Desde tenra idade, as crianças judias aprendem que foram escolhidas por Deus para um propósito único e que as suas almas (Neshama) foram criadas como uma centelha divina de natureza sagrada e imortal, superior à dos outros mortais – os “goyim”. Cada alma percorre uma viagem de vida através de vários níveis de desenvolvimento espiritual, que vão desde o sensível ao intelectual. Estes níveis conduzem a um equilíbrio que deverá possibilitar uma união profunda e sagrada após o Dia do Juízo Final.
Para os 27% dos cidadãos israelitas que são quase na sua totalidade de ascendência palestiniana ou levantina, esta diferenciação é algo desconcertante. A maioria destes goyim são de crenças islâmicas ou cristãs, que concebem a redenção das almas de uma forma quase idêntica à do judaísmo. No entanto, isso impede que sejam incluídos, apesar de serem cidadãos de pleno direito desde 1980, no hino nacional do seu país.
Além disso, este processo de exclusão relaciona-se com uma minoria substancial da população étnica judaica registada (73%), que é irreligiosa ou se converteu a uma fé diferente do judaísmo. Para os judeus ortodoxos, tais aberrações são também inaceitáveis para a qualificação como possuidores da “Alma Judaica”.
A lei rabínica lança ainda dúvidas sobre a autenticação dos migrantes que fizeram Aliá ao abrigo da Lei do Retorno (1950), que concede a cidadania a todos aqueles que possam comprovar a descendência de pelo menos um avô ou avó judeu(ia).
Os membros extremistas do governo de direita têm defendido a limpeza étnica gradual de Israel para que, eventualmente, os seus cidadãos constituam um Estado inteiramente judaico. Os cidadãos existentes que não se qualifiquem como judeus poderão permanecer no país através de um sistema de residência permanente, que lhes concederá direitos civis limitados, mas exigirá ainda o pagamento de impostos e a prestação de serviço nacional.
Os israelitas insistem que tais questões constitucionais devem ser de interesse exclusivo interno e não permitirão interferências externas da ONU ou dos Tribunais Internacionais de Justiça, que podem sugerir violações dos direitos humanos.
Contudo, o mesmo não se pode dizer da actual intenção declarada do governo do Sr. Netanyahu de procurar a soberania sobre toda a Cisjordânia e Gaza, além de certas partes da Jordânia, Síria e Líbano, revertendo assim à Eretz Israel dos tempos bíblicos.
Isto representa uma alteração significativa na política gradual acordada em 2020 pela coligação Gantz/Netanyahu, segundo a qual a anexação estaria limitada aos territórios dos colonatos, incluindo o Vale do Jordão, ligados por estrada e por caminho-de-ferro a Israel, deixando assim os palestinianos na posse temporária de um Estado constituído por uma série fragmentada de enclaves.
Sob a direcção de Bezalel Smotrich, a posição ideológica dos extremistas de direita no poder é que toda a ideia de um Estado palestiniano soberano separado deve ser abandonada em favor da anexação completa para formar o regime de apartheid da Eretz Israel.
Haverá apenas três opções para os quase seis milhões de palestinianos que actualmente sobrevivem em Gaza, na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental:
1.º Evitar viver sob o domínio israelita, aceitando auxílio para emigrar.
2.º Permanecer como residentes não cidadãos, com direitos limitados e a obrigação de viver em “reservas” designadas para prestar serviços domésticos e realizar trabalhos manuais.
3.º Continuar com a resistência armada e ser esmagado militarmente.
O árabe deixará de ser uma língua oficial. A actual estrutura da lei e da administração israelitas será aplicada tanto a casos seculares como religiosos.
Enquanto o apoio de Trump e Kushner continuar, pouco será feito para impedir a plena implementação do Plano Smotrich para que o Estado Judeu de Eretz Israel se torne a força mais poderosa, económica e militarmente, do Médio Oriente.
Parece que as almas nestas circunstâncias aflitivas terão de esperar até ao Dia do Juízo Final por um alívio divino.
Tomar, 30 de outubro de 2025