A maternidade não se mede em mililitros

Definir que uma criança só tem direito a estar mais tempo com a mãe se estiver a ser amamentada é reduzir a maternidade a uma função biológica, desvalorizar a mãe e ignorar a importância da relação primordial.

Nas últimas semanas tem-se discutido a necessidade de apresentação de um atestado no início da licença de amamentação e de seis em seis meses até um período máximo de dois anos.

Esta questão, mais do que nos fazer refletir sobre a necessidade de um médico ter de atestar aquilo que a trabalhadora poderia informar, conduz-nos a um ponto crucial.

Por que complexificamos e diminuímos o período de uma licença de amamentação quando deveríamos estar a discutir a possibilidade de facilitar e promover a relação próxima, plena e tranquila entre a mãe e o bebé durante os primeiros três anos, independentemente da forma como é alimentado?

A díade materna é fundamental para o desenvolvimento emocional, neurológico e social do bebé. É ao longo dos primeiros anos que se constrói a vinculação afetiva – esse laço profundo que se tece na relação com uma figura estável e emocionalmente disponível, idealmente a mãe. É sobretudo esta relação de proximidade psicológica, emocional e física, inicialmente simbiótica, de troca de afeto, de resposta às necessidades do bebé, de presença e apoio nas suas várias fases, que será o alicerce de um desenvolvimento emocional saudável e da estruturação do psiquismo.

Quanto mais constante, previsível e disponível for a presença da mãe, mais sólida será a vinculação afetiva e a interiorização da imagem materna, que permitirão a construção de uma identidade própria, autónoma e segura.
É indiscutível que o leite materno oferece valiosos benefícios para o desenvolvimento do bebé. Não só ao nível nutritivo, mas também da relação. No entanto, nada supera o vínculo materno, pelo que vale a pena questionarmo-nos, mais do que sobre a obrigatoriedade de um atestado que comprove a amamentação, por que razão só os bebés que são alimentados com leite materno podem ter a companhia da mãe durante mais tempo. Então, e aqueles cujas mães não conseguem, não querem ou não podem amamentar? Não terão o mesmo direito – e o mesmo benefício – de poder contar com a presença da mãe durante mais tempo?

Mais do que o leite, é o colo quente e contentor da mãe, as respostas aos pedidos do bebé, o olhar meigo, a sua presença afetiva, a voz doce, o carinho, a forma como só ela o sabe aconchegar e alimentar (com ou sem leite materno), contar histórias e brincar, que farão do bebé uma criança vigorosa e saudável, não só ao nível físico, mas também emocional.
Definir que uma criança só tem direito a estar mais tempo com a mãe se estiver a ser amamentada é reduzir a maternidade a uma função biológica, desvalorizar a mãe como um todo e ignorar a importância da relação primordial.

No auge da polémica foi sugerido que algumas mães prolongam o período de amamentação para manterem o direito à licença. Em vez de criticarmos mães que querem passar mais tempo com os seus filhos, como se isso representasse uma forma grave de oportunismo, talvez devêssemos perguntar-nos por que o fazem. A necessidade de estar mais tempo com uma criança pequena e o desejo de contrariar a tendência da sociedade moderna de relegar a família para segundo plano não serão, na verdade, sinais de saúde?