1. A noite eleitoral trouxe a Portugal a novidade de um partido de extrema-direita poder ser o segundo maior grupo parlamentar. Uma direita radical para quem o problema está na democracia ou, melhor, a democracia é o problema que trouxe direitos e liberdades a mais. O fenómeno deve preocupar todos os democratas, em Portugal e na Europa. São partidos antissistema que sonham com uma sociedade sem liberdade, e aos mandos de um ditador. Alimentam-se do medo, da mentira, do ressentimento e do discurso do ódio. O que se vive não é apenas, e já não seria pouco, o recuo das conquistas baseadas nos ideais progressistas, de um Estado Social forte e de direitos sociais que demoraram a conquistar. O que está em causa, do meu ponto de vista, é o recuo da defesa da democracia.
O que vivemos é mais profundo do que a espuma dos dias de uma noite eleitoral. De quem ganhou ou perdeu as eleições, mas sim a mudança de sistema político partidário, com instituições democráticas, que encontra no debate político plural a sua riqueza, que combate as desigualdades, que afirma uma sociedade decente e respeitadora dos Direitos Humanos. A revolução silenciosa, agora expressa em mais de um milhão de votos, está aí. Na força das redes sociais e no poder da desinformação, no alimento da mentira, na procura de respostas fáceis a problemas complexos que exigem tempo e ponderação, na exploração do medo e na divisão do mundo entre nós e os outros. O mundo está em mudança rápida, cá é na Europa, acelerada pela eleição de Trump. Num certo sentido, chegou a Portugal o fenómeno mundial que cresce em muitos países.
Os primeiros sinais de mudança estão no sentimento de impunidade, no desrespeito pela convivência democrática que se tornou normal. A gritaria ocupou o espaço do debate feito com urbanidade e respeito pela diferença de opinião. A violência verbal e o ataque pessoal tomaram conta do debate político.
Procuro encontrar resposta para a expressão da votação, os democratas têm que entender o eleitorado. Não são todos fascistas, nem racistas, nem xenófobos. É preciso entender e procurar responder aos problemas e, ao mesmo tempo, restaurar a relação de confiança dos cidadãos que estão desiludidos com os políticos e com as instituições democráticas.
Sou neta de preso político, testemunha de muitos que fizeram oposição à ditadura e lutaram pela Liberdade e Democracia. Honrar os que deram a vida para que estes cinquenta e um anos fossem possíveis, com níveis de desenvolvimento inquestionáveis, é continuar a lutar por um país socialmente justo e solidário.
2. Para o PS, a noite eleitoral foi de um mau resultado. O PS é um partido estruturante da nossa democracia e um grande partido. Não se olhe para estes tempos com fatalismo, mas com energia: energia para uma reorganização interna, energia para abrir o partido e convocar os sectores mais dinâmicos da economia, as universidades, os movimentos sociais, os mais jovens e os mais velhos, a cultura e a criatividade. Todos seremos necessários para continuar a ter uma agenda progressista e solidária, capaz de responder aos novos desafios e às pessoas. Escutar! Escutar a sociedade e construir soluções para os problemas que ainda subsistem num mundo de incerteza. Entender os resultados eleitorais e contribuir para a estabilidade política de que o país precisa, sem nunca abdicar da nossa agenda política, sendo ativos na construção de soluções.
Caberá ao PS a luta, de que nunca se desviou, pela Democracia.
Eurodeputada e Vice-Presidente do Grupo S&D