Os tempos são outros… 

É importante não confundir: psiquiatras são médicos que tratam as doenças mentais, neurologistas as doenças neurológicas e psicólogos as doenças do foro psicológico…

Em agosto, por motivos profissionais, visitei uma grande empresa em Lisboa que tinha mudado de instalações para a zona ocidental da capital. Espaços amplos, ambiente acolhedor, tecnologia sofisticada e tudo pensado ao pormenor onde a modernidade, o requinte e o bom gosto se juntaram numa harmoniosa combinação. Chamou-me a atenção para a existência de um ginásio apetrechado a rigor e pronto a responder aos mais exigentes, pois a manutenção da forma física é hoje inquestionável. E será só com esta finalidade ou a pensar também em perder peso, indo ao encontro das teorias modernas que fazem da magreza o objetivo número da vida do ser humano? De facto, os ginásios multiplicam-se um pouco por toda a parte, embora sejam poucos aqueles que os procuram numa perspetiva de educação para a saúde. A esmagadora maioria dos utilizadores acredita piamente que a ida regular ao ginásio os faz perder peso, voltando assim à forma física de outros tempos. A ideia está lançada: há que ser magro custe o que custar. A magreza comanda a vida e as pessoas com peso a mais são vistas com outros olhos, todos lhes apontam o dedo e sentem-se mal consigo próprias. É a realidade!

Outra coisa que me marcou durante a visita foi ver os funcionários em ‘open space’ em frente a computadores trabalhando cada um para seu lado, sem falar com ninguém num silêncio sepulcral. É, sem dúvida, uma forma moderna de trabalhar, virada para o futuro, mas que vai na linha da tendência generalizada dos nossos dias onde as pessoas se vão fechando cada vez mais em si próprias e a comunicação entre elas vai-se perdendo aos poucos. Veja-se, por exemplo, que hoje é mais usual utilizar o telemóvel para mandar mensagens do que para falar diretamente o que em minha opinião é assustador e bem revelador de que os tempos são outros…

Como reflexo da ‘vida nova’ em que vivemos, não é novidade para ninguém que as idas aos psicólogos estão na moda e a tornar-se numa prática corrente. Isso resulta em grande parte do rótulo que a sociedade colocou nos psiquiatras mas também por desconhecimento na matéria.

No exercício da minha profissão tento sempre esclarecer os doentes, até por que muitas doenças do foro psíquico vão parar erradamente à Neurologia tudo para fugir às consultas de Psiquiatria! É importante não confundir: psiquiatras são médicos que se ocupam do tratamento das doenças mentais, neurologistas tratam doenças neurológicas e psicólogos são outros profissionais que ajudam as pessoas a perceber e a identificar os seus problemas para lidarem melhor com aquilo que as perturba. Compete ao médico assistente, depois de avaliar o doente, orientá-lo no sentido mais correto. Fica aqui o esclarecimento, pois a saúde dos doentes não pode, nem deve estar em autogestão.

Deixei para o fim um tema pertinente, melindroso e preocupante. Os tão falados lares da terceira idade. Estas residências, salvo raras e honrosas exceções, deixam muito a desejar, não só pela inexistência de espaço físico adequado, como pela escassez de pessoal competente e qualificado, para não falar já no tratamento dado aos seres humanos no final de vida. Para muita gente, sem outro tipo de recursos, será inevitavelmente a única solução. Porém, já não consigo compreender que famílias com possibilidades, não coloque como primeira prioridade o recurso a ‘cuidadores’ no seu próprio domicílio e prefira empurrar os seus familiares para fora de casa, cujas consequências não serão nunca as melhores. Os tempos são outros e hoje, por muito que nos custe reconhecer, ninguém quer suportar dificuldades, nem o peso dos trabalhos acrescidos, quando um problema grave lhe bate à porta.

Vale a pena parar e refletir. Há que olhar para aquilo que havia e para aquilo que há. Para o que era e o que é. Para o que se perdeu e se ganhou. O tempo da amizade, da solidariedade, da justiça e do amor ao próximo já lá vai. Hoje, os tempos são outros.