A visão do inferno!

La Féria conseguiu reunir em duas horas uma síntese do sofrimento humano, do sofrimento dos pastorinhos, o sofrimento de um povo – o povo português

Na semana passada fui ver o musical, de Filipe La Féria: Fátima. Conta a história das aparições da Virgem Maria aos três pastorinhos. Trata-se de uma visão de um artista a partir dos fatos históricos e da própria mensagem de Fátima. 

Só tenho uma palavra: «Incrível!». Não se trata de mais uma representação de algo que está no passado, um fato histórico, mas que teve repercussões, não apenas, nacionais, mas, também, internacionais. Quem conhece o poder profético da mensagem de Fátima sabe como num ponto da história do século XX, 1917, se iluminou toda a história que está para trás e aquela que chegou aos nossos dias.

O que mais me impressionou? O inferno!

No que sabemos serem as visões, a Virgem Maria concedeu que os pastorinhos pudessem contemplar a visão do sofrimento do fogo do inferno. La Féria decidiu materializar esse sofrimento do inferno com imagens reais da história. 

Vi os soldados das trincheiras, da Primeira Grande Guerra, e Hitler e a Segunda Guerra Mundial; as ditaduras e guerras que assolaram a humanidade neste século… até à colisão dos aviões nas Torres Gémeas em Nova York. 

Primeiro questionei-me: ‘Isto é um erro histórico!’. E depois lembrei-me como a mensagem de Fátima transporta em si uma visão realista e simbólica da própria história. Há uma luz e uma esperança que aparece em Fátima: haverá sofrimento e dor, haverá guerras e mortos, mas por fim o coração imaculado de Maria triunfará.

O Papa Francisco, em Fátima, no aniversário das aparições (agora alguns dizem visões) disse-nos: «Temos mãe». É verdade… Temos mãe e temos esperança… por o Coração Imaculado de Maria significar o amor incondicional de uma mãe. 

La Féria conseguiu reunir em duas horas uma síntese do sofrimento humano, do sofrimento dos pastorinhos, o sofrimento de um povo – o povo português –, mas também o poder de Deus acima do poder do mal. 

Acredito, há muitos anos, que os sermões e as pregações têm a sua atualidade na sua tradicional oralidade, mas as artes, agora, como no passado, têm um poder de envolver os homens nas palavras. As artes são o melhor discurso que podem expressar uma mensagem tão envolvente. Porque a beleza das palavras recebe das artes o suporte mais sublime da alma humana.

Creio, realmente, que nos falta um poder simbólico que dê um sentido ao realismo materialmente exacerbado do mundo contemporâneo. Hoje olhamos para o que está fora e não conseguimos adentrar no que está dentro. Porque, como diria Saint Exupery, o essencial é invisível aos olhos… São Tomás de Aquino, ainda: o que escapa aos sentidos, só a fé o pode ver. 

Os primeiros peregrinos de Fátima iniciaram um movimento ao longo do último século. Olho as fotografias da última aparição e vejo os pés descalços de tantos homens e mulheres… vejo o drama da guerra nos militares caídos daquele tempo… hoje, sentados no Politeama, conseguimos entrar na multidão daqueles que assistiram, em 1917, aos fenómenos sobrenaturais. La Féria não nos dá apenas a história dos três pastorinhos, mas leva-nos a fazer a experiência dos que assistiram a todos aqueles fenómenos… melhor, mesmo, é só ver!