Quando os telemóveis dos pais são um perigo para os filhos

Muitas mães, preocupadas e bem-intencionadas, usam o telemóvel como uma espécie de controlo remoto dos filhos.

Embora estejamos cada vez mais conscientes dos efeitos das novas tecnologias entre os mais novos, já não é tão evidente – nem mesmo para os pais mais atentos e sensíveis a estas questões – que os adultos também não são imunes aos encantos e tentações dos pequenos ecrãs. E, no caso de serem pais, apesar de criticarem frequentemente o uso excessivo destes dispositivos por parte dos filhos, nem sempre se apercebem de que, por vezes, padecem do mesmo mal.

Mais curioso ainda é o facto de, frequentemente, esse uso excessivo acontecer precisamente em nome dos filhos.

Quando vemos pais – e sobretudo mães – demoradamente absorvidos no pequeno ecrã, enquanto dizem aos filhos, que os interrompem com as suas solicitações constantes, ‘só um segundo’, isso não significa que não se preocupam com eles ou que não estejam, naquele preciso momento, a tentar zelar pelo que consideram ser o seu supremo interesse e bem-estar.

Na verdade, muitas mães, preocupadas e bem-intencionadas, usam o telemóvel durante uma parte considerável do tempo como uma espécie de controlo remoto dos filhos. E não me refiro apenas ao ‘controlo parental’.

Quantas mães extremamente dedicadas, preocupadas e bondosas –que fazem tudo o que está ao seu alcance para ajudar os filhos – participam ativamente em grupos de WhatsApp, a qualquer hora do dia ou da noite, numa procura conjunta e constante da melhor fórmula para os apoiar?

A preocupação com o seu bem-estar é tal que, por vezes, na ânsia de os proteger, acabam por se antecipar e resolver por eles situações simples do dia-a-dia – como pequenos conflitos com colegas, com a escola ou com os professores – retirando-lhes valiosas oportunidades de aprendizagem e crescimento.

Ao mesmo tempo, ficam a saber, através das mães dos outros, o que as nossas jamais souberam, quiseram saber ou nós quereríamos que soubessem – como episódios simples, e por vezes íntimos, dos seus filhos ou dos filhos dos outros que, contados na terceira pessoa, acabam por ser inadvertidamente empolados.

Paralelamente, quantas seguem influenciadores de parentalidade mais ou menos duvidosos com o intuito de aprender a lidar melhor com os filhos e a compreendê-los, como se não os conhecessem melhor do que ninguém desde que os transportavam na barriga? Como se não tivessem assistido de perto ao seu crescimento? Como se a sua sensibilidade para a maternidade não estivesse a ser polida desde os tempos em que brincavam com bonecas?

Quantas ligam aos filhos dezenas de vezes ao longo do dia, ou os seguem através de aplicações com uma espécie de radar que aciona o alarme quando eles se desviam da rota – como se estivessem em perigo iminente – quando, na verdade, podem apenas estar a dar uma volta ao bilhar grande para irem namorar um bocadinho ou a explorar com os amigos um caminho novo para casa? Felizmente, esses radares ainda não têm câmara… mas já faltou mais.

Não nos cabe ser o satélite controlador dos nossos filhos, nem negar-lhes a liberdade e privacidade que nós também tivemos – e que tanto apreciámos. Devemos aceitar – e desejar – que nem sempre andem na linha, que tenham segredos, que por vezes façam uma ou outra marotice – algumas que é melhor nem sabermos – e que tudo isso faz parte de um crescimento saudável.