Quando, vai para quase dois anos, o PSD se apresentou a eleições antecipadas, o programa eleitoral parecia ter apenas uma ideia económica: baixar impostos. Pode dizer-se hoje: o programa está a ser cumprido. Porque os impostos estão a descer – primeiro nos rendimentos de trabalho e nos lucros das empresas, agora nos rendimentos prediais. E muito. Mesmo muito. Para senhorios (IRS), para construtores (IVA) e promotores imobiliários (IMT, IMI).
Na imigração, o Governo ‘confiscou’ a agenda do Chega. Nos rendimentos mais baixos (salário mínimo, pensões, complemento solidário para idosos e apoios na compra de medicamentos), apropriou-se das políticas do PS. E agora, nos impostos, implementou ideias da Iniciativa Liberal. Porque é esse, para já, o grande instrumento de política pública do Governo: baixar impostos e melhorar o negócio a senhorios, investidores e promotores imobiliários, acreditando que, com isso, surgirão mais 300 mil casas no mercado de arrendamento, baixando os preços a médio prazo.
A perda de receita do Estado ainda não foi quantificada, mas é fácil prever menos centenas de milhões de euros a entrar nos cofres do Estado pela redução do IRS de senhorios, pela baixa do IVA para a construção pata 6% (que o programa eleitoral estimara em 500 milhões) e pelas isenções de IMT, imposto de selo, IMI e AIMI para privados que construam ou reabilitem casas colocadas no mercado – tudo isto sujeito ao cumprimento do limite de 2300 euros mensais. Como é fácil antecipar que esta descida será compensada por novos aumentos (ou ‘redução das reduções’, essa magnífica expressão) dos impostos sobre os combustíveis.
A questão é a eficácia.
De um dia para o outro, sem fazerem nada, sem introduzirem uma nova casa no mercado, sem preencherem um papel, sem trocarem uma palavra com inquilinos, os senhorios em Portugal (os que cobram rendas até 2300 euros) vão ter um aumento de rendimentos líquidos. Essa é a consequência imediata do ‘choque fiscal’: numa renda de mil euros, os senhorios ganham 150 euros limpos por mês; numa renda de dois mil euros, encaixam mais 300. No final do ano, é como receber quase 14 rendas e meia e não 12. São mais 20% de rendimento líquido. Se isto não é ‘uma enorme descida de impostos’, nada o será.
Irão os senhorios baixar as rendas por causa disto? Provavelmente, não: os senhorios pretendem sempre receber o máximo possível. Irá a descida do IVA baixar os preços de venda ou das rendas? Provavelmente, não completamente, pela mesma razão. O efeito potencial não vem daí, vem da esperada colocação de muitas casas (novas e velhas) no mercado de arrendamento, aumentando-se a oferta e assim criando pressão para baixar preços.
O esforço fiscal do Estado é grande de mais para estas políticas não surtirem efeito. Vai demorar tempo a percebê-lo. Até porque falta cumprir a maior reivindicação dos senhorios, que nem é o fim das rendas congeladas, mas sobretudo a agilização dos despejos. O Governo prometeu-o (assim como a aceleração das heranças indivisas) para este ano, mas adiou-o para 2026, possivelmente para depois das eleições presidenciais. Até lá, os senhorios ganharam o que nem tinham sonhado pedir, uma fortíssima descida de impostos. Se for aprovada no Parlamento (e o Chega mostra disponibilidade para tal), esses senhorios podem voltar a acreditar no Pai Natal: chama-se Luís Montenegro. Oh oh oh…