A Conferência de Parceiros das Nações Unidas (COP-UN), reunida em Belém, no Brasil, em novembro passado, foi mais um evento de concentração de lóbis pró e contra a utilização de combustíveis fósseis, entre outros aspetos. Muitas declarações, muitas promessas, mas muito poucas ações concretas podem ser apontadas. É frequente referir-se políticos, diplomatas e representantes de governos nacionais que são convidados a participar na COP. Mas para além destes há um enorme conjunto de participantes não governamentais com o intuito de influenciar os resultados, uns com uma perspetiva individual outros coletiva.
Há inúmeras organizações que analisam não só os resultados das conferências COP-UN mas também os participantes, do que resulta uma composição deveras interessante. Por exemplo, a Global Witness reporta que na COP27 existia o dobro dos lobistas dos combustíveis fósseis, em comparação com os delegados da circunscrição oficial da ONU para os Povos Indígenas. Na COP28, no Dubai, reportaram um número recorde de lobistas da indústria, com quase 2.500 presentes nas negociações. E, no ano passado, na COP29, em Baku, o número de lobistas de combustíveis fósseis inscritos superou o de todos os delegados dos 10 países mais vulneráveis às alterações climáticas. Estas composições explicam, até certo ponto, a dificuldade de obter acordos mais vigorosos em prol da proteção ambiental. A negociação e o lobismo jogam um papel principal nestes processos. De um lado defensores de combustíveis fósseis e no lado oposto, os defensores da terra e do ambiente, em particular povos indígenas, que reivindicam uma maior proteção para os seus territórios contra a exploração por indústrias ambientalmente destrutivas, como a extração de madeira, a mineração e o agronegócio industrial. Os mais afetados pela emergência climática não são os que participam diretamente nas negociações na conferência, devido a várias barreiras, de caráter regulamentar, económico, legal e até mesmo físico, à sua participação.
A anterior COP 29 teve resultados muito tímidos, em comparação com as anteriores. Esta COP 30, não obstante a evidência de que não estamos a progredir na crise climática como era desejado, conseguiu alguns aspetos positivos relevantes. Por exemplo, foi finalmente acordado que o Fundo de Resposta a Perdas e Danos Operacionais ficará operacional a partir de 2025. Este fundo vai alocar recursos às comunidades mais afetadas pelas alterações climáticas, que são também as mais frágeis do ponto de vista financeiro, e com menos capacidade de implementar medidas de mitigação. Nos transportes, o grupo de ministros de 11 países, liderado pelo Chile, subscreveu uma declaração comum de compromisso para reduzir em 25% a energia nos transportes até 2035, transferindo um terço dos consumos do sector para energias renováveis. Outro aspeto muito positivo que emergiu desta COP 30 foi um protagonismo das cidades, até aqui excluídas de acordos e compromissos, que só eram celebrados ao nível dos países. Não obstante as contradições latentes nestas cimeiras, a COP 30 observou uma liderança, nunca observada antes, de líderes indígenas e comunitários de todo o mundo.
Cabe ainda salientar a ação a Presidência Brasileira ao lançar duas iniciativas voluntárias de “roteiro”. Nomeadamente, uma sobre desflorestação e outra sobre a transição dos combustíveis fósseis, a última apoiada por cerca de 80 países. No entanto, os impactos vão depender da urgência das ações de implementação.
Nos aspetos positivos da COP 30 as cidades evidenciam-se. Hoje já geram 75% de todas as emissões de gases com efeito de estufa, e até 2050, existirão mais 2,5 mil milhões de habitantes urbanos no mundo. De um modo geral, podemos dizer que as cidades têm sido mais intervenientes em ações de proteção climática do que os países, e é relativamente fácil entender porquê. O decisor urbano está mais próximo das populações, e estas sofrem impactes diretos na sua qualidade de vida, o que torna as ações mais urgentes.
A responsabilização urbana, clarificada pela COP30, é também uma oportunidade para repensar a articulação dos vários fatores que contribuem para a qualidade de vida no mundo urbano, nomeadamente habitação e mobilidade, energia, economia circular, saúde pública, entre outros.
Outro aspeto relevante é o reconhecimento de que a cimeira no seu atual formato não é adequada para os objetivos que se pretende atingir, e continuamos sem ter um roteiro eficiente para a concretização dos objetivos.
A entrada das cidades nos processos negociais é, sem dúvida, uma descentralização de todo o processo, e também a colocação das ações de mitigação climática mais perto dos eleitores, e da sua perceção de qualidade de vida. Resta agora saber que planos e ações as cidades vão desenvolver para dar continuidade aos acordos da COP30.
Professora do Instituto Superior Técnico