimento científico como a magia natural, a alquimia e a astrologia.


Para a nova abordagem da filosofia natural também contribuíram pensadores como o racionalista francês René Descartes (1596-1650), cujo ponto de partida foi o raciocínio dedutivo, defendendo a primazia da razão e a dúvida metódica, e o empirista italiano Galileo Galilei (1564-1642), cujas observações com o telescópio desafiaram o geocentrismo aristotélico. (Exemplo de raciocínio dedutivo: sabendo que todos os mamíferos têm coluna vertebral e encontrando um novo mamífero, podemos concluir que este também tem coluna vertebral.).


Isaac Newton (1643-1727), por seu turno, combinou a observação com a dedução lógica e a formalização matemática para enunciar, na sua obra Princípios Matemáticos de Filosofia Natural (1687), as leis do movimento e a teoria da gravitação universal.


A designação de filosofia natural perdurou até ao século XIX. Embora o termo ‘ciência’ já existisse, não se referia especificamente ao conhecimento da Natureza. Proveniente do latim scientia, significava um saber sistemático num determinado domínio, como história ou gramática, ou até mesmo habilidades práticas. Jane Austen ilustrou bem esse uso em Orgulho e Preconceito (1813), quando o Sr. Darcy afirma que «Qualquer selvagem sabe dançar». O seu interlocutor, Sir William Lucas, ao ver Binley juntar-se ao grupo de dançantes, sorri e responde: «O seu amigo move-se de forma encantadora; e não tenho a mínima dúvida de que o próprio Sr. Darcy também domina a ciência» -, querendo, com isso, dizer que achava que também ele percebia do assunto. Entre nós, Eça de Queirós usou o termo ‘ciência’ tanto no seu antigo significado como no moderno. N’Os Maias (1888), por exemplo, lê-se: «Maria [Eduarda] punha na composição dos seus jantares uma ciência delicada». Já n’A Cidade e as Serras (1901), encontramos: «[…] mergulhei na seção das Ciências Naturais, peregrinando, num assombro crescente, da Ortografia para a Paleontologia, e da Morfologia para a Cristalografia». Por sua vez, o termo ‘cientista’ só foi cunhado em 1834 pelo matemático e astrónomo William Whewell, numa recensão crítica à obra On the Connexion of the Physical Sciences, da divulgadora científica britânica Mary Somerville.


A metodologia e o rigor que caracterizam as ciências, e a reprodutibilidade no caso das experimentais (note-se que revistas científicas como a Nature têm retratado artigos inteiros por falta de reprodutibilidade), estão ausentes em áreas que, apesar de se apresentarem como científicas, são pseudociências – como a astrologia e a homeopatia. Ao contrário da ciência, que dispõe de rigorosos mecanismos de escrutínio e controlo, é dinâmica e autocrítica e evolui à medida que o entendimento da realidade se aprofunda, a pseudociência, frequentemente disfarçada de ciência através de vocabulário técnico e afirmações que aparentam respaldo científico, permanece inflexível, recusando a revisão e a crítica.


Atualmente, a administração de Donald Trump está a aplicar cortes drásticos no financiamento da ciência, afetando várias agências e instituições nos EUA. Na Universidade Johns Hopkins, por exemplo, onde 40% das receitas provêm de fundos federais, já se registaram milhares de despedimentos. Os alertas para danos iminentes em áreas cruciais, como a investigação biomédica, multiplicam-se. A posição de liderança científica do país, um dos pilares do seu sucesso económico, está ameaçada, podendo ocorrer uma fuga de cérebros para a Europa, invertendo o que se verificou durante a II Guerra Mundial. O mesmo Donald Trump que, aos seus negócios imobiliários, em casinos, concursos de beleza e reality TV shows, fundou, com fins lucrativos, uma infame e fracassada ‘universidade’ com o seu nome.

Químico