Ainda a Grécia…

Na sequência da iniciativa dos socialistas europeus, e tal como dei nota no meu último artigo, A Troika para a Grécia veio mesmo responder às questões dos deputados europeus reunidos numa sessão conjunta das Comissões de Assuntos Económicos e Monetários e de Emprego e Assuntos Sociais no passado dia 27 de Abril.

valeu a pena? certamente que valeu! claro que se alguém esperava grandes novidades no discurso oficial ou o anúncio de uma inflexão de agenda se terá, naturalmente, desiludido; no entanto, um dos resultados mais interessantes desta iniciativa talvez tenha sido precisamente a dimensão do desajustamento entre a argumentação dogmática da troika e a avaliação do seu trabalho por parte da generalidade dos deputados (incluindo alguns representantes das forças políticas mais conotadas com a ideologia dominante).

à medida que as questões se foram desmultiplicando, todas mais ou menos no mesmo sentido, as respostas da troika, em particular as do comissário olli rehn e as do nosso conhecido representante do fundo monetário internacional (fmi) paul tompson, foram-se clarificando em torno de dois eixos principais de defesa: a grécia terá evidenciado deficiências na implementação concreta das recomendações da troika, o que foi agravado pela ausência de convergência entre as diversas forças políticas em torno da referida agenda. retirados estes dois pequenos problemas, a receita está certa e quanto mais a recessão se instalar mais medidas de contenção (leia-se: medidas estimuladoras da recessão) serão impostas aos gregos. até onde? qual é o grau de desagregação da economia que tocará o sinal de alarme quando cinco anos seguidos de recessão (crescente de ano para ano) e implicando a perda de 20% da riqueza nacional e 48% dos jovens sem trabalho não são suficientes para abrir uma brecha de dúvida sobre a qualidade do diagnóstico e da medicação?

teremos de esperar também pelo descalabro de portugal – um aluno que não só cumpre como exagera na autoflagelação garantida por uma ampla convergência interpartidária e por uma sociedade humildemente conformada com o seu fado – para que as troikas reconheçam que a fé e a ideologia foram os grandes alimentos da sua agenda? nessa altura, talvez não haja remédio para a salvação da zona euro, pelo menos no formato em que a conhecemos… mas será essa a agenda oculta que, tal como os gregos suspeitam, se esconde por detrás das troikas? libertar-se o euro, da forma mais gradual que for possível, daqueles países que, segundo alguns, nunca lá deviam ter entrado?

no debate parlamentar, as questões clarificaram-se também a este nível: enquanto para alguns a utilidade dos programas de ‘ajuda’ reside no gradualismo que é introduzido no destino inexorável da grécia (saída, no mínimo, da zona euro), para outros, entre os quais me incluo, essa eventual saída é considerada como portadora de convulsões económicas, sociais e políticas incalculáveis, não apenas para a grécia mas para a própria europa.

é possível uma agenda alternativa para a grécia? claro que sim e os socialistas europeus começaram já a esboçá-la. ela passará por: (i) consolidar a recapitalização dos bancos gregos que está em curso, garantindo-lhes condições para o financiamento da economia real e, em particular, das pme que todos os dias fecham asfixiadas pela ausência de crédito para operações correntes; (ii) constituir uma agência para o investimento e crescimento que polarize os fundos estruturais não utilizados e as linhas de crédito do banco europeu de investimento (bei) e do fmi, intermediando a sua canalização para mais de 180 projectos estratégicos já identificados; (iii) acelerar o acordo em negociação com a suíça, de modo a reduzir a sangria de capitais e a consequente fuga fiscal; (iv) levar a cabo acções concretas capazes de reter os jovens, canalizando para educação, formação ou estágios a onda de emigração e desespero instalada; (v) suster a sanha de medidas adicionais de austeridade até que a grécia retome o crescimento, interrompendo a violenta espiral recessiva para a qual o país foi empurrado…

estes são apenas alguns exemplos ilustrativos da possibilidade de articular uma agenda alternativa… o que realmente falta não é competência técnica para a montar, mas sim a vontade política indispensável para a fazer vingar a nível europeu… e é por isso que, cada vez mais, as eleições nacionais são, de algum modo, eleições europeias; o que não se aplica só à grécia, onde os radicalismos de esquerda e de direita se alimentam que nem fungos da crise e da falta de esperança, mas sobretudo aos países económica e politicamente liderantes cujas eleições precedem as da alemanha – neste momento, os olhares e a esperança estão voltados para a frança…