A Europa e o Dilema Estratégico

A União Europeia alterna entre a aspiração a um papel de potência global e uma fragmentação política que condiciona a definição sobre o seu papel no contexto geoestratégico

A Europa vive um dilema estratégico profundo, marcado por uma sensação de desorientação histórica e política. O momento atual revela uma crise de natureza estrutural, associada à dificuldade em reconstruir a sua coerência interna, afirmar um desígnio estratégico consistente e transformar a experiência histórica acumulada numa orientação prática para o futuro.

A falta de coerência interna exprime-se de diversas formas. A União Europeia alterna entre a aspiração a um papel de potência global e uma fragmentação política que condiciona a definição sobre o seu papel no contexto geoestratégico. As diferenças entre os Estados-membros nas áreas da política externa, da defesa, da energia ou das migrações expõem um projeto que proclama unidade mas funciona sem uma vontade política partilhada. 

Esta fragilidade ganha maior expressão na indefinição do desígnio estratégico europeu. Uma Europa que encontra dificuldade em clarificar o seu papel no quadro internacional contemporâneo. A dependência em matéria de segurança, a relutância em assumir custos geopolíticos próprios e a confiança excessiva na interdependência económica como fator de estabilidade moldaram uma cultura política distante da reflexão sobre o poder. A prosperidade e a segurança passaram a surgir como realidades equivalentes, enquanto a soberania se diluiu num contexto em que a história demonstra a exigência permanente de lucidez estratégica.

A leitura das lições históricas continua a ser profundamente limitada quando se tenta transpor essas lições para o campo da prática política contemporânea. Embora a história europeia ofereça um vasto repositório de advertências e reflexões sobre os riscos decorrentes da desunião entre os povos, da complacência diante das ameaças externas e da subestimação sistemática das dinâmicas de poder, esses ensinamentos, lamentavelmente, não são plenamente aproveitados. 

As advertências sobre a fragilidade das estruturas políticas, a importância da coesão interna e a necessidade de vigilância constante frente aos desafios do sistema internacional, não se transformam em diretrizes claras para ações estratégicas no campo da defesa, da autonomia política ou da construção de uma robustez institucional duradoura. O que se observa é uma distância crescente entre os reflexos simbólicos e morais da história e a implementação de políticas estruturantes que possam fortalecer as nações e organizações internacionais contra as ameaças do presente e do futuro.

Deste modo, a Europa vive um paradoxo significativo. Possui uma herança histórica densa e uma cultura política sofisticada, enquanto revela uma prática estratégica fragmentada e hesitante. O passado ocupa um lugar central no discurso público, enquanto o futuro estratégico carece de definição clara. A governação tecnocrática assume protagonismo, o consenso mínimo prevalece sobre as decisões exigentes e a afirmação de valores surge dissociada da sua proteção efetiva.

A superação desta condição depende de uma inflexão consciente. O futuro europeu exige mais do que meros ajustamentos institucionais. Requer uma recuperação ativa do sentido histórico, uma definição clara do lugar da Europa no mundo e a determinação de reconhecer que a paz, a prosperidade e a autonomia resultam sempre de escolhas políticas e de uma inequívoca vontade coletiva.