Um fósforo

A minha realidade e a do homem que deixa marcas relevantes na Comunicação Social portuguesa nunca conseguiram confluir e abrir espaço para que as vontades se abraçassem.

Nunca trabalhei diretamente com Francisco Pinto Balsemão. Embora as hipóteses e conversas para que uma relação profissional se pudesse estabelecer tenham sido várias, a verdade é que, por uma razão ou por outra, ela nunca se concretizou.

A minha realidade e a do homem que deixa marcas relevantes na Comunicação Social portuguesa nunca conseguiram confluir e abrir espaço para que as vontades se abraçassem.

Não sei, no momento em que as escrevo, para onde estas linhas me conduzem. Deixo-me apenas levar pela sensação de vazio para que o desaparecimento de pessoas que povoaram o meu universo profissional e pessoal, durante muitos anos, me arrasta.

Por vezes, fico com a sensação de que já vi demais e que assisti a coisas que nunca esperava presenciar. Entre a esperança e o desencanto, a alegria e a tristeza, a inovação e o imobilismo, a indiferença e a solidariedade, a vida escoa-se ao ritmo de um fósforo. Que fica de tudo isto, desta montanha russa em que os dias se consomem?

Gostaria de chegar à conclusão – pelo menos, na área da Comunicação Social, desde sempre, aquela onde me movo – que não se revela inútil a batalha diária de tentar criar condições para um Jornalismo honrado, feito de seriedade e coragem.

Gostaria de chegar à conclusão que os mais novos nesta profissão absorvem princípios e práticas que colocam o cidadão no centro da atividade, em detrimento da vaidade fútil e da fama ao alcance de um clic.

Gostaria de chegar à conclusão que o respeito pela Independência do Jornalismo é um bem não transacionável e que os Poderes – todos os Poderes – não só o reconhecem como tal, mas aceitam defendê-lo com intransigência e sem hipocrisias.

As tecnologias estão a transformar o Mundo, dia a dia, a uma velocidade incontrolável. Não há que ter medo disso.

É fundamental que, conscientes dessa realidade, nos adaptemos, empresas e profissionais, a uma alteração de paradigmas que marcará, seguramente, o quotidiano de todos.

O futuro é um rolo compressor, que se faz sentir já no presente. Tenho filhos e também já netos. Não necessito de grandes capacidades de adivinhação para antever que o percurso de cada um deles não será fácil, esmagados entre o muro dos ensinamentos e da cultura que receberam e a imprevisibilidade dos avanços de uma era em que a Inteligência Artificial se assume, imponente e ditatorial, como mola de uma nova vivência em sociedade, espatifando o que se conhece, revolucionando os meios de produção e reformulando padrões de relacionamento.

É a essa luz que vou observando o que para trás foi ficando, com a noção de que ainda é cedo para eu próprio proceder a um balanço de ganhos e de perdas pessoais, mas sem ilusões de que se perdeu demasiado tempo, neste País, com discussões inúteis e quezílias estéreis.

A minha geração deveria ter feito mais. As seguintes também. Talvez nos tenhamos preocupado mais connosco e com o nosso sucesso e bem-estar de que com o nosso vizinho do lado e as suas dificuldades.

Fico envergonhado ao ver gente sem tecto e angustiado por perceber que há quem tenha de escolher entre comprar medicamentos para enfrentar a doença ou adquirir pão para enganar a fome.

Todos juntos acabamos por fazer menos do que, porventura, devíamos em prol de um mundo melhor. Não fica mal a ninguém reconhecer que o egoísmo é um fardo que descontrola a balança dos equilíbrios sociais.

Os falsos moralismos dispensam-se. No entanto, não fica mal a ninguém admitir que tanto a consciência individual como a coletiva precisam de ser insufladas com os vírus da bondade e da esperança. A começar pelo Orçamento de Estado em discussão, passando pelo destino de tantos subsídios sem conta e sem sentido que se despejam no País e a terminar nas oportunidades para desenvolvimento que o Estado tem por obrigação proporcionar e que se perdem em prol de ninharias, interesses particulares e jogos de poder.

São pensamentos que surgem, dispersos, no meio dos rituais com que Francisco Pinto Balsemão foi homenageado. À sua volta, nos Jerónimos, juntaram-se as mulheres e homens em cujas mãos residem os destinos de Portugal. Como seria bom que se conseguissem unir para os consensos corajosos de que o País está tão necessitado!

Essa seria a maior e mais justa homenagem que prestariam ao povo português.

PS: Hoje, acerca do Benfica, só uma velha expressão: ‘Que Deus nos Acuda!’