Empresas com prejuízos crónicos? É hora de fiscalizar

Quem apresenta prejuízos ou resultados nulos durante três anos consecutivos, ou em três anos interpolados num período de cinco, deve ser alvo de auditoria fiscal

De vez em quando, frequentava um restaurante conhecido pelo espaço acolhedor e pela boa comida. Os preços não eram baixos, mas a qualidade justificava. Curiosamente, não aceitava cartões, apenas numerário ou MBWay. Presumi que fosse para evitar custos bancários. Mas alguns sinais — como a mudança frequente da conta associada ao MBWay e a relutância em emitir fatura — levantavam dúvidas.

Há dias, ao preparar casos de estudo para os alunos, encontrei a fatura dessa última visita. Por curiosidade, procurei as contas da empresa numa base de dados contabilísticos que estava a utilizar. Seis anos consecutivos de resultados negativos! Mais de trezentos mil euros de prejuízo acumulado. Se os números refletissem a realidade, o empresário estaria a pagar para trabalhar. Não parece plausível. A explicação mais provável? Parte da atividade não é registada, defraudando o Estado no IRC e na arrecadação do IVA que os clientes pagam.

Este caso não é exceção. No setor da restauração, é comum ver empresas com contas no vermelho ano após ano. As que apresentam lucros mostram valores residuais. A evasão fiscal parece ser regra, não exceção. O benefício fiscal ao cliente — deduzir 15% do IVA das faturas — ajudou a combater o flagelo, mas não eliminou o problema no setor.

A Lei Geral Tributária é clara: quem apresenta prejuízos ou resultados nulos durante três anos consecutivos, ou em três anos interpolados num período de cinco, deve ser alvo de avaliação indireta, que começa com uma auditoria fiscal. Mas isso não parece acontecer. Talvez porque, na perspetiva da Autoridade Tributária, é mais rentável concentrar os inspetores nos grandes contribuintes. O resultado? Uma mensagem de impunidade que alimenta a evasão fiscal nas pequenas empresas.

Resta-nos, enquanto clientes, fazer a nossa parte, ser elementos da solução. Pedir fatura de cada transação, mesmo que isso cause algum desconforto face à relutância de quem a deve emitir. É um gesto simples, mas essencial para combater um problema que mina a justiça fiscal.