Praticar, praticar

Descobri um psicólogo com um nome impronunciável, Mihaly Csikszentmihalyi, a propósito de um artigo na extraordinária revista online sobre ciência Nautilus acerca de «como aprender a gostar de praticar». 

Mihaly, poupemos espaço, é o criador do conceito flow (fluxo), que consiste na felicidade de estarmos completamente concentrados quando estamos a fazer alguma coisa de que gostamos tanto que torna indiferente o que está à volta. O que nos leva à pessoa ‘autotélica’, que é a que faz o que gosta de fazer sem esperar recompensa.

Honestamente, sou uma ignorante neste mundo da psicologia positivista, mas isso não me impede de estar grata por haver outra terminologia para os hiper-absorvidos nas suas paixões; aqueles a que costumam chamar neuróticos, obsessivos ou compulsivos. Também aprendi que há autênticos evangelistas de Mihaly. Um deles inventou a regra das dez mil horas, o mínimo de tempo que é preciso para ser bom nalguma coisa. Livra…

Sem comparação

A escritora Germaine Greer é uma das feministas mais influentes do século XX. É, como Camille Paglia, um gigante, embora mais alinhada à esquerda. Para meu espanto, disse à BBC que os homens estão ressentidos com a presença pública das mulheres, que se impõem em todo o lado. Greer considera a «violência» dos comentários na internet alarmante e declarou que na década de 70 as mulheres eram mais «toleradas». Agora são menos aceites. A observação reaccionária é decepcionante, mas sobretudo é a comparação que não me parece fazer sentido. Seria naturalmente fácil ‘tolerar’ as mulheres num tempo em que os papéis estavam definidos para cada género, apesar das revoluções sexuais. A ‘agressão’ na internet que perturba Greer é só um resultado de estarmos, homens e mulheres, no mesmo ‘sítio’, com as mesmas oportunidades e a mesma liberdade. A ‘violência’ é o efeito desta igualdade. E, como sabemos, nada de excepcional se fez no mundo sem ‘violência’.

Podes crer

O Telegraph noticiou um estudo que comprova que podemos ter stress quando vemos televisão. Os pormenores do trabalho científico que levou a esta conclusão são irrelevantes. Nunca duvidei. Quem viu o nono episódio da terceira temporada de A Guerra dos Tronos, mais conhecido por Red Wedding, sabe do que falo. O medo e a surpresa da crueldade provocam choques incontroláveis, quer na ficção quer na vida real. As imagens dos estudantes coreanos a brincar nos camarotes, sem se aperceberem da tragédia à espreita, são também exemplo disto. O vídeo amador era uma verdade, que, apesar da filmagem, não ficcionava, quero dizer, não se distanciava do horror. Podemos pensar que a ficção tem menos peso na nossa sensibilidade, mas estaremos a mentir a nós mesmos. Muitos escritores não tiveram piedade dos nossos corações. Mas às vezes ficamos envergonhados. Por exemplo, lembro-me de Jack Bauer e da série 24, e de me sentir como se tivesse saído de uma aula de zumba.

Escrita cursiva

Pam Mueller, aluna de Psicologia em Princeton, um dia esqueceu-se do portátil em casa. Quando chegou à universidade percebeu, para seu horror na altura, que teria de recorrer à caneta e ao papel para tirar notas na aula. A prática não desejada teve resultados inesperados. Pam lembrava-se melhor daquela aula do que de outras em que fizera anotações no computador e contou a sua experiência ao professor, Daniel Oppenheimer. Juntos elaboraram um estudo, cujos resultados foram agora publicados na Psychological Science. Há de facto diferenças entre tirar notas à mão ou escrevê-las no tablet. No primeiro caso, há uma transcrição do que o professor ou conferencista dizem, porque a rapidez e a destreza de teclar é diferente da de usar a caneta. No segundo caso, o que é dito é interpretado quando é escrito e por isso se memoriza mais facilmente. Isto para dizer que miúdos com tablets nas aulas não é uma ideia assim tão boa como um dia nos fizeram crer.

Fargo

O aviso surge ao início: a história contada baseou-se em factos reais e só os nomes das vítimas foram alterados por respeito à família. Um homem com uma franjinha parecida com a que teria Júlio César e com a fúria homicida de Anton Chigurh, personagem criada por Cormac McCarthy e imortalizada por Ethan e Joel Coen, no filme No Country For Old Men, aparece numa cidadezinha no Minnesota. Mas foi outro filme dos irmãos Coen, Fargo, de 1996, que serviu de base à actual série homónima que estreou na semana passada entre nós. Billy Bob Thorton é o diabólico Lorne Malvo, que chega a Bemidji e modifica a sua vida superficialmente pacata. Começa por Lester Nygaard, representado pelo excelente actor Martin Freeman, um vendedor de seguros vexado, ofendido, derrotado, à espera da voz de um assassino para viver. E ela aparece, na sala de espera de um hospital. O trilho de crimes, a maldade, a facilidade, são assuntos a descobrir aos domingos à noite.