Atletas cegos treinam de “igual para igual” no Clube de Judo do Porto

O Clube de Judo do Porto, que a 11 de Abril celebra 50 anos, tem atletas cegos que vão ao tatami, que é como quem diz ao tapete, de “igual para igual” apesar de não verem o adversário. 

Atletas cegos treinam de “igual para igual” no Clube de Judo do Porto

João Fernandes, cego total, e Tânia Sousa, com apenas 33% de visão, referiram hoje à agência Lusa que não querem "tratamento especial" por terem uma deficiência, até porque o judo é um desporto "muito sensorial" e, nisso, eles estão em vantagem. 

"Queremos ser tratados com igualdade, não queremos ter um tratamento especial porque, assim, o judo deixaria de ser um desporto inclusivo", frisaram. 

Cego total desde os 25 anos, João Fernandes, formador e tradutor de profissão, treina quatro vezes por semana porque lhe "faz bem, convive com os amigos e alivia o 'stress'".

"Estive alguns anos sem praticar e faltava-me qualquer coisa, sinto muita falta disto [judo]", disse.

Segundo João Fernandes, o judo é uma das modalidades desportivas "mais inclusivas" porque permite a prática entre homens e mulheres, novos e velhos e pessoas com deficiência.

"Não há necessidade de fazer alterações, adapta-se a toda a gente, o que é óptimo", afirmou. 

Na luta, João Fernandes revelou que os adversários, que são mais colegas, não se lembram que eles não vêem porque a única diferença é começarem a "pega" – luta – agarrados para terem um ponto de referência. 

"A partir daí, é tudo igual, não há diferenças. De quando em vez, quando nos aproximamos da parede, o adversário tem o cuidado de dizer para virmos para o centro do tapete", afiançou. 

"Dentro do tapete esqueço os problemas, descontraio e convivo. Adoro praticar judo", revelou Tânia Sousa, de Santa Marta de Penaguião, mas a viver em Paredes, Porto.

A treinar duas vezes por semana, a atleta de 29 anos, pratica judo há quatro anos e espera continuar por outros tantos porque lhe "faz muito bem". 

"Na maioria das vezes estou à altura do que os outros fazem porque o mestre [professor] explica bem e os colegas ajudam-nos com as técnicas nos treinos", salientou. 

"O judo já faz parte da minha vida, quero continuar a treinar até chegar a cinto negro", adiantou.  

O presidente do Clube de Judo do Porto, Albino Costa, explicou que os atletas cegos, cerca de 15 num universo de 150, tem dificuldades na aprendizagem, tendo de ser quase personalizada, mas fora isso não há cuidados especiais.  

"Não nos podemos esquecer que eles também sabem judo, por isso, quem compete com eles tem de ter cuidado para não ser projectado", considerou. 

Como prenda de aniversário, Albino Costa queria uma nova sede porque a actual, no centro do Porto, já é demasiado pequena para acolher "tantos" judocas, mas não têm verbas. 

"Não temos apoios de ninguém, sobrevivemos apenas com as quotas dos atletas", referiu. 

Apesar de não ter a resistência de outros tempos, o fundador do clube, Paulo Pinto, de 80 anos, ainda "vai ao tapete". 

No início, o atleta mais velho lembrou que o tapete era uma lona com jornais por debaixo. 

Paulo Pinto frisou que as pessoas têm a ideia errada que o judo é violento, mas é mentira, sublinhando ser um desporto que dá "noção de espaço, resistência, coordenação e perspectiva" sendo raro alguém magoar-se. 

"Ainda há uns dias cai de uma árvore e não me magoei porque rolei, apliquei as técnicas de judo", explicou.  

Lusa/SOL