Negociar o nuclear com o Irão

Lições aprendidas, replicáveis noutras geografias

O programa nuclear iraniano arrancou no final dos anos 50, sob a égide dos EUA, na senda do discurso ‘Átomos para a paz’ do Presidente Eisenhower, proferido na Assembleia Geral da ONU, em 1953. Washington disponibilizou a Teerão, como a outros Estados, acesso ao conhecimento científico e tecnológico necessários à utilização do nuclear para fins civis, essencialmente para produção de energia, assegurando a um mesmo tempo uma quota de mercado para as empresas americanas fornecedoras de reactores nucleares e um controlo político sobre o seu uso, com o propósito de evitar a militarização da tecnologia nuclear. Aos EUA juntaram-se empresas francesas e alemãs. Em 1974 foi planeada uma capacidade de produção nuclear de 23MW (Portugal tinha, em 2023, uma capacidade total instalada 24MW para todas as fontes de produção de electricidade). A queda do Xá em 1979 desbaratou o programa nuclear iraniano que só no final dos anos 80 foi retomado, agora com a ajuda da China, Paquistão e Rússia.

Neste quadro o Irão foi um dos signatários do Tratado de Não Proliferação (nuclear) ficando, desde 1970, proibido de desenvolver um programa nuclear com objectivos militares. Tal não impediu, a partir dos anos 90, o seu desenvolvimento oculto: um centro de enriquecimento de urânio em Natanz (com uma capacidade de enriquecimento muito superior à necessária para fins civis, mais tarde replicada nas instalações subterrâneas de Fordo) e um reactor de água pesada em Arak. Em 2002 a oposição iraniana divulgou a existência destas instalações e deu-se início a um jogo do gato e do rato, com Teerão a assumir compromissos de não militarização da indústria nuclear, compromissos cujo incumprimento a Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) veio a constatar ao longo do tempo. Por diversas vezes, desde 2006, o Conselho de Segurança da ONU, os EUA e a União Europeia  decidiram sanções contra indivíduos e organizações iranianas responsáveis pelo programa nuclear.

Depois de dois anos de negociações com os membros permanentes do CSONU, a Alemanha e a UE, foi assinado em 2015 o Joint Comprehensive Plan of Action (JCPA), comprometendo-se o Irão a limitar a sua indústria nuclear aos fins civis em troca do levantamento das sanções pela ONU, EUA e UE. Em 2018 o Presidente Trump promoveu o recesso dos EUA em relação ao JCPA e o Irão retomou o programa de militarização nuclear o que foi comprovado pela AIEA. Em Junho deste ano Israel e os EUA bombardearam as principais instalações do programa nuclear iraniano.

O que é que aprendemos com esta sucessão de eventos?

A arma nuclear é a garantia de segurança máxima, pelo que Teerão continuará a procurá-la, tendo presentes as consequências da desnuclearização da Ucrânia, Bielorússia e Casaquistão em 1994 (Protocolo de Budapeste) e da não nuclearização da Líbia (indutora do ataque a Kadafi).

Os mecanismos de verificação têm de ser robustos e internacionalizados (AIEA).

A ambiguidade das soluções jurídicas pode permitir a sua formalização mas é fonte de insegurança como se viu com a violação do Protocolo de Budapeste pela Rússia (em 2014 na Crimeia e em 2022 em toda a Ucrânia) e com o JCPA (que os EUA consideraram um mero acordo político e não uma convenção internacional esquecendo-se que foi aprovado pelo CSONU via resolução 2231).

As sanções só são eficazes se não forem contornadas, como infelizmente acontece com as exportações de petróleo iraniano e russo.