A Bridge Not To Be Built

Que custo absurdo tem acalentar os que querem chegar em Alta Velocidade directamente de perímetros mais alargados ao novo Aeroporto de Lisboa (quantos serão ?), só para não terem que apanhar o suburbano que os leva até ao seu avião em poucos minutos, tal como fazem os próprios habitantes desta cidade ?

A ponte Barreiro/Chelas, integrada no desígnio TGV, é um projecto que não deve de maneira nenhuma ir para a frente e nesse sentido há-de ser revisto tudo o que conduziu a esse erro tremendo de Urbanismo e de Ordenamento do Território.

  • Não deve ser construída, por ser muito mais cara que outras alternativas mais económicas e com melhor desempenho urbanístico; seria isso, por si só, um excelente motivo para o abandono.
  • Não deve ser construída, porque vai obrigar a uma nova Estação Ferroviária na Margem Sul, no meio do nada, sem interface com coisa nenhuma, forçando a novos acessos tanto rodoviários como ferroviários, para que pudesse passar a ter alguma razão de ser, tudo isto em lugar de usarmos o que temos, que é o que se faz um pouco por todo o mundo; seria isto, por si só, motivo bastante para julgar de novo o tema.
  • Se um dia lá estivesse a mencionada ponte, bonita e imponente, mas simultaneamente enorme e monstruosa, para nós todos que gostamos de Lisboa, jamais veríamos a nossa sólida Sé, pois apenas a ponte encheria todo o horizonte; pelo mesmo motivo, deixaríamos de ver S. Jorge o Castelo, S. Vicente de Fora a Casa do Bispo, ou Santa Engrácia o descanso dos Ilustres; palácios e conventos da velha Lisboa, ficariam afogados num impacto brutal do “monstro”, logo ali ao lado; venha de lá  uma “maqueta” e logo ponderem as coisas com esta perspectiva, ou então, vejam apoucar, a olhos vistos, o pouco que temos.
  • Arrasta ainda esta concepção, para o traçado que há-de arruinar a Lezíria: nem a compartimentação da Propriedade foi vista com critério; nem o excelente “Projecto Tejo” de irrigação foi considerado; nem as neblinas que se hão-de deter por demasiado tempo nos contrafortes dos aterros, queimando tudo em vastas áreas, por não serem sopradas com o natural “respirar” dos vales; pouco foi tido em conta a não ser uma leitura economicista de que por ali, talvez seja mais barato que pelo Oeste; contudo, aquilo que é Fomento, não deve ter leituras estritamente economicistas. Pela Lezíria, não por favor.

Contudo, o principal motivo para que de vez mudemos o rumo do erro crasso, é que a ponte, tal como está concebida, não cumpre os desígnios da Ferrovia, antes pelo contrario.

Senão vejamos: quando olhamos para o mapa de uma grande cidade, apercebemo-nos que as autoestradas em torno dela, formam como que um “novelo” aparentemente confuso, mas simultaneamente funcional; é assim que as vias rápidas das grandes urbes se apresentam.

Apercebemo-nos ainda que o comboio, é como que a “agulha” que fura esse “novelo” e vai direito ao centro histórico das cidades, complementando o uso dado às Estações antigas, implantadas com todo o saber desde então; passa-se isto em todo o lado onde vamos por essa Europa fora e é assim que as vias férreas das grandes urbes se apresentam.

Ora aqui, sem qualquer consideração pelas Gentes, pelo que já temos construído e pela Geografia da Grande Cidade, aquela que se estende de Santarém a Setúbal (ou ainda mais dilatada, se a quisermos desenhar no âmbito do denso perfil do país litoral), onde o fantástico Estuário do Tejo, separa a Península de Setúbal, da Península de Lisboa, urbe onde residem umas cinco milhões de pessoas, ou urbe que deve ser dimensionada para isso (ou mesmo mais, para que planeando, não andemos sempre a apagar fogos), aqui, dizia eu, em lugar de o comboio procurar servir essas pessoas onde elas vivem, ou têm condições de aceder no uso dos interfaces sabiamente concebidos por outros ao longo dos tempos, vamos construir uma infraestrutura precisamente “tangente” à Península de Setúbal e “tangente” à Península de Lisboa, não cumprindo de todo a sua função básica, elementar, lógica, técnica, num dos maiores erros de Urbanismo possíveis de encontrar, onde a Paisagem Urbana ficará definitivamente estragada, sob todos os aspectos.

Por favor, com toda a simplicidade, abandonem essa concepção.

Vejamos agora, numa outra linha de raciocínio.

Se em toda a Europa, que eu saiba, apenas um Aeroporto se interessou pelo TGV (Charles De Gaulle em Paris), eventualmente por se tratar de um soberbo Centro de Distribuição Ferroviário de todo um Continente; se em Espanha, que é quem tem mais milhas de TGV nestas bandas do Planeta, não há um único Aeroporto que se tenha interessado por ter TGV; se em Itália, ou no Reino Unido, se passa exactamente o mesmo, nenhum Aeroporto tem TGV; por que raio e mania andamos nós com o comboio à procura do avião e o avião à procura do comboio ?

Façam o TGV no sítio dele, cumprindo a sua vocação ferroviárias e o Aeroporto no sítio dele, cumprindo a sua função específica, mas pelo Amor de Deus, não misturem as coisas, que isso conduz inevitavelmente a erros gravíssimos de desenho, como tenho procurado evidenciar; obviamente que o Aeroporto terá sempre que ter ferrovia suburbana, ou mesmo metropolitano, para o seu regular funcionamento.

A não ser que o que estejamos a construir, não seja de todo um TGV, mas apenas um bypass rápido à saturada Linha do Norte, e então o cenário ainda é mais grave, pois andamos a vender ao Povo “gato por lebre”; seis horas a Madrid em 2034, 40 anos depois de o Madrid/Barcelona (distancia idêntica), levar menos de 3 horas, é disso uma clara evidência.

O que ainda não se entende, é que quem venha do Porto, de Coimbra, ou mesmo de um qualquer recanto de Espanha, “exija” acesso directo em “Alta Velocidade” ao novo Aeroporto de Lisboa, quando todos os habitante da Grande Lisboa, para aceder ao mesmo Aeroporto, ou seja, ao “seu” Aeroporto, terão que apanhar no mínimo dois comboios suburbanos: um que o traga dos arrabaldes onde moram e outro que os leve até ao Aeroporto; Paddington Station em Londres, para mencionar uma delas, ou Stazione Termini em Roma; ou Estacion de Chamartin em Madrid, cumprem essa função de interface; de referir que o que importa às pessoas é a certeza do tempo que levam a cumprir a distância; o traçado, é-lhes indiferente.

Que custo absurdo tem acalentar os que querem chegar em Alta Velocidade directamente de perímetros mais alargados ao novo Aeroporto de Lisboa (quantos serão ?), só para não terem que apanhar o suburbano que os leva até ao seu avião em poucos minutos, tal como fazem os próprios habitantes desta cidade ?

Sugiro que voltemos a estudar a “Sebenta” da Figueira da Foz, já velhinha, mas ainda perfeitamente actual.

Quatro ligações em alta velocidade ao país vizinho estão ali previstas, sendo que duas são regionais (Vigo e Madrid) e duas são Europeias (via Corredor do Atlântico, uma e via Corredor do Mediterrânea, a outra), fazendo uso dos sábios “Centros de Distribuição Ferroviários” que estão mais próximos da fronteira, Valladolid, a Norte e Córdova/Antequera, a Sul.

Numa interessantíssima conferência na Ordem dos Engenheiros no passado dia 5 de Junho 2024, esteve presente o Philippe Lorand, ilustre representante do TGV a nível mundial e a Maria Luisa Domínguez Gonzáles, digníssima representante da TGV a nível da Europa.

Ficamos a saber claramente o que tem sido explanado por alguns nos últimos 40 anos, duas coisas relativamente simples:

  1. A escala do Projecto não é definitivamente Ibérica, mas sim Europeia, isto é, vai de Portugal à Polónia e da Sicília à Escócia e à Escandinávia; ensina-nos isso o Philippe, com a evidência da China, com os seus 40.000,00 Km de linhas em pleno funcionamento e com mais de 20.000,00 Km Projectados ou em construção;
  2. Por outro lado, o TGV é para andar depressa, ou seja, se andamos a fazer ensaios a 600 Km/h, então as Plataformas de Via em Portugal devem ser concebidas para essas velocidades extremas, tanto mais que somos periféricos, ultra periféricos e pela frente temos toda uma Meseta até chegarmos aos tuneis dos Pirenéus; Plataforma de Via bem-feita, foi a que no tempo da máquina a vapor, suportou um “Pendular” da 220 Km/h.

Que importa se nos “anos vinte” deste século andam a fazer uma “cócegas” à Linha da Beira Alta, se um dia, benditas gerações que o determinem, haveremos de chegar aos túneis dos Pirenéus em pouco mais de duas horas ?

“Take your time”, mas com a consciência de que cada milha que se faça no âmbito do futuro corredor do “TGV Atlantic”, há-de ser feita para essas velocidades extremas e não para os 350 Km/h, que estão a ser implementados em certos troços do Lisboa/Porto; Paris, Bordéus, Valladolid, Lisboa; Paris, Bordéus, Valladolid, Porto, deduz com toda a clareza que o Lisboa/Porto, não é mais que o desenho final do “TGV Atlantic” e portanto, essa plataforma de via, terá que ser concebida para velocidades extremas.

Há quem argumente que com a velocidade, o consumo tem uma equação quadrática; trata-se de uma Lei da Física que pouco podemos contra ela; diferente, é a Lei da Economia, que dita que quando há excesso, o preço baixa; ora, Energia é o que há mais nesta Terra e portanto esse equilíbrio entre a velocidade do comboio e o preço dos bilhetes, compete às gerações futuras determinar; o que elas nos pedem, é simplesmente que lhes deixemos plataformas de via para andarem depressa, se lhes aprouver, isto é, que lhes deixemos plataformas de via próprias para isso mesmo e não construídas a menos; cuidado que o risco que fizermos hoje na paisagem, é definitivo.

Em Lisboa, se atendermos conscientemente ao “obstáculo” que representa a geografia do estuário do Tejo, teremos que ter quatro estações de TGV, para bem servirmos as populações interessadas:

  • Para o “Corredor Mediterrânico”, Pinhal Novo e Pragal.
  • Para o “Corredor Atlântico”, Oriente e Sta. Apolónia.

Pinhal Novo, “Centro de Distribuição Ferroviário” fantástico, onde podem vir a concorrer oito destinos diversos:

  1. Lisboa, em Suburbano pela Ponte 25 de Abril (em funcionamento)
  2. Barreiro e “Sul e Sueste”/Terreiro do Paço (em funcionamento)
  3. Setúbal e Ramais do Sado (em funcionamento)
  4. Alentejo e Algarve (em funcionamento);
  5. Montijo, requalificando para metro de superfície, a plataforma de via que já lá está feita há mais de cem anos e hoje convertida numa ciclovia;
  6. Novo Aeroporto em Alcochete, num suburbano rápido vindo de Lisboa, com paragens apenas no Pragal e no Pinhal Novo;
  7. TGV, para ligar os Corredores do Mediterrâneo;
  8. TGV, para o Pragal e Sta. Apolónia.

Pragal, interface perfeito na “Outra Banda”, com vasta gama de alternativas:

  1. Travessia Rodoviária da Ponte 25 de Abril;
  2. Travessia Rodoviária do Túnel Trafaria/Algés;
  3. Metro de superfície, que abarca toda uma vasta área em torno da Cidade de Almada;
  4. Travessia Ferroviária, na Ponte 25 de Abril;
  5. Travessia Ferroviárias no Túnel Pragal/Sta. Apolónia.

Gare do Oriente, com as valências que tem, designadamente com a ligação à circular de Lisboa;

Sta. Apolónia, como Estação Central da Capital, provávelmente num sóbrio mas eficiente duble-deck, encontro soberbo dos Corredores do Atlântico e do Mediterrâneo:

  • Ligação ao Pragal e aos corredores do Mediterrânea;
  • Ligação ao Oriente e aos corredores do Atlântico.
  • Ligação à circular de Lisboa.
  • Interface com o Terminal Marítimo.
  • Linha de Metropolitano.
  • Túnel Pedonal Campolide/Sta. Apolónia, túnel esse que esporadicamente é uma fundamental infraestrutura hidráulica e de saneamento, mas que estando a seco 360 dias por ano, senão mais e percorrendo por coincidência uma série de sítios de mobilidade urbana, há-de cumprir e bem essa valência, a fim de que não se cumpra apenas ali um “sub-uso” de afronta.

Com um quinto do dinheiro da ponte Barreiro/Chelas, faz-se este túnel do Pragal para Sta. Apolónia, económico, seguro, sem impacto negativo na paisagem urbana da Grande Cidade; tema com toda a certeza carregado com inúmeras interrogações técnicas, matérias de estudo (lodos, declives, sismos, espaço disponível, processos construtivos, etc.) mas que já foram obviamente ponderadas antes de virem para estas linhas.

Se em 40 anos a dita ponte ainda não foi feita, uma das razões entre tantas outras, passa pelo que aqui vos deixo, como que um incómodo latente no subconsciente coletivo, adverso ao que de facto não nos serve para nada.

Se errar é humano, permanecer no erro é diabólico.

Bem hajam.

Eng. Civil – IST; OE 18008